A ACEITAÇÃO DO DIFÍCIL
André Dick
A presença de Augusto de Campos no cenário literário
brasileiro suscita quase sempre polêmica, seja como poeta,
seja como crítico. A essas categorias não é encaixada a de
tradutor porque nesse papel Augusto vem tendo o reconhecimento
que às vezes lhe falta quando tratam de seu trabalho próprio
como poeta e como crítico, sobretudo quando critica caminhos
desgastados. É curioso, no entanto, que muitas vezes alguns
críticos não considerem que os poemas traduzidos por Augusto
ganham versões com tanta qualidade porque há por trás delas um
criador de versos de rara competência, que traduz apenas nomes
com os quais tem
afinidade.
Daí, em primeiro lugar, Mallarmé - a referência máxima da
poesia concreta - ser um dos poetas incluídos em Poesia da
recusa (São Paulo: Perspectiva, 2006, Coleção Signos),
nova coletânea de traduções de Augusto, seguindo a linhagem de
Verso reverso controverso, O anticrítico,
Linguaviagem e Invenção. Mas Augusto não fica em
Mallarmé. Sem o seu ecletismo, a poesia brasileira seria
consideravelmente mais pobre. Como não levar em conta as
traduções que ele fez de poetas a princípio tão díspares, como
Rilke, cummings, Pound, e agora, em Poesia da recusa,
de raridades como o poeta alemão barroco Quirinus Kuhlmann, os
russos Aleksandr Blok, Anna Akhmátova, Boris Pasternak, Óssip
Mandelstam, Sierguéi Iessiênin e Marina Tzvietáieva
(constituindo quase uma edição à parte de Poesia russa
moderna), o inglês William Butler Yeats e os
norte-americanos Gertrude Stein, Wallace Stevens, Hart Crane e
Dylan Thomas? É possível pensar que a ligação de Augusto com o
trabalho contemporâneo não se restringe aos seus experimentos
tipológicos, gráficos, eletrônicos. É sobretudo em seu
trabalho de recuperação de uma tradição poética moderna por
vezes esquecida que a poesia nova vem buscar alento.
Augusto não chegou a esboçar uma teoria da tradução, como fez
seu irmão Haroldo. Este, sem dúvida, era um teórico e um
ensaísta mais completo, embora Augusto seja mais didático e
acessível. Haroldo, para compor sua teoria da tradução
baseou-se no texto "A tarefa do tradutor", de Walter Benjamin,
mas de uma maneira particular. Por sua vez, na introdução de
Verso reverso controverso, Augusto alia-se à idéia de
persona poundiana, quando afirma por que traduz
determinados poetas: "A minha maneira de amá-los é
traduzi-los. Ou degluti-los, segundo a Lei Antropofágica de
Oswald de Andrade: só me interessa o que não é meu. Tradução
para mim é persona. Quase heterônimo. Entrar dentro da
pele do fingidor para refingir tudo de novo, dor por dor, som
por som, cor por cor. Por isso, nunca me propus traduzir tudo.
Só aquilo que sinto. Só aquilo que minto. Ou que minto que
sinto, como diria, ainda uma vez, Pessoa em sua própria
persona. Outrossim, ou antes, outronão: tradução é crítica,
como viu Pound melhor que ninguém. Uma das melhores formas de
crítica. Ou pelo menos a única verdadeiramente criativa,
quando ela - a tradução - é criativa".
[1]
O que nos interessa é que Augusto, como Pound, como se percebe
por suas palavras em livros ou entrevistas, vê a tradução como
uma forma de crítica. Colocando-se como uma persona, o
tradutor, por melhor que seja, não conserta um mau poeta,
ainda que às vezes melhore alguns elementos da construção
lingüística original e atinja resultados superiores aos
obtidos pelo verdadeiro autor, eliminando palavras inadequadas
ou em excesso. Pound, ao perceber o poeta como alguém que tem
uma posição crítica diante da tradição, apaga o preceito de
Novalis, para quem o tradutor é o "poeta do poeta". O que
Novalis subentende não é que o bom tradutor seja indispensável
para que um poeta tenha boa representatividade na língua para
a qual está sendo proposto, mas que o tradutor é um medium
do poeta original, uma alma escolhida para que este se
manifeste. Acreditamos que a tradução, por mais criativa,
não crie um outro poema e sim adapte a criação
original para outra língua, valendo-se, quando possível,
de todos os recursos possíveis para encontrar uma versão
mais adequada para essa língua. Haroldo, em sua
transcriação, admite esse caminho, optando por uma tradução
criativa. Augusto já destacava em Pound também o que ele mesmo
tenta empregar em suas traduções: "a ausência de ortodoxia, a
extraordinária liberdade de suas recriações".
[2] Tais características fazem com que Ezra
Pound tenha criado "uma arte ativa de traduzir, onde a
tradução é colocada em pé de igualdade com a criação e com
esta se identifica".
[3] De qualquer modo, não se pense que as
traduções de Augusto apresentem excesso de liberdade: na
medida do possível, elas são adaptações (recriações) do
original, procurando a mesma riqueza de imagens e de
sonoridade.
Ana Cristina Cesar, em seu ensaio "Bastidores da tradução"
(de interesse fundamental para analisarmos Poesia da recusa),
ao deter-se nas traduções de Augusto do livro Verso reverso
controverso, já começa enxergando o ideário de Pound
acerca da tradução nessas palavras iniciais de Augusto. Nele,
Ana Cristina vê a semelhança entre os objetivos do poeta
brasileiro e os de Pound através da consideração de que os
leitores devem ter um acesso imediato aos principais poemas,
sem precisarem conhecer um número enorme de poesias sem
qualidade. Pound faz isso através de seu paideuma.
Segundo Ana Cristina, tomando esse caminho, Augusto "continua
sendo um militante que expressa seus princípios, sua
orientação ideológica na escolha de poetas e poemas".
Neste sentido, ele mais uma vez segue a Pound, o qual, para
Augusto, "não só examinava com uma 'nova sutileza de olhos' os
escritores de outras épocas e latitudes, mas os vertia para a
língua inglesa, ainda, ou principalmente, quando apresentavam
problemas quase intransponíveis para a tradução".
[4] Assim, ele adotou o lema confuciano "Make
it new" (renovar), para dar "nova vida ao passado literário
via tradução".
[5] Ana Cristina acredita que Augusto sabe
trabalhar "dentro de um contexto de luta ideológica, mesmo
quando, aparentemente, este combate não esteja ultrapassando
os limites dos círculos literários e da vida acadêmica",
reparando que ele está sempre se referindo às posições do
establishment literário, colocando-se contra essa corrente
ao traduzir poetas que fizeram uma poesia "revolucionária" ou
poesia orientada para a "revolução da linguagem".
[6] Augusto, incorrendo nisso, teria completa
compreensão da influência que seu trabalho causa para a
cultura brasileira e, por isso, "freqüentemente enfatiza a
importância de se traduzir determinado poeta como reação a um
contexto literário definido".
[7] A escolha política de Augusto por poetas
russos não é coincidência. Os poetas que seleciona para
Poesia da recusa investem num experimentalismo ligado
igualmente às suas vidas de muita dificuldade, sobretudo
financeira e de inaceitação do panorama político em que
viveram. Na verdade, Augusto já antecipa boa parte de sua
argumentação de Poesia da recusa no ensaio "Arte longa
vida breve", encontrado em À margem da margem. E mesmo
na introdução deste livro com ensaios: "O que eles [os poetas
selecionados] têm em comum? A marginalidade dos que buscaram
caminhos não balizados, abriram sendas novas, estranhas ao
território habitual de poesia ou da literatura".
[8]
Embora, para analisar quais os traços em comum entre os vários
poetas e poemas traduzidos por Augusto, ainda em seu ensaio,
Ana Cristina afirme que as escolhas e introduções críticas do
brasileiro estão muito ligadas a Ezra Pound, o mesmo não
acontece no estilo: Augusto não teria sido influenciado nem
pelo estilo contraditório nem pela ironia polêmica do autor de
Os cantos, assumindo a "postura de um professor que vai
mostrar às crianças (de um país subdesenvolvido) o que devem
ler e de que modo devem ler - sem a interferência da
auto-ironia"
[9] - a ironia, neste caso, está a cargo de
Ana Cristina.
A autora destaca ainda em seu ensaio, e é uma característica
própria de Poesia da recusa, que Augusto dará, como
Pound, preferência a poetas que "lutaram por um estandarte e
lema radicais: invenção e rigor".
[10] O "estandarte" ou "lema" se definiram
por esses elementos abaixo pela irreverência temática, a
tecnologia poética ou artesanato formal rigoroso, um
significado paradoxalmente obscuro ou difícil e um tipo de
poesia mais intelectual, em oposição à do tipo emocional -
características da poesia concreta, aliás. Desse modo, para
evidenciar essas características, Ana Cristina analisa - na
irreverência temática - a preferência por assuntos fora de
discussão da sociedade: sexualidade explícita ou erotismo,
sátira social, humor negro, elementos vulgares (em "A pulga"
de John Donne), daí vir a "poesia da danação" dos provençais,
os simbolistas de uma linha satírica (Laforgue, Corbière).
Dentro da tecnologia poética ou artesanato formal, Augusto
privilegiaria as construções ricas, as associações repentinas,
os novos ritmos, as palavras inventadas (como na poesia de
Hopkins e na prosa de Joyce). Uma poesia que privilegia mais a
forma do que o conteúdo, embora nesse caso se crie uma
dicotomia dispensável: o conteúdo de um poema está, na maioria
das vezes, ligado à força de sua forma, e sobrevive dela. Ana
Cristina destaca que Augusto vai preferir poetas obscuros
(mesmo entre os provençais), os metafísicos e a maneira de
fazer poesia de Mallarmé e Hopkins, o que seria "uma atitude
crítica contra a decifração fácil da poesia 'expressiva' ou
'subjetiva', na qual o conteúdo não oferece nenhuma
dificuldade"
[11] (argumento bastante duvidoso o de que na
"poesia expressiva ou subjetiva" não haja dificuldade). E, ao
valorizar um tipo de poesia mais intelectual, Augusto destaca
sobretudo os trovadores, os metafísicos e os simbolistas de
"segunda linha". Nesse sentido, "A poesia deve instigar, deve
fazer com que as pessoas pensem e assumam posição crítica",
podendo fazer o leitor suar como se estivesse "lutando com um
problema matemático".
[12] Os comentários de Ana Cristina sobre
cada um desses elementos são muito interessantes, destacando o
que Augusto vê na riqueza dos provençais, dos metafísicos e
dos simbolistas reunidos em Verso reverso controverso -
e, de resto, em todos os poetas que traduz.
Vemos em Poesia da recusa uma aproximação de poetas que
reinventaram a linguagem com reinvenção e rigor, personalidade
crítica e tentativa de romper com o lugar-comum, como Gertrude
Stein. No entanto, mesmo os sonetos - como os de Mallarmé, a
exemplo de "Tristeza de verão", "Rememoração de amigos belgas"
e "Soneto" - ganham, sob esse ponto de vista, uma perspectiva
de serem rompedores dentro de uma forma sustentada na
metrificação. Pode-se discordar quanto ao fato de "Prosa" ser
um dos poemas mais complexos de Mallarmé, depois de Un coup
de dés (creio, ainda, que os fragmentos que ele escreveu
para o filho morto precocemente, Anatole, ainda ganharão um
significado maior; seu alcance é visível sobretudo em Celan),
mas é inegável o brilho que Augusto lança sobre o poema, como
antes havia lançado Júlio Castañon Guimarães. Há, nas
traduções mallarmeanas, soluções típicas de Augusto, como os
versos "O sopro do meu nome em morno murmurar" (em "Pelos
bosques do olvido"
[13] ); "Nenhuma nênia inócua urlará minha
boca" (em "Pafos - um nome só..."
[14] ); e "Dama / sem tanto ardor embora
ainda flamante / A rosa que cruel ou lacerada e lassa / Se
desveste do alvor que a púrpura deslaça / Para em sua carne
ouvir o choro do diamante" (em "Soneto"
[15] ). Mas é no poema "Primavera"
[16] que Augusto consegue soluções
memoráveis:
A primavera enferma expulsou sem clemência
O inverno lúcido, estação de arte serena,
E no meu ser, que ao sangue obscuro se condena,
Num longo bocejar se espreguiça a impotência.
Crepúsculos sem cor amornam-me a cabeça,
Velha tumba que cinge um círculo de ferro,
E, amargo, atrás de um sonho vago e belo eu erro
Pelos trigais, onde se exibe a seiva espessa.
Exausto, eu tombo enfim entre árvores e olores,
E, cavando uma fossa para o sonho, a boca
Mordendo a terra quente onde germinam flores,
Espero que o meu tédio, aos poucos, vá-se embora...
- Porém, do alto, o Azul ri sobre a revoada louca
Dos pássaros em flor que gorjeiam à aurora.
Augusto talvez tenha se encantado com a música simbolista de
Mallarmé porque é um exímio conhecedor dos provençais, da MPB
(como prova seu estudo Balanço da bossa e outras bossas)
e da música de vanguarda (Música de invenção). A música
também flui no poeta barroco que abre o livro, Quirinus
Kuhlmann, com notável domínio do verso. Vejamos, igualmente, a
inovação vocabular que trazem os poetas russos (sobretudo
Mandelstam - destaque-se o poema "cadernos de vorôniej", com a
bela quadra inicial: "Liberta-me, libera-me, Vorôniej, - /
Devolve-me ou devora-me em teu sorvo, - Desinverna-me ou
vara-me de nojo - / Voraz neve, Vorôniej - dente, corvo!"
[17] ) -; Aleksandr Blok - autor de
"Cleópatra -; Sierguéi Iessiênin - autor de "Ótchar" -; e
Marina Tzvietáieva - responsável por um conjunto lapidar
escolhido por Augusto, no qual se incluem poemas como "O
aluno", "A carta", "Silêncio, palmas!", "Maiakovski", "Jardim"
e "Comer" (todos de notável qualidade) e a qualidade de
enjambements nos poemas de Wallace Stevens e Yeats,
sobretudo. Yeats, é bom que se diga, ganha uma versão
irretocável de "Bizâncio" pelas mãos de Augusto, mas o
impressionante "A torre" não fica para trás. De Stevens,
Augusto destaca dois poemas estranhos: "Tatuagem" e "Os vermes
no portão do céu", com imagens atípicas ao imaginário do poeta
norte-americano. Thomas, com sua musicalidade, característica
especial também de Yeats, mostra-se um autor moderno de
primeira classe, a exemplo de "A força que do pavio verde
inflama a flor" e "E a morte não terá domínio". Mas é
sobretudo a tradução de "Visão e prece" que mostra a grandeza
do trabalho de tradução de Augusto, assim como a recuperação
de um poeta relativamente esquecido, como Hart Crane, por meio
de belos poemas, como "Louvor a uma urna", "Ó ilha do Caribe!"
e o notável "A planta do ar".
Apesar de Ana Cristina perceber na teoria e prática de
tradução de Augusto uma espécie de rejeição à "questão do
tema, a figuração, as sensações sentimentais (...) e as
associações tiradas do texto (a não ser que o tema manifeste
uma 'reação' contra uma atitude de 'dominação'" e suas
traduções agradarem do "ponto de vista técnico", com a
"natureza dos poemas escolhidos (ou então os comentários
críticos)" levando "a evitar o envolvimento com o texto, os
sentimentos, a entrega - objetos obscuros provindos do
desejo", tais observações não valem para todos os trabalhos de
tradução de Augusto. É certo que a introdução de seus
trabalhos de tradução fala mais do lado técnico ou de
atrevimento dos poetas, e raramente associa esse trabalho a
uma interpretação mais subjetiva, mas, de qualquer maneira, é
possível notar em Poesia da recusa, recuperando
características de outros livros de tradução referenciais (Verso
reverso controverso, Linguaviagem, Invenção
etc.), uma espécie de recuperação biográfica dos poetas.
Augusto mostra interesse em contar a história, mesmo que de
maneira breve, dos poetas que seleciona. Há afeto e
cumplicidade em suas escolhas, destacando-se em Poesia da
recusa uma certa leveza ausente nos trabalhos anteriores -
que, por vezes, focavam alguns trabalhos poéticos como
precursores do que faria a poesia concreta (colocada em
segundo plano neste Poesia da recusa, inclusive por
meio de uma recusa de Augusto, ao dizer que John Cage levou a
patamares mais experimentais o que Stein tentara fazer do que
a poesia concreta). Veja-se, por exemplo, um fragmento do
texto sobre a poeta russa Marina Tzvietáieva. Augusto destaca
a "riqueza de invenção rítmica, uso substantivo, celular da
palavra, realçando os choques paronomásticos intervocabulares
e as arestas dos versos retalhados de enjambements,
sintaxe elíptica, quase telegráfica" da poeta russa. Augusto
traduz com sua dicção singular, procurando esse tom
telegráfico, um poema como "Louvor de Afrodite", em que há os
belos versos "Mas eu, aqui na areia gélida, / Dia após dia me
olho sem saída, / Como serpente que olha a velha pele, da /
Juventude desvestida".
[18] Ou a quadra de "A carta": "Felicidade? E
a idade? / A flor - floriu. / Quadrado do pátio: / Bocas de
fuzil"
[19] (inevitável lembrar aqui de "A flor
flore", de Augusto). Com os versos "Jardim: sem ir. / Jardim:
sem cor. / Jardim: sem rir. / Jardim: sem flor. / / Dá-me um
jardim: Sem um olor, / Sem um amor, / Sem alma, enfim",
[20] o poema "Jardim" também é vertido com
propriedade. Todos esses elementos, na poesia de Marina, são
animados por "um avassalante pathos existencial".
[21] Esse pathos é evidente num poema
como "Maiakovski", mas o amor é o que traz mais um sentimento
de recusa, em "Diálogo de Hamlet com a consciência": "Está lá
no fundo da lama, / Limo!... Uma última corola / Entre as
toras aflora... / - "Mas eu a amava / Como quarenta mil...." /
- Menos / Do que um só amante. / / Lá, no fundo, na lama. / -
Mas eu a amava - / (dúvida) / como quem ama??".
[22] Diante de um poeta como Mallarmé, no
entanto, Augusto recua um pouco, escrevendo - e se afastando
cada vez mais do concretismo ortodoxo: "Não seria difícil
fazer acompanhar estas novas traduções de glosas
interpretativas, com base nos numerosos trabalhos de críticos
que ao longo do século têm se debruçado sobre os textos
sibilinos do poeta. Mas me parece indevido amortecer o choque
de uma linguagem tão mágica e surpreendente. Com o aparato das
notas exegéticas, que explicam o que podem, sem esclarecer
cabalmente o sentido e sem jamais desvendar o encanto dessas
estranhas e cifradas abstrações".
[23] No entanto, veja-se a presença feminina
na obra de Mallarmé, tão estudada por Jean-Pierre Richard em
L'univers imaginaire de Mallarmé, ou as elucidativas
notas exegéticas que José Lino Grünewald compôs para sua
coletânea Poemas, em que traduz alguns poemas
mallarmeanos. As notas - como Augusto demonstra, fazendo
algumas - acrescem humanidade a uma obra vista como desumana
ou purista. Veja-se "Triunfalmente a fugir", com seus versos
delicados: "A tua, sempre, sim, delícia que me vem, / A única
que do céu extinto ainda retém / No seu pentear, pueril, um
pouco da triunfante / / Luz, quando a pousas, só, entre as
dobras sedosas, / Capacete imortal de imperatriz infante / De
onde, para espelhar-te, choveriam rosas".
[24]
Mas que recusa é a recusa com que Augusto denomina Poesia
da recusa seu mais recente volume de traduções? Augusto
tem admiração pelas palavras de Valéry sobre Mallarmé (o
trecho é longo, mas vale a pena transcrevê-lo): "O trabalho
severo, em literatura, se manifesta e se opera por recusas.
Pode-se dizer que ele é medido pelo número de recusas. [...] O
rigor das recusas, a quantidade das soluções que são
rejeitadas, as possibilidades que o escritor se proíbe,
manifestam a natureza dos escrúpulos, o grau de consciência, a
quantidade do orgulho e, também, os pudores e os diversos
temores que se pode sentir com relação aos julgamentos futuros
do público. É nesse ponto que a literatura atinge o domínio
da ética: é nessa ordem de coisas que se pode introduzir o
conflito entre o natural e o esforço; que ela obtém seus
heróis e seus mártires da resistência ao fácil; que a virtude
se manifesta, e, em conseqüência, por vezes, a hipocrisia. Mas
pode acontecer que essa vontade de rejeitar o que não está
conforme à lei que ele mesmo se impôs exerça uma tal pressão
sobre o escritor que as obras indefinidamente revistas e
elaboradas sem consideração à fadiga e ao mesmo tempo se
tornem raríssimas, e que, a despeito da densidade que elas
adquiram, a acusação de esterilidade seja lançada ao autor que
as fez excessivamente difíceis para si próprio".
[25] Augusto utiliza as palavras de Valéry, é
inevitável pensar, para falar de sua obra poética "própria".
Seguidamente acusado de produzir uma poesia estéril, Augusto
investe na defesa do trabalho que não necessita de quantidade
para revelar seu valor.
A recusa de Augusto, ao selecionar os poetas de Poesia da
recusa - que, no entanto, não quiseram ser "mártires" ou
"heróis", como diz Valéry - também engloba poetas que negam a
glória e as vaidades literárias e fazem uma obra que prima
justamente pelo critério da eliminação: obras que tendem a ser
uma representação da radicalidade inventiva. Daí Augusto
escrever, com eficiência, avaliando o poema "Contra a fama",
de Pasternak: "A voz desse poema soa hoje mais solitária do
que nunca, mas, mesmo clamantis in deserto, merece ser
difundida. É a resistência ética, a alma rebelde da poesia,
contra-estilo do fracasso, diante das imposições e imposturas
do poder e da glória".
[26] Tal negação à glória é característica de
quase todos os poetas traduzidos por Augusto, mas sobretudo
Rimbaud, Mallarmé, Valéry e Emily Dickinson (que Augusto
traduz com brilho em O anticrítico). Sobre Rimbaud, com
sua explosão poética, Augusto escreveu, em Rimbaud livre:
"A peripécia vital de Rimbaud, única, pela radicalidade - a do
adolescente genial que, em três ou quatro anos, queimou todas
as etapas do fazer numa obra mínima (e máxima), tão densa e
tão intensa que levou à renúncia e ao silêncio o poeta
superdotado -, merece um tributo especial e uma reflexão
permanente. Quando o escrever é mero degrau para os assomos da
vaidade ou do poder, quando se publicam tantos livros de
poesia antes de se ter feito os poemas, será útil rememorar o
caso-limite Rimbaud, a perfeição do que ele fez, tão jovem, e
o desprendimento com que deixou de fazer tão cedo".
[27] É uma pena, no entanto, que Augusto não
inclua Paul Celan entre os poetas de seu paideuma de
traduções - em razão de esse poeta possuir todas as
características que Augusto aponta nesses poetas
"revolucionários". Acredito que as traduções de Augusto desse
poeta seriam de muita qualidade.
Também no caso de alguns poetas russos, trata-se de uma recusa
não só a posições políticas (ou seja, a fuga a qualquer
direita ou a qualquer esquerda que se proponha, sobretudo
dominada por posições autoritárias ou pertencentes ao "diálogo
com o povo"), mas à vida meramente sistematizada. Não por
acaso, Mandelstam - um dos poetas mais contundentes de
Poesia da recusa - acabou nos campos de concentração de
Stalin, postando-se contra a vida burocrática do intelectual
que trabalha para as idéias do governo, em busca de
privilégios e aceitação popular. Esta recusa é representada,
em outros casos (como os de Iessiênin, Maiakovski, não
incluído em Poesia da recusa, e Marina Tzvietáieva),
pelo suicídio, obviamente uma representação do desespero
existencial de seus poetas e não uma sublimação literária,
para se alcançar a eternidade ou tornar os escritos de quem se
matou em algo de mais valor, ou entendê-lo como obrigação do
sujeito infeliz, ou, no caso do livro, do poeta que deseja
fugir ao sistema. A recusa não implica, também, escolher um
caminho de pureza, de distanciamento do mundo, mas sim o de
privilegiar o diálogo com a tradição, com o mundo - mas de
forma não ideológica, comprometida. Envolve um certo desalento
da vida, como em "Cassino", de Mandelstam: "Não gosto de
prazer premeditado. / O mundo, às vezes, é um borrão escuro. /
Eu, meio bêbado, estou condenado / A ver as cores de um viver
obscuro".
[28] Ou na terceira parte" do poema "Veneza",
[29] de Aleksandr Blok: "O barulho da vida já
não dura. / A maré de inquietudes se quebranta. / E no veludo
negro o vento canto / Minha vida futura. / / Talvez
despertarei noutro lugar, / Quem sabe nesta terra
entristecida, / E algumas vezes hei de suspirar / Pensando em
sonho nesta vida?". Mesmo quando a poesia se destina a
criticar a própria poesia, isso é uma crítica da reflexão,
como se pode ver em versos de Mandelstam, no excepcional
"Silentium"
[30] :
Ainda não é nascida,
É só canção e poesia,
E está em plena harmonia
Com tudo o que é vida.
O seio da onda arfa em paz,
Mas como um louco brilha o dia
E a espuma pálido-lilás
Jaz no azul-névoa da bacia.
Que em meus lábios pairasse
A quietude original
Como uma nota de cristal
Pura desde que nasce!
Volve à poesia e a canção,
Sê só espuma, Afrodite,
Coração, desdenha o coração
Que com a vida coabite
Veja-se, igualmente, o melancólico "Odeio o brilho frio"
[31] (com sua quadra final de alta qualidade:
"Quando a hora já se for, / Talvez eu volte a voar. / Lá, me
negam o amor. / Aqui, não ouso amar") ou "Abro as veias"
[32] ("Abro as veias: irreprimível, /
Irrecuperável, a vida vaza. / Ponham embaixo vasos e vasilhas!
/ Todas as vasilhas serão rasas, / Parcos os vasos. / / Pelas
bordas - à margem - / para os veios negros da terra vazia, /
Nutriz da vida, irrecuperável, / Irreprimível, vaza a
poesia"). Em Yeats, note-se a presença do difícil no calor do
corpo: "O prazer do difícil tem secado / A seiva em minhas
veias".
[33]
Augusto considera que a poesia traz um instinto
revolucionário, e pode-se dizer que, acrescentando ao que a
poesia concreta, em sua fase do salto participante, dizia -
"Sem forma revolucionária não há arte revolucionária" -, a
idéia hoje é que "Sem forma e sem vida revolucionárias não há
arte revolucionária". Revolucionário, aqui, não significa
querer transformar o mundo pregando uma ideologia, mas sim não
aceitar o que o mundo impõe nem vender idéias por mordomias e
privilégios, como escreveu, certa vez, Leminski. Mallarmé, por
exemplo, nunca apareceu em praça pública fazendo discursos,
mas seu posicionamento foi sempre contrário não à vida, da
qual se nutriu para compor o seu trabalho, e sim ao sistema
que lhe impunham muitas vezes, tendo sido um professor
perseguido, com diversos problemas financeiros. Num plano
sincrônico, Mallarmé está ligado aos poetas russos de
Poesia da recusa, com suas obras consideradas distantes do
povo, como a de Akhmátova, que, junto com Pasternak, foram
deixados à margem pelo stalinismo. O mesmo se diz de Marina
Tzvietáieva, que acabou tendo um fim trágico (suicidou-se),
depois de o marido ter sido fuzilado e a filha colocada num
campo de concentração, logo após a Rússia ser invadida pelos
nazistas. Como lembra Augusto, ela foi censurada, antes, "pela
intolerância dos 'comissários do povo' soviéticos, rejeitada
pelos emigrados anticomunistas, não parecia haver lugar para
ela em parte alguma. Seria tão diferente dos seus coirmãos
suicidadas, na sua rebeldia insubornável e na sua inadequação
ao sistema dominante ?.
[34] Iessiênin, por sua vez, renegou os
privilégios que os oficiais stalinistas propunham aos
artistas, num período em que muitos poetas serviam, como voz,
a um partido. Neste caso, o interessante é que a revolução,
aqui, é a recusa à revolução retórica e mesmo à revolução
destacada pelo movimento concreto, em que o poeta produziria
para as massas. Há, nesse caso, a consciência do fracasso,
distante do sucesso que pretendiam as vanguardas.
Neste sentido, Poesia da recusa é a obra mais
evidentemente política de Augusto de Campos, que se posiciona
com intelectual que é, não adotando a postura, talvez mais
amena, de anticrítico. Augusto aponta a revolução dos versos
(ou melhor, nos versos, na linguagem) do que a revolução -
plastificada - de vozes que se consideram representativas do
que se chama comumente de "povo". Augusto entende ser mais
coerente a "ética da linguagem" - um dos objetivos da poesia
concreta - e não a "impostura da linguagem", optando pela
"qualidade" ao invés da "quantidade", numa escolha pela
solidão e pela concepção de que quando um intelectual se
corrompe, substituindo a ética pelo oportunismo, acontece o
que ele escreve: "[...] a luta dos poetas continua, em todo o
mundo, e outras gerações estão sendo dissipadas, num contexto
massificado e imbecilizante, onde os meios de comunicação
tendem a nivelar tudo por baixo e a sufocar pelo descrédito ou
pelo silêncio as tentativas de fugir ao vulgar e ao
codificado".
[35] Sabe, por exemplo, avaliar os equívocos
políticos de Pound e perceber, de forma implícita, que para
ser "antena da raça" não obrigatoriamente se deve impor à raça
algum ideal. Augusto tem aversão à figura do mediador, do
poeta que quer ver sua voz ligada a um comprometimento público
e, assim, "dialogar" com o leitor (e "dialogar" aqui é apenas
ser escutado, na maioria dos casos) - e por isso é contestado.
Essa posição é de uma coerência às vezes repetitiva, em seu
caso - mas serve para apresentar uma visão que contrasta. Não
por acaso,
Poesia da recusa,
que convida mais ao silêncio do que ao barulho, recebe como
retorno imediato o mais consternado silêncio (afinal, dirão os
detratores, não é o que Augusto queria?). Afinal, poderíamos
nos perguntar, o que significa, para os dias de hoje, um
Mallarmé - autor possivelmente kitsh para o
pós-modernismo? Para Augusto, o poeta francês, visto como
desumano - pela crítica de fundo sociológico, claro -, "quer,
em poesia, o que querem os cientistas em suas especulações e
pesquisas aparentemente inúteis. Conhecer. Conhecer-se".
[36] Esse "conhecer-se" neutraliza qualquer
"impessoalidade" ou "desaparecimento elocutório do poeta", e
impede que o poeta se considere um representante solitário da
humanidade, não pressupondo que uma "linguagem superior" o
faça falar. O que buscar, então, num poeta que não quer falar,
como profeta, à humanidade?
Lendo um livro como Poesia da recusa, parece claro
também que a poesia possui um rigor que se estabelece a partir
de certa tradição. Como podem
poetas como Mallarmé não terem envelhecido, mesmo em seus
momentos menos experimentais? Afirma-se isso à medida que
Augusto estabelece Un coup de dés como experimento
máximo. Mas como negar a extrema experimentação de poemas que
Augusto traduz com raríssima competência e brilho e são muito
anteriores a este experimento máximo final? A recusa, no meu
entendimento, não se estabelece, por isso, a partir de uma
inovação formal. O próprio Augusto de Campos afirma que o
Mallarmé de olhos para o futuro, o que estabelece "os degraus
construtivos para que se constituam as novas estruturas
arquitetônicas em nosso século é, sem dúvida, o de Um lance
de dados e o do apenas delineado Livro". No entanto
- eis a ruptura com o discurso original concretista -, Augusto
considera que os textos anteriores, mais do que Um lance de
dados, "com seu discurso fraturado, mas relativamente
límpido, especulativo-filosófico, quase-prosa - parecem operar
uma implosão sintática e imagética na linguagem da poesia:
conflitam figuras gramaticais, relativizam a ordem do
discurso, abstratizam as associações de imagens, modificando
profundamente a nossa percepção e o nosso entendimento".
[37]
A recusa se estabelece sobretudo na maneira como é
trabalhado o conteúdo, embora este, claro, necessite de uma
forma adequada para ganhar mais expressão. Não se discorda,
aqui, do que Augusto relata como "sofrimento da recusa". O
próprio ato da poesia - seja ela boa ou não - implica numa
solidão, mas não com o intuito romântico de disciplinar um Eu
Superior, e na integração do ser com a existência, um traço
evidente nos poemas dos autores russos incluídos no volume. Os
poemas, mesmo os de cunho político - o que, na verdade, pouco
importa; importa é a sensação humana que provém do poema -,
mantêm-se sobretudo pela qualidade da linguagem. Veja-se essa
intradução, intitulada "versos à Tchecoslováquia", tratando,
com repulsa, da invasão nazista neste país, de Marina
Tzvietáieva:
Lágrimas de ira e amor!
Olhos molhados, quanto!
Espanha em sangue!
Tchecoslováquia em pranto!
Montanha negra -
Toda a luz amputada!
É tempo - tempo - tempo
De devolver a Deus a entrada!
Eu me recuso a ser.
No asilo da não-gente
Me recuso a viver.
Com o lobo regente
Me recuso a uivar.
Com os tubarões do prado
Me recuso a nadar,
Dorso dobrado.
Ouvidos? Eu desprezo.
Meus olhos não têm uso.
Ao teu mundo sem senso
A resposta é - recuso.
[38]
É um poema lindo. De um livro que aceita, como poucos, o
difícil - para sorte do leitor que admira poesia. De modo que
se pode falar dos poemas traduzidos o que Augusto fala dos
poemas de Mallarmé: "[...] cada um deles é um território novo
e desconhecido. Ignorá-los é privar-se de maravilhas do pensar
e da sensibilidade. É ignorar-se um pouco. E ficar menor".
[39] Pois esta poesia, antes de tudo, como
diz Mandelstam, "está em plena harmonia / Com tudo o que é
vida".
*
André Dick nasceu em Porto Alegre (RS), em 1976.
Publicou os livros de poesia Grafias (2002) e Papéis
de parede (2004). Organizou, com Fabiano Calixto, o livro
A linha que nunca termina - pensando Paulo Leminski
(2004).
*
Leia também
poemas
de André Dick e ensaios do autor sobre
Augusto de
Campos,
Paulo
Leminski,
João
Alexandre Barbosa e o livro Jardim de Camaleões, de
Claudio
Daniel.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1]
CAMPOS, Augusto de. Verso reverso
controverso. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1988, p. 07.
[2]
POUND, Ezra. Poesia. 3. ed.
Tradução de Augusto de Campos, Décio Pignatari, Haroldo de
Campos, José Lino Grünewald e Mário Faustino. São Paulo:
HUCITEC; Brasília: EdUnB, p. 21.
[3]
Ibidem, p. 21.
[4]
CAMPOS, Augusto de.
Ezra Pound: "nec spe nec metu". In: POUND, Ezra.
Poesia.
3 ed., Trad. Augusto de Campos, Haroldo de Campos, Décio
Pignatari, José Lino Grünewald e Mário Faustino. São Paulo:
HUCITEC; Brasília: EdUnB, 1993, p. 20.
[5]
Ibidem, p. 20.
[6]
CESAR, Ana Cristina. Bastidores da
tradução. In: ______. Crítica e tradução. São Paulo:
Ática; Instituto Moreira Salles, 1999, p. 403.
[7]
Ibidem, p. 403.
[8]
CAMPOS, Augusto de. À margem da margem.
São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 7.
[9]
CESAR, op. cit., p. 403.
[10]
Ibidem, p. 404.
[11]
Ibidem, p. 405.
[12]
Ibidem, p. 405.
[13]
CAMPOS, Augusto de. Poesia da recusa.
São Paulo: Perspectiva, 2006, p. 49.
[14]
Ibidem, p. 57.
[15]
Ibidem, p. 59.
[16]
Ibidem, p. 43.
[17]
Ibidem, p. 125.
[18]
Ibidem, p. 152.
[19]
Ibidem, p. 154.
[20]
Ibidem, p. 166-167.
[21]
Ibidem, p. 144-145.
[22]
Ibidem, p. 153.
[23]
Ibidem, p. 36.
[24]
Ibidem, p. 53.
[25]
VALÉRY, Paul. Écrits divers sur Stéphane Mallarmé.
Paris: Gallimard, 1950, p. 39-40 (Trad. Augusto de Campos. In:
Linguaviagem. São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p.
14-15).
[26]
CAMPOS, Augusto de. Poesia da recusa.
São Paulo: Perspectiva, 2006, p. 81-82.
[27]
Idem. Alguns Rimbauds. In: ______.
Rimbaud livre. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1993, p.
20-21.
[28]
CAMPOS, Augusto de. Poesia da recusa.
São Paulo: Perspectiva, 2006, p. 119.
[29]
Ibidem, p. 90.
[30]
Ibidem, p. 114.
[31]
Ibidem, p. 116.
[32]
Ibidem, p. 165.
[33]
Ibidem, p. 181.
[34]
Ibidem, p. 149.
[35]
Ibidem, p. 76.
[36]
Ibidem, p. 41.
[37]
Ibidem, p. 35.
[38]
Ibidem, p. 170.
[39]
Ibidem, p. 41. |