ZUNÁI - Revista de poesia & debates

 

 

HILDA HILST:  ECONOMIAS ESTÉTICAS

 

 

Edson Costa Duarte

 

 

 

 

Para a mente moderna, a poesia é energia, tempo e talento voltados a objetos supérfluos. No entanto, contrariando toda a lógica, a poesia circula e é lida... Seu valor e sua utilidade não podem ser medidos...  E os poemas não podem ser economizados para formar uma poupança: eles têm que ser gastos.

 

 

— Octavio Paz

 

Tantas páginas, tantos livros que foram, para nós, fontes de emoção, e que relemos para estudar a qualidade dos advérbios ou a propriedade dos adjetivos! [1]

 

— Émile Cioran

 

 

Fotografia sumária de nove livros de poesia de Hilda Hilst, publicados entre 1974 e 1995, este estudo tem o intuito de fornecer algumas bases conceituais sob as quais é possível se ler a obra poética hilstiana.

 

A crítica acadêmica sobre a obra, principalmente sobre a poesia, de Hilst, é ainda relativamente pequena, levando-se em conta que seu primeiro livro Presságio, de poesia, foi publicado em 1950.  Sobre a poesia de Hilst, conheço apenas sete estudos acadêmicos: o de Goimar Dantas de Souza, Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo (2003); os de Fátima Ghazzaoui (2003), Gabriel Albuquerque (2002) e Cristiane Grando (1998), feitos na USP; e os de Fabiana Amorim (2002), Sueli Miranda (2003) e Bernardo Amorim (2004), realizados na UFMG.[2]

 

Dos críticos que podem ser considerados pioneiros, tendo publicado textos, em jornais e revistas, algumas vezes republicados em livros, destacam-se alguns nomes: Sérgio Buarque de Holanda, Sérgio Milliet, Jorge de Sena, Anatol Rosenfeld, Nelly Novaes Coelho, Leo Gilson Ribeiro, Ivan Junqueira, Cláudio Willer, Vilma Arêas e Berta Waldman.[3]

 

As notas introdutórias de Alcir Pécora (escritas entre 2001 e 2005) à obra reunida de Hilst, publicada pela Globo, me ajudarão a dar um contorno mais nítido a algumas reflexões a serem desenvolvidas. No capítulo final, um texto de Pécora e dois instigantes e precisos ensaios de Eliane Robert Moraes nos possibilitarão iluminar alguns possíveis desdobramentos interpretativos da poesia e obra hilstianas.[4]

 

VERTICALIDADE DA ESCRITA: MOVÊNCIA E OPACIDADE

 

Se no primeiro momento da poesia de Hilda predominam a ampliação do sentido e o acréscimo de mensagens, na vertente da literatura como relato memorial, num segundo momento ocorre um desbaste, uma redução cada vez mais acirrada dos efeitos de sentido, em cujo espectro figura uma crescente opacidade, que se tornará característica constante em sua produção.[5]

 

 

SUELI DE MELO MIRANDA

 

Numa entrevista concedida a Braulio Pedroso, em 1961, Hilst afirmava: “Eu diria que os versos se sucedem quase que por magia. O que representa esforço, sem dúvida, é conseguir tecnicamente o que já foi captado sensorialmente.”[6] Esta busca da escritora se adensará ao longo dos anos, e só depois de muito trabalho é que, aos poucos, ela conseguirá aliar a técnica à expressão do sentimento.

 

A contradição flagrante da poesia primeira de Hilst é justamente o fato de a escritora conseguir um maior equilíbrio entre a idéia e sua expressão (de forma a que não haja o nítido entrechoque entre uma idéia complexa e uma resolução estética ainda pouco apurada) somente a partir de 1974. Nesse ano, depois de sete anos de afastamento[7] da poesia (Exercícios para uma idéia, é de 1967), Hilst publica Júbilo memória noviciado da paixão. Neste período, Hilst escreveu oito peças de teatro (1967-1969) e livros de prosa.

 

Em 1980, chegamos à hora dos trombones.[8] Com a publicação de Da morte. Odes mínimas, a poeta alcança o pleno domínio da língua, o limite de seu excesso. A distância temporal entre a publicação desse livro de poesia e do anterior é de seis anos. Tempo de maturação da poesia, período em que Hilst começa a escrever sua prosa, altamente elaborada e madura, desde seu início (1970).

 

Em 1981, foi atribuído à escritora, pelo conjunto de sua obra, o Grande Prêmio da APCA. Num texto em que faz um balanço da obra de Hilst, um leitor atento como Leo Gilson Ribeiro (mesmo que se saiba dos exageros de muitos de seus textos), ao falar do livro Poesia (1959/1979),[9] faz uma justa observação:

 

(...) em nossa opinião, a grande poesia hilstiana só alça vôo mesmo a partir do seu longo silêncio, de sete anos, entre 1967 e 1974. Ao contrário da sua prosa, que não apresenta cesuras nem rompimentos abruptos, a poesia de Hilda Hilst, quer-nos parecer, nada teria de excepcional, se se tivesse limitado ao período anterior a 1974.[10]

 

Demarcada esta data em que a poesia de Hilst alça vôo, um texto de Nelly Novaes Coelho[11] nos ajudará descrever algumas características da obra poética hilstiana. Nelly fala de uma tarefa nomeadora existente na voz da poeta, a palavra demiúrgica que cria o Real,[12] e ressalta, o que mais me interessa, a existência de dois pólos imantados que atraem a invenção da poética hilstiana: o mistério da poesia e do amor. Segundo a estudiosa, esse mistério

 

(...) vai-se alterando e ampliando em círculos cada vez mais largos, à medida que a poeta verticaliza e aprofunda a sondagem de sua palavra. Do interrogar atento e lírico (voltado para os seres e coisas), seus poemas vão radicalizando o interrogar e se concentrando mais no eu, no ser-que-interroga.[13]

 

Nelly afirma, ainda, que a volta[14] de Hilst à poesia (em 1974) é marcada por uma distância, não propriamente de valor poético, mas de intensidade. Os temas já visitados por Hilst retornam, de forma mais densa. O erotismo ganha em força, há uma evolução do conceito de sexualidade, e por meio desta experiência-limite definitiva, o chamamento erótico do amado ausente (tópica já encontradiça nas cantigas medievais), ocorre a descoberta da expansão e duração do homem no tempo.

 

Esse movimento de verticalidade da poesia hilstiana, apontado por Nelly Novaes Coelho, deve-se ao assentamento de uma linguagem poética que ganha corpo e forma, pelo definitivo estabelecimento de marcas estilísticas que singularizam o estilo da poeta. O passo seguinte de Hilst será elevar a linguagem para o plano do insabido, do incognoscível. Partindo desta paixão ambígua, desta experiência-limite, a poeta revisitará os temas recorrentes em sua obra poética: a morte, a vida, a relação mística e amorosa, Deus etc.  

 

A obra poética posterior de Hilst (1974 – 1995) será feita de verticalizações e desdobramentos temáticos e estilísticos progressivamente mais vigorosos e vertiginosos.

 

Para tanto, muitas vezes a poeta se vale de frases poéticas desestruturantes, de uma linguagem marcada pelas volutas, círculos, redemoinhos, descentramentos da escrita. A opacidade referencial aparece quando Hilst aproxima e amalgama opostos, operando dentro da tensão discursivo-conceitual entre o sagrado e o profano, entre o eterno e o instante, o que determinará o caráter instável e movente de muitos dos poemas hilstianos.

Este aspecto da poesia hilstiana é descrito por Jorge Coli,[15] num texto sobre Cantares do sem nome e de partidas (1995). Coli ressalta que a poeta retoma um caminho meditativo neste livro, e que o efeito mais imediato dos poemas é o da comoção. Por fim, o crítico acrescenta que Hilst

 

(...) investe suas frases de uma dinâmica movente, ritmadas por uma força a um tempo natural e poderosa (...) É um texto encantatório e mágico, resistente às análises que descortinam ou às teorias que generalizam. As palavras possuem ali alguma coisa de palpável e de espesso. Aos poucos nos persuadimos dessa metafísica que se inicia no amálgama que às vezes chamamos de impuro e de material, feito de nosso orgânico ser (...) Hilda canta nossas entranhas, nossos órgãos, nossa pele, nosso esqueleto. É como se cada um deles possuísse uma alma na matéria de que são feitos, mesmo os mais ínfimos, mesmo os mais obscenos. Ela canta também as funções vitais que nos fazem vivos e ao mesmo tempo perecíveis. (...) Ela se interroga sobre o tempo, sobre o que passa, o que se prolonga, o que volta. Ela nos leva a sentir a morte como a ausência, e apreender, perplexos, a morte em nós, percebida rapidamente por uma fenda estreita (...)

 

Alguns elementos importantes da obra poética de Hilst posterior a 1974 estão resumidos nesta fala de Coli. A poesia hilstiana, agora, detém-se no tempo, no trânsito entre os opostos: alto/baixo, puro/impuro, sagrado/profano. O pensar o corpo como depositário de sensações que vitalizam nossa existência, que a tornam intensa, inclui também o pensar a perecibilidade desta mesma matéria (de que somos feitos) que nos possibilita as sensações.

 

ENCENAÇÃO DRAMÁTICA E METALINGUAGEM

 

Elencamos dois recursos estilísticos que são recorrentes na poesia hilstiana escrita entre os anos de 1974 a 1995: a encenação dramática do poema e a concentração temática dos livros.

 

A encenação dramática faz com que num mesmo poema se ouçam outras vozes que fazem parte da orquestração poética que multiplica os pontos de vista, permitindo-nos iluminar o que está em cena e o ob-sceno da linguagem poética.   Este espelhamento dramático reflete o avesso do texto, às vezes marcando a emergência da metalinguagem na poesia hilstiana. O interlocutor serve como um eu-ausente, cuja função é possibilitar o aparecer da pergunta, por exemplo, sob a máscara da interlocução.

 

Pulsas como se fossem de carne as borboletas.

E o que vem a ser isso? perguntas.

Digo que assim há de começar o meu poema.[16]

 

Na leitura dos poemas, o que se percebe é que alguns recursos estilístico-formais anteriormente utilizados por Hilst se assentam e são decantados. Em alguns casos, a poeta dá uma nova função para recursos já utilizados. Isto é um índice de uma insatisfação representacional. Ao lidar com complexidades cada vez maiores, com novas formas de apresentação dos temas, a poeta empurra a linguagem para significados cada vez mais flutuantes, entrando num terreno conceitual movediço. Aí, estamos nos limites do que a própria linguagem pode representar.

 

Ao lado deste fazer textual dramático e orgânico, vê-se um progressivo aprofundar das questões já visitadas pela autora. Os temas, os feixes temáticos que atravessam os livros, serão basicamente os mesmos, mas se antes havia um buscar a segurança de certezas, agora paira a dúvida; se antes havia afirmação, agora paira o impasse, o aberto, o escorregadio de uma linguagem que acumula significados ao mesmo tempo que os desmonta.

 

Nos poemas, percebe-se uma reiterada busca de comunicação, um embate dramático com seu objeto de reflexão. O recurso mais insistentemente utilizado por Hilst será uma intensa dialogação com um interlocutor que às vezes é humano, mas na maioria dos casos é uma espécie de duplo da própria consciência da poeta.

 

Nos livros elencados na economia dos afetos este interlocutor é quase sempre um outro-humano, embora alguns poemas façam referência a um eu sobre-humano. Nos livros das economias do terror/medo e do excesso, o que se encontra como interlocutor é, via de regra, um outro não-humano, sobre-humano.

 

Deste modo é que a idéia de Deus, da morte, da vida, dos afetos (o desejo, o medo, a paixão, o ódio, a ira, o amor) serão figuradas ou personificadas, muitas vezes, em formas viventes. Assim, Hilst cria um lugar conceitual, ocupado pela voz da poeta, que é eqüidistante entre o profano/humano e o sagrado/divino.

 

CONCENTRAÇÃO TEMÁTICA E ORGANICIDADE

 

Mais do que dividir a poesia hilstiana em fases ou maturações, o centramento da análise nos livros publicados de 1974 a 1995, deve-se ao fato de que neles há uma maior coesão de alguns recursos estilístico-formais utilizados pela autora. Em vez de traçar uma linha evolutiva da poesia hilstiana, nos ateremos a este momento em que Hilst opera a verticalidade de sua escrita.

 

Em 1974, com a publicação de Júbilo memória noviciado da paixão, a escritora dá uma última configuração àquilo que seria a ‘arquitetura’ de seus livros de poesia. Excetuando-se Amavisse, todos os outros livros de poesia posteriores se concentrarão num único núcleo temático, numa arquitetura dramática bastante cerrada.

 

A organicidade dos livros de Hilst é um índice de que a poeta traça um roteiro no seu fazer poético. Assim, encontra-se, em cada livro de poesia de Hilda Hilst (1974 – 1995), um núcleo temático que toma várias nuances nos poemas, servindo de espinha dorsal, de viga mestra para o desenvolvimento das reflexões da poeta. 

 

Este centro da atração temática se repetirá nos poemas, dando uma ordenação necessária ao pensamento para conter e organizar toda a profusão de questionamentos a que a poeta está sujeita. É precisamente esse processo que lhe possibilita um maior aprofundamento das ramificações que um mesmo tema pode sugerir.  

 

Nos poemas de Júblio memória, noviciado da paixão (1974), o centro de atração temático é o amor não-realizado. A poeta intenta dialogar com o seu amado, que despreza seu amor. O potencial amante se metamorfoseia, sendo chamado por vários nomes - Túlio, Ricardo, Dionísio -, que simbolizam os vários modos de figuração do afeto, no presente caso, do amor.

 

Em Da morte. Odes mínimas (1980) há a preocupação com o redimensionamento da vida por meio da reflexão sobre a morte, o impossível instante do encontro com o desconhecido.

 

Em Cantares de perda e predileção (1983),tem-se uma doída reflexão sobre o sentimento ambíguo e contraditório da paixão, vista sobre viés do paradoxal amálgama entre o ódio e o amor, numa perspectiva de um ser que se  sabe, pelo desejo, inteiro presa do outro ser.

 

Em Poemas malditos gozosos e devotos (1984), a poeta dialoga com um Deus de quem ela desconfia, pois este Deus bebe na crueldade. O Deus do Novo Testamento, que manda seu filho padecer de todo o sofrimento sobre-humano.         

Em Sobre a tua grande face (1986) há a tentativa da nomeação de Deus. O DESEJADO, Cara Escura, Sem Nome[17] , estes são alguns de seus nomes. Nestes poemas, há a busca da dimensão humana, da pequenez do homem diante do possível contato com a divindade, e sua incapacidade de nomear o Absoluto e, num movimento contrário, a elevação do humano em direção ao divino, que se realiza enquanto corpórea fantasia do humano. 

 

Na primeira parte de Amavisse (1989), a poeta se vê diante da consciência da existência do outro, objeto de adoração, de amor e de estranheza, e a tentativa de comungar com essa estranheza. O título do livro, em latim, ‘ter um dia amado’ nos remete à nostalgia, à rememoração de um estado passional fixado no tempo como matéria de vida e reconhecimento. Na segunda parte do livro, ‘Via espessa’, aparece a figura do louco, como um duplo da poeta. Na terceira parte, ‘Via vazia’, tem-se novamente as imprecações a uma divindade cruel. Este livro será elencado na economia dos afetos, mas nele a principal reflexão é sobre a relação do homem com a passagem do  tempo, e sobre como se dá a consciência humana do real.

 

Em Alcoólicas (1990), tem-se a celebração da vida, a busca de sua dignificação e sentido. O escorrer do tempo (metaforizado na bebida, no líquido) como possibilidade para a transformação do homem na busca do entendimento de sua vivência no mundo.

 

Em ‘Da noite’ e ‘Do desejo’ (partes inéditas publicadas no livro Do desejo, 1992),[18] tem-se o itinerário da busca de entender e nomear a intensidade do desejo, em seu viés físico e metafísico. A epígrafe do livro diz: Quem és? Perguntei ao desejo. / Respondeu: lava. Depois pó. Depois nada.[19]

 

Em Cantares do sem nome e de partidas (1995), a nostalgia do amor sonhado toma a cena dramática dos poemas, que refletem a potência deste recordar como ato criador de uma realidade poética em que realidade e sonho se mesclam na apresentação ficcional do momento das perdas, das partidas e da dissolvência do sujeito na intensidade do instante.

 

DAS ECONOMIAS ESTÉTICAS

 

Em sentido geral, etimológico, economia[20] significa o gerenciamento de uma casa, o controle e moderação das despesas domésticas. A palavra pode ser entendida também como o aproveitamento racional e eficiente de recursos materiais; e, por fim, a dinheiro ou bens economizados por poupança.

 

Em sentido estrito, figurado, economia pode se referir ao dispêndio exato de esforço, linguagem, movimento; e também ao arranjo ou modo de funcionar dos diversos elementos de um todo, como por exemplo, em literatura, diz-se “a economia de um conto/poema”.

 

Do que se disse até o presente momento, podem-se ressaltar dois aspectos metafórico-conceituais:

 

O primeiro deles diz respeito ao processo simbólico entendido como eficiência, mínimo dispêndio de palavras/conceitos, tirando daí o máximo aproveitamento do modo como a processo de significação funciona.

 

O segundo, derivado deste primeiro, é que uma economia do excesso, termo que será utilizado mais adiante, é um contra-senso explícito. E é justamente partindo deste contra-senso que inauguramos o percurso teórico que feito até a delimitação das três economias estéticas (dos afetos; do terror/medo e do excesso) para ler a poesia hilstiana.  

 

A idéia do modo como se opera, simbolicamente, uma economia da significação, já nos persegue há muitos anos, desde o momento em que lemos um livro seminal para nossa formação inlectual. Trata-se da tese de doutoramento, depois publicada em livro[21] , do filósofo português José Gil, intutulado Métamorphoses du corps. Foi, então, que foram encontradas duas palavras mágicas: significado flutuante. Elas se referem, dentre outras coisas, ao fato de que em algumas tribos a troca é elemento fundante da circulação de energia, e que os objetos em si deixam de ter um valor material para ter um valor simbólico. Assim, nestas tribos, aquele que acumula objetos/pertences quebra o fluxo da energia, e por isso recebe uma punição. É claro, que José Gil explica tudo isso com uma maestria ímpar, valendo-se da leitura atenta de vários autores, principalmente de Marcel Mauss.

 

O que nos interessa, neste estudo, não é o fato do dom exigir ou não um contra-dom, leitura feita por Jacques Derrida, por exemplo, do “Ensaio sobre o dom”[22], de Mauss, mas justamente o caráter ostentatório, dispendioso, contra-cumulativo presente no potlatch, pois este é um dos processos de significação que ocorrem no próprio discurso, quando os signos entram no fluxo da comunicação. O tempo todo é prreciso construir, reconstruir, arrruinar, refazer significados, para que a comunicação se dê. É a agonística do discurso, como nomeia Lyotard.[23] Precisamente este é o mote da tese que queremos perseguir neste estudo.

 

O potlatch poderia ser assim resumido:

 

 

Desta forma, no campo do valor simbólico, a teoria da dádiva, ou da prestação total, de Marcel Mauss é nosso ponto de partida para pensar como se dão as trocas simbólicas no interior dos sistemas de significação. A escolha deve-se, entre outras coisas, à leitura que Hilst fez de A parte maldita, de Bataille[24] , livro no qual o autor se vale dos escritos de Mauss. Em algumas entrevistas, Hilst cita o potlatch, nomeando-o o poder de perder. A obra de Mauss, portanto, será o principal lugar conceitual, o cimento primeiro das vigas mestras do discurso deste texto, o alicerce e arremate de muitas das idéias aqui comentadas, lugar este de onde deriva toda a ficção teórico-conceitual feita neste estudo.

 

ECONOMIAS ESTÉTICAS: AFETOS – TERROR/MEDO – EXCESSO

 

Nas três economias, aqui elencadas, há a potencialidade/impossibilidade da troca, e mesmo aí, há a necessidade de uma reciprocidade na qual a falta/a ausência e a diferença entram num jogo que se configura não baseado no ‘valor de uso’ das coisas/palavras.

 

O embate que há na economia dos afetos, por exemplo, é entre a carência e o preenchimento desta carência, sendo que a falta, aqui, pode potencializar várias reações ambíguas, que vão da carência – ódio – mágoa – tristeza etc, confundindo, desta forma, o que poderia ser um ciclo repetitivo de valor.

 

O valor simbólico reverte/inverte, assim, a lógica do valor de troca, presente na economia propriamente dita. Por isto, penso que a idéia do dom / contra-dom, da “prestação total”, de Marcel Mauss é uma categoria conceitual operatória que pode ser aplicada à leitura da poesia hilstiana.

 

Mesmo que haja diversas discussões feitas sobre a teoria de Mauss, desde Claude Lévi-Strauss – Jacques Derrida – José Gil etc. – sobre o contrasenso de haver a obrigação do contra-dom, e portanto não fazer Mauss propriamente uma teoria da dávida, o que me importa no que Marcel Mauss diz é o resultado final desta operatória simbólica: uma espécie de valor zerado, mas pleno e prenhe de sentidos, que se gera neste fluxo do desperdício, do excesso.

 

Fotografa-se, assim, com esta idéia de um trânsito simbólico que forma cadeias de sentidos e contra-sentidos (seja pensando a cadeia livro a livro, texto a texto, conceito a conceito, ou palavra a palavra) em economias simbólicas (trocas simbólicas recíprocas e contínuas) que podem ser entrópicas, beirar o transborbamento simbólico, o não-sentido.

 

Neste momento, pensaremos no trânsito do sujeito no tempo, a partir do qual serão descritas as “economias estéticas”. O modo como um poeta dá uma conformação estilística a certos temas recorrentes em sua obra.

 

Na poesia de Hilst, duas linhas de força simbólicas geram o que chamamos, nos passos de Mauss e Bataille, potlach conceitual da significância, uma economia simbólica do contra-senso.

 

A primeira é a pergunta metalingüística, que coloca em xeque o próprio real poético.  A segunda é nomeação – o que Max Müller, citado por Mircea Eliade[25], fala sobre os mitos, chamando-os de “doença da linguagem - o que era nome (nomem)  passa a ser uma divindade (numem). Cito:

 

Graças às descobertas feitas em todos os sectores do orientalismo na primeira metade do século XIX, graças também à constituição da filologia indo-européia e da lingüística comparada, a História da Religiões atinge o seu verdadeiro impulso com Max Müller (1823-1900). O seu Essay on Comparative Mythology, que data de 1856, abre uma longa série de estudos do próprio Max Müller e dos partidários da sua teoria. Max Müller explica a criação dos mitos pelos fenômenos naturais, sobretudo as epifanias do sol, e o nascimento dos deuses por uma <doença da linguagem>: o que, originalmente, não passava de um nome, nomem, torna-se numa divinvidade, numem.

 

 Aplicando-se esta idéia à poesia hilstiana, o que se percebe é que a autora tateia nomes, inventa-os, os refaz, seja no intuito renomear o sentido dos interditos – deus / morte etc. – seja no interior de um único verso, de uma única cadeia significativa, quando Hilst prolifera palavras, metáforas, criando várias camadas conceituais num mesmo poema.  

 

A reflexão sobre os poemas de Hilst nos permite formular a hipótese de que as economias dos afetos, do terror/medo e do excesso se fundam num momento em que a autora investe na experiência estética da desagregação, da dispersão, do descentramento significativo, da reformulação, reinvestindo a representação, por meio da linguagem poética, de seu caráter de síntese fugaz, pois que feita, a poesia, num tempo que por si mesmo se perde e se desagrega.

 

A esta impossibilidade de reter o fluxo do tempo (e portanto de fixar sentidos à experiência), Hilst propaga núcleos discursivos, que entram em contínua troca simbólica. Estes núcleos, no entanto, encenam a impossibilidade de permanência do sentido, pois a cena poética é entendida como um evento fugaz que fotografa um instante, mas que se sabe (para além deste instante) coisa irrecuperável, perdida, neste sentido morta de sentido. Refazer o caminho deste sentido primeiro (original) já é estar em contato com outra coisa que não é o que foi.

 

A reflexão sobre o tempo é o lugar de origem sob o qual a leitura dos livros de poesia de Hilst, contemplados nesse estudo, se ampara. No limite, Hilst está repensando como as experiências se dão no tempo. E como esse mesmo tempo, metáfora da transitoriedade da experiência e da própria existência, contraditoriamente está fora do tempo (utopia humana do deus, do além morte, da eternidade) porque o homem cria ficções para fugir da idéia de sua impermanência.

 

Aqui há um nó sobre o qual Hilst se debruça. Ao pensar os interditos – a figuração de Deus, da morte, do gozo – as ficções humanas, a escritora procede a uma desmontagem simbólico-conceitual, toma os pré-conceitos, as estórias, narrativas, as mitologias do divino, para se auto-batizar enquanto mito da sua própria poesia.

 

Num movimento paradoxal, Hilst cria sua poesia da ruína do simbólico, rebatiza a morte, por meio da linguagem poética, ao mesmo tempo relativiza esse mesmo real poético quando pergunta: “Se eu disser que vi um pássaro sobre o teu sexo, deverias crer?”[26]

 

Tendo o tempo como principal moeda de troca simbólica, faremos, neste estudo, uma leitura de nove livros de poesia de Hilda Hilst, publicados entre 1974 e 1995, dividindo-os em três economias estéticas. As economias dos afetos, do terror/medo e do excesso, e algumas dinâmicas simbólicas existentes entre elas, nos permitiram demarcar um possível terreno conceitual para a interpretação da poesia de Hilst.

 

PRIMEIRO ARRANJO DE LEITURA: ECONOMIAS ESTÉTICAS

 

Elencando os livros de poesia de Hilst, publicados depois de 1974, dividindo-os em três economias estéticas, tem-se o seguinte quadro:

 

Júbilo, memória, noviciado da paixão (1974) Economia dos afetos

Da morte. Odes mínimas. (1980)                  Economia do terror/medo

Cantares de perda e predileção (1983)                    Economia dos afetos

Poemas malditos, gozosos e devotos (1984)   Economia do terror/medo

Sobre a tua grande face  (1986)                             Economia do excesso

Amavisse (1989)                                                    Economia dos afetos

Alcoólicas (1990)                                      Economia do excesso

Do desejo (1992)                                      Economia dos afetos

Cantares do sem nome e de partidas (1995)  Economia do excesso

 

Esse quadro nos possibilita fazer um arranjo, de modo que os livros que pertencem a uma mesma economia estética sejam agrupados em três conjuntos. Em seguida, é possível fazer pensar esses primeiros conjuntos sob a ótica de três dinâmicas simbólicas, que marcam a comunicação entre as economias dos afetos e do terror/medo e a economia do excesso.

 

Um primeiro arranjo dos livros, de acordo com seus eixos temáticos, nos possibilita dividido-los em três grandes grupos:

   

ECONOMIA DOS AFETOS – Júbilo, memória, noviciado da paixão (1974), Cantares de perda e predileção (1983), Amavisse (1989) e Do desejo (1992).

 

ECONOMIA DO TERROR/MEDO – Da morte. Odes mínimas (1980), Poemas malditos gozosos e devotos (1984).

 

ECONOMIA DO EXCESSO – Sobre a tua grande face (1986), Alcoólicas (1990) e Cantares do sem nome e de partidas (1995).

 

A economia dos afetos trata das dinâmicas de figuração dos sentimentos. Tendo sempre o tempo como fio condutor, ou amarra simbólica, neste momento, será descrito como Hilda Hilst figura, em sua poesia, o amor, o desejo, a paixão, os rompimentos amorosos, as partidas, a saudade, o gozo, o sexo etc.

 

A economia do terror/medo trata de dois interditos básicos: as figurações da morte e as figurações de Deus, ou da divindade. Como se verá, nesta economia estética, Hilst se ocupará da relação do homem com o tempo. Ao interrogar as figurações da morte/deus, já sedimentadas pela tradição, Hilst um faz um quiasmo conceitual entre o sagrado e o profano. A humanização de deus; o bestiário (poeta=porco; morte=cavalinha). Isto porque Hilst une, num só lance discursivo a divinização do profano e a profanização do sagrado. As ficções/figurações das divindades são expostas como um modo que o homem encontrou para se livrar da consciência de sua própria mortalidade. 

 

A economia do excesso é uma extensão ou radicalização das anteriores. É o lugar de maior tensão e intensidade da linguagem poética. É o lugar de enfrentamento, de embate, de luta, de agonística do discurso. É o lugar em que a própria linguagem poética vira palco, de forma a beirar a estetização, o exagero estilístico presente nestes livros nos demonstra isto.

 

Por isto, há um espelhamento simbólico possível nesta segunda organização dos livros proposta. A última economia estética é lugar do contra-senso da representação, do excedente de produção simbólica. Tematicamente, a economia do excesso potencializa e dinamiza vertiginosamente as trocas simbólicas presentes nos livros anteriores.

 

 

SEGUNDO ARRANJO DE LEITURA: DINÂMICAS SIMBÓLICAS

 

Há, desta forma, um estreito vínculo entre as duas primeiras economias estéticas e a terceira. Uma primeira dinâmica simbólica será denominada “dos afetos a excesso”. Uma estrutura de espelhamento, em relação ao eixo temático, na economia dos afetos, me permite propor uma outra divisão para o quadro anterior:

 

ECONOMIA DOS AFETOS                             ECONOMIA DO EXCESSO

Júbilo, memória, noviciado da paixão          Cantares do sem nome e de partidas

Cantares de perda e predileção                

Amavisse                                                            

Do desejo                                              

 

Um segundo espelhamento entre os eixos temáticos, na economia do terror/medo, possibilita vislumbrar duas outras dinâmicas simbólicas [morte - do terror ao excesso; deus - do terror ao excesso]:

 

ECONOMIA DO TERROR/MEDO                    ECONOMIA DO EXCESSO

 

Da morte. Odes mínimas                            Alcoólicas

 

Poemas malditos gozosos e devotos                         Sobre a tua grande face

 

Na primeira dinâmica simbólica (dos afetos a excesso), há um desdobramento da reflexão acerca da passagem do tempo, da impossibilidade de reter seu fluxo. A representação das perdas reais e metafóricas vai se “adensando” ao longo da economia dos afetos, desembocando nesta dinâmica.

 

Há um movimento de alargamento simbólico-conceitual, que atravessa a economia dos afetos, até que se chegue a um impasse da nomeação do próprio corpo, fonte de toda a manifestação dos afetos: “Ossos. Carne. Dois Issos sem Nome.”[27]

 

A derivação seguinte para esse impasse da nomeação, para a imposibilidade de dar sentidos mesmo à matéria de que é feito o corpo, tomado pelo afeto, é a figuração e potencialização dramática dessa impossibilidade. Em Cantares do sem nome e de partidas, há uma espécie de lapso temporal discursivo, que marca um salto para o “fora da lógica”, para o “fora do sentido”, para o contra-senso. 

 

O texto, assim, vira avesso, ruína, desdobramento da própria desmontagem simbólico-conceitual. E assim perfaz o seu caminho de significação. O que se quer dizer com isso é que o livro Cantares do sem nome e de partidas repõe temas e recursos estilísticos dos livros anteriores, ao mesmo tempo em que os empurra para o impasse discurso, num exagero estilístico que beira ao rococó. Esse livro é transbordante, excessivo para os adeptos de uma linguagem poética mais austera, seca e controlada. Hilst partilha de um apreço enorme pelo excesso, e tenha consciência disso, faça isso racionalmente.

 

A segunda dinâmica simbólica (morte - do terror ao excesso) se dá entre Da morte. Odes mínimas (1980) e Alcoólicas (1989).  O segundo livro é uma espécie de negativo condensado e tensionado do primeiro. Da morte. Odes mínimas é um livro longo, com 50 poemas breves, versos curtos, um vocabulário relativamente simples, Alcoólicas é um livro curto, com 9 poemas, versos longos, ritmo quebrado, vocabulário precioso.

 

Em Da morte. Odes mínimas Hilst usa uma linguagem da contenção nos poemas, que têm um andamento constante e ritmado. Em Alcoólicas, parafalar da vida, o quadro estilístico é absolutamente outro: é quase como um orgasmo imagético-conceitual. O livro tem apenas nove poemas, longos, com versos enormes, quase transbordando da linha; com ritmo descompassado, cortado, fissurado e um vocabulário raro. Em Alcoólicas tudo é transbordamento, excesso, desperdício. Estilisticamente falando, este livro é quase um “negativo” do anterior. Percebe-se, nele, uma amplificação invertida do modo como Hilst opera com os recursos estilísticos em Da morte. Odes mínimas

 

Na terceira dinâmica simbólica (deus – do terror ao excesso), encontram-se dois modos da figuração do divino.  Em Poemas malditos, gozosos e devotos,  Hilst repensa a estória do Deus da mitologia cristã, que é contada Novo Testamento, centrando-se na crucificação de Cristo. Usa, para tanto, uma estrutura narrativa dialogada, com poemas mais longos, mas com versos curtos, com um andamento constante.  Em Sobre a tua grande face a figuração do divino se expande, a própria tentativa de nomear Deus, com vários nomes, já é um índice disso. É um livro curto, 10 poemas, com uma linguagem transbordante, aquela “volúpia com a língua”[28] a que a escritora se refere em uma entrevista.

 

 

REMATE SEM NÓ

 

Desde o início de sua carreira, a linguagem poética de Hilst foi se construindo a partir de um intenso diálogo com a tradição literária. Com o passar dos anos, sua dicção poética aos poucos revigora o passado, seja pela derrisão, seja pela reinserção de formas e temas da tradição em vozes dissonantes que mesclam nos poemas.

 

Hilst tem consciência de que o poeta é uma persona, uma máscara que atua no poema.[29] Por isso, mesmo quando usa formas poéticas, metáforas e temas já visitados pela tradição, a escritora nos dá indícios de que esses recursos são utilizados para criar uma empatia, um pacto de “confidência” com o leitor.

Esse jogo cênico, que aparece na poesia hilstiana, existe há séculos. E sabe-se que ele foi usado conscientemente por muitos poetas. Tome-se, como exemplo, a lírica trovadoresca. Um texto de Angelica Rieger diz:

 

   Le poète est le créateur de la domna aimée et de l’amant courtois figurant dans sa canso. On n’exclura point le cas où il est également l’amant de la femme réelle, possibble au niveau du vécu, mais sans intérêt dans le cadre de l’analyse textuelle. Cette femme destinataire du poème, inspiratrice et/ou mécène du poète, n’a qu’une relation purement poétique avec l’amant courtois, protagoniste de la canso.

   De nombreux travaux sur la fin’amors ont chercé à identifier la realité vécue derrière la fiction de la canso troubadouresque, et n’on pas respecté cette distinction nette dont les troubadours eux-mêmes étaitent parfaitement conscients. L’identification (voulue par le troubadour) du poète avec l’amant courtois et de la femme avec la domna aimée se situe donc hors du texte, au niveau de le connivence de l’auditoire qui, par conséquent, joue un rôle primordial dans la lyrique troubadouresque.

 

(...) Toujours dépendat de cet auditoire que s’érige en juge, le troubadour profite du caractère spécifique du contat direct entre son public et lui pour créer une ambiance de complicité, une connivence comparable à celle que existe entre l’acteur et son public: le poète apparaît ainsi comme le metteur en scèce d’une « intrigue amoureuse » dont il joue le rôle principal (celui de l‘amant courtois).[30]

   

O movimento de uma leitura horizontal, cronológica, da obra poética de Hilst demonstra como ela mantém um intenso diálogo, muitas vezes paródico e irônico, com a tradição. A esse movimento, oponho um outro, agora vertical, de intensidade e aprofundamento da dicção poética, que pode ser percebido quando se lê a poesia que Hilst produziu depois de 1974.

 

Nessa poesia, percebe-se que a linguagem poética de Hilst muitas vezes entra em embate com a tradição, mais especificamente com a dicção elevada que toma o primeiro plano da cena, principalmente no que diz respeito à dicção elevada de sua poesia, à busca do sublime, que marcou sua poesia primeira, como afirma Eliane Robert Moraes.[31]

 

DO TRÂNSITO DO TEMPO NA POESIA DE HILST

 

As marcas temporais podem indicar o lugar discursivo em que o sujeito aparece, como um evento, lugar em que se abre uma fenda na qual se instaura a voz do poeta. Deste lugar discursivo é que o sujeito revela sua apreensão do mundo, expondo-se ao tempo da linguagem a partir da figuração, da encenação dos afetos  (emoções, sentimentos, sensações).

 

Ao pensar a figuração do tempo e outras figurações, descreveremos possíveis categorias para a análise da poesia hilstiana. Na obra poética de Hilst a experimentação do tempo – o lento caminhar para a morte, a luta contra a permanência do Nada (a agonia) e o descontrole do corpo tomado pela pequena morte em vida (o gozo) - assume o estatuto paradoxal de uma sensualidade quase sexual de se estar vivo indissoluvelmente ligada à consciência de se saber morrendo em vida.

 

Na fusão entre a representação estética destes dois tempos: o tempo da dilatação (longo e moroso da existência) e o tempo da fugacidade (a pequena morte do gozo), Hilst interporá seu texto poético como uma  ramificação de questões derivadas destas experiências do(s) tempo(s). Para pensar a perda, a despedida, o amor, o desejo, a vida e a morte, as figurações da divindidade, Hilst organizará sua experiência estética em torno da questão do(s) tempo(s).

 

Por exemplo, quanto à criação poética, Hilst declara, em entrevistas, que fazer poesia é estar além da emoção, se desprender dela para contemplá-la, e portanto atribuir-lhe novos sentidos e significados muitas vezes inaparentes. Estar além é de alguma forma recordar, relembrar, atribuir um sentido posterior a algo já vivenciado ou pensado. Aí, o lapso temporal imprescindível à criação. Ver retrospectivamente é um modo de decantar as emoções. Por isso, a autora declara:

 

   Estou persuadida que o amor é a única coisa a viver. Minha infra-estrutura é totalmente amorosa. Gostaria sempre de viver na paixão. Pode nos custar anos de vida, esse “viver” somente em função da paixão. Como uma corda que tende a se romper. Penso que apenas essa tensão, a paixão, justifica o tempo que a gente passa a viver, e daria anos de minha vida para não conhecer este estado. Por isso escrevo, porque penso que a poesia é precisamente o contrário: escapar da emoção, fazer com que a emoção se desprenda da emoção cotidiana. A poesia é um estar além da emoção. É uma maneira de disciplinar o dizer amoroso.[32]

 

Este movimento de distanciamento elabora um quadro mais geral das sensações é o que permite ao criador disciplinar o seu representar o mundo. O processo de compreensão se dá neste trânsito paradoxal entre o estar e o não-estar imerso na experiência, quando se transita no tempo. A criação artística requer, do poeta, este estado de impermanência do sujeito/eu, que pode ser nomeado subjetividade em trânsito.

Existir é estar perplexo, é saborear estes nadas cotidianos até que se encontre a morte. Pensar a morte, representá-la, é sofrer a cotidiana experiência da finitude das coisas, dos sentimentos e do próprio ser humano. Existir é tomar consciência do tempo, da perecibilidade do corpo. Viver o transitório da vida com intensidade, seja na agonia da morte ou na fugacidade do gozo, é estar num estado passional diante da própria existência. Ao descobrir paixão/sofrimento em nós mesmos, podemos contemplar tudo o que é vivo com uma comovida compaixão.

 

Na poesia, na obra de arte, há uma terra de ninguém, cantos obscuros que para serem iluminados necessitam de sensibilidades “antenadas” à nossa. (...) Sinto que em tudo há necessidade de um estado de paixão, de embriaguez da vontade. E a gente só consegue alguma coisa vigorosa, verdadeira, viva, num estado assim. Porque somente aí então fazemos nosso caminho dentro do outro e sofremos o percurso alheio, por pura intuição mágica. (...) É bem verdade que o escritor está sempre falando de si mesmo, porque é somente através de nós mesmos que podemos nos aproximar dos outros. Nos desnudando procuramos fazer com que os outros se incorporem ao nosso espaço de sedução. Estendemos as teias e desejamos que o outro faça parte delas, não para devorá-lo mas para que sinta perplexidade e faça a pergunta, para que tome conhecimento da possível qualidade do nosso fio-sedução, caminhe conosco num veículo que pode ser afetivo-odioso. [33]

 

Este descentrar-se para chegar a si mesmo, este largar-se ao léu para alcançar as situações-limite, extremas, é um dos centros conceituais sob os quais gira a obra poética hilstiana. Assim percorremos nosso caminho dentro do outro, fazendo com ele o seu percurso, sofrendo com ele, por pura compaixão. Isto nos remete à seguinte idéia de Bakthin sobre a criação artística:

 

A atividade estética propriamente dita começa justamente quando estamos de volta a nós mesmos, quando estamos no nosso próprio lugar, fora da pessoa que sofre, quando damos forma e acabamento ao material recolhido mediante a nossa identificação com o outro, quando o completamos com o que é transcendente à consciência que a pessoa que sofre tem do mundo das coisas, um mundo que desde então se dota de uma nova função, não mais de informação, mas de acabamento.[34]

 

Com o passar dos anos, a poesia hilstiana revisita velhos temas, vestindo-os com novas roupagens. O amor e a paixão, por exemplo, serão cada vez mais sentimentos sonhados, faltosos, brotando da não-realização. São aos poucos transformados em gestos que ficaram na memória, uma re-apresentação da paixão vivida, do amor supostamente conquistado.

 

Aí, vemos um distanciamento do sujeito, não mais de si, porque ele se interioriza, mas do objeto que proporciona o desejo. A representação, neste sentido, é toda lembrança, toda recordação. É quase como um acordo mútuo: eu volto a ti, sentimento, para que sejas memória viva, rediviva, e assim fique cristalizado na mente do outro (o leitor), por meio das imagens que construo com palavras.

 

Sobre esta espécie de êxtase diante do objeto (que pode ser o outro ou a própria projeção do eu), da necessidade do descentramento de si mesmo para mergulhar em nossa vida interior, atingindo nosso ipse (si mesmo/a, em latim), Georges Bataille diz o seguinte:

 

Je dirai ceci d’obscur: l’objet dans l’expérience est d’abord la projection d’une perte de soi dramatique. C’est l’image du sujet. Le sujet tente d’abord d’aller à son semblable. Mais entré dans l’expérience intérieure, il est en quête d’un objet comme il est lui-même, réduit à l’intériorité. De plus, le sujet dont l’expérience est en elle-même et dès le début dramatique (est perte de soi) a besoin d’objectiver ce caractère dramatique. La situation de l’objet que cherce l’esprit a besoin d’objectiver ce caractère dramatique. La situation de l’objet que cherche l’esprit a besoin d’être objectivement dramatisée. A partir de la félicité des mouvements, il est possible de fixer un point vertigineux censé intérieurement contenir ce que le monde recèle de déchiré, l’incessant glissement de tout au néant. Si l’on veut, le temps.[35] 

 

Ao pensar no distanciamento do sujeito de si (subjetividade que se move, caindo no tempo) e no distanciamento do sujeito do objeto que lhe proporciona o desejo (descentramento do sujeito de si mesmo para mergulhar em sua vida interior), teremos alguns elementos para descrever como se dá a representação estética da experiência do tempo na poesia de Hilda Hilst.

 

FENDAS DOS TEMPOS

 

Embora se possa falar de temas recorrentes sobre os quais Hilst se debruça em seus poemas, há um ponto de tensão que atrai e ao mesmo tempo impossibilita um remate final que nos dê um retrato acabado desses mesmos temas. Isto acontece porque os temas (embora sejam o centro gravitacional dos livros) se dispersam e multiplicam, se amalgamam uns aos outros, ao longo dos livros. Por isso, o mais correto seria falar em núcleos ou feixes temáticos.

 

Hilst não só tece logicamente o tecido do texto poético, mas, num aparente contra-senso, ao mesmo tempo o esgarça. Muitas vezes, a poeta corta, desvia, ou desoperacionaliza o discurso poético com perguntas, que explicitam a discussão exposta sobre a “irrealidade” do poema, ou do que a linguagem poética/metafórica cria etc. Ou seja, num mesmo movimento discursivo, Hilst nos dá o direito e o avesso de seu texto, sua camada aparente (de poder encantatório, de beleza da palavra poética), mas também expõe a sua ineficácia lógica, sua inverossimilhança explícita.

 

Esse dado reforça a idéia de que Hilst figura uma cena dramática  em sua poesia. E nela coloca um excedente simbólico fora de cena (ob-sceno), pela necessidade de alargamento do gesto poético. Este transbordamento significativo é posto em primeiro plano da cena para desautorizar a “verossimilhança” dos próprios poemas. Assim, o poema torna-se uma figuração em alta tensão, em curto-circuito, o que alarga os sentidos ao mesmo tempo em que os arruína.

 

Alguns livros de poesia de Hilst caminham para este lugar discursivo do trânsito vertiginoso do processo de significação. Neles, o poema é o lugar discursivo no qual se encenam, se figuram as experiências reais ou potenciais. Este lugar de tensionamento conceitual tem a reflexão sobre o tempo como um elemento fundante, primordial, que impossibilita o remate final, o assentamento da significação.

 

Sendo o centro gerador dos contrastes significativos, o tempo é o personagem principal da poesia hilstiana escrita entre 1974 e 1995. É lugar de passagem, de trânsito. É um estar sempre “entre”. Esse dado determina uma dinâmica das trocas simbólicas que se figura ou se atualiza como momento ímpar de tensão representacional.

Antes de pensar em temas da poética hilstiana, o tempo é o centro ou amarra conceitual que liga os temas entre si, formando, desse modo, uma tela, um quadro com paisagem de fundo. Os temas, quase sempre, estarão vinculados, subordinados, à reflexão sobre o tempo, que projeta o poema sobre uma superfície com profundidade, e é sobre essa superfície que os grandes temas da poesia de Hilst são encenados.

 

Assim, sob argumento do tempo, Hilst desenvolverá toda a temática recorrente em sua poesia: a carência, a melancolia, o medo, a falta, a saudade, a despedida, o rompimento; até a visita à figuração de experiências mais amplas, tais como os afetos (amor, paixão, desejo, gozo, ódio), as relações entre vida/morte e humano/divino – profano/sagrado.

 

Hilst investe a palavra poética de um estatuto de fuga, divergência do lugar-comum da língua ordinária, mas também dos lugares-comuns da história da tradição poética literária. O dado importante é que ela faz isto “de dentro”, pois investe de outros muitos atributos os lugares-comuns da tradição lírica.

 

Assim, seu texto poético é efeito um pouco de construção, um pouco de ruína. O que marca, além de seu caráter paradoxal, uma passagem do contínuo ao descontínuo discursivo, seja da língua, seja da tradição poética. A poesia, como diz Maurice Blanchot, é a palavra essencial do desvio:

 

A linguagem é o acordo do movimento de esconder e desviar, ela vela por ele, preserva-o, perde-se e confirma-se nele. Nisso, pressentimos porque a palavra essencial do desvio, a “poesia” na escrita, é também palavra em que gira o tempo, dizendo o tempo como virada, essa virada que se torna às vezes visível, revolução.[36]

 

O desvio, criado por Hilst, é não só um desvio da liguagem, mas um desvio de si mesmo, um distanciamento do criador de si mesmo enquanto ser que se cria, enquanto outo eu, neste trânsito da escrita.

 

Para compreender, o homem deve estar a uma certa distância, sofrer e não sofrer. Os temas que me interessam? O tempo, o existir, o corpo... a morte, o desejo de transcendência, um delírio vivo diante da vida, a solidão, a aspereza dos contatos, a perplexidade diante do existir. Minha alienação não é sofrida, ela é provocada a fim de executar a tarefa prescrita por San Juan de la Cruz: “entremos mas adentro en la espessura”.[37]

 

 

Discorrer sobre o tempo é também falar sobre a experiência da dissolvência do corpo. A obsessão pelo tempo, na obra de Hilst, é índice de uma revolta e de uma figuração.[38]

 

Revolta contra a perecibilidade do corpo, e “fingimento” teatral de figurar nesta revolta um certo ar de superioridade, de uma fingida resignação diante da consciência de não se estar grudado ao tempo. Para exemplificar, cito o primeiro poema de “À tua frente. Em vaidade”, última parte de Da morte. Odes mínimas, em que a poeta escreve:

 

E se eu ficasse eterna?

Demonstrável

Axioma de pedra? [39]

 

Nesses versos, percebe-se a visada racionalizante da poesia hilstiana, seja pelo viés metalingüístico mais aparente do texto, ou pelo refinado senso de humor, pela ironia cáustica que se refere ao entendimento do real poético como uma construção ficcional que seria mais verdadeira que o próprio real, à medida que potencializa, pela exatidão e encantamento da palavra, a encenação dramática do próprio real poético.

 

A temporalização, a consciência da passagem do tempo, refletida no texto-tecido-poema, é justamente o que assentará a reflexão será feita aqui. A figuração dramática do tempo passando pelo corpo, pelo discurso poético, é que dará sustensão à nossa leitura, sendo o centro gerador e aglutinador dos questionamentos colocados pela escritora em seus livros de poesia.

 

O que mais impressiona o homem <moderno>, habituado à teoria e à ciência lingüística de hoje, e para quem a linguagem é exterior ao real, película fina e inconsistente senão convencional, fictícia, <simbólica>, é que nas sociedades primitivas, ou como se costuma dizer <sem história>, <pré-históricas>, a linguagem é uma substância e uma força material. Embora fale, simbolize, comunique, isto é, estabeleça uma distância entre si mesmo (como sujeito) e o exterior (real) para significar num sistema de diferenças (a linguagem), o homem primitivo não reconhece esse ato como um ato de idealização ou de abstração, mas pelo contrário como uma participação no universo que o rodeia.[40]

 

No limite, a própria linguagem, neste estudo, é entendida, como um figuração do real, como fonte que gera uma ficção. Uma das funções do poético é justamente essa, não supor que a linguagem corresponde à realidade, sabendo que cada palavra pode entendida como uma criação estética. Borges escreve:

 

Em alemão, o vocábulo lua é masculino. Assim foi possível a Nietzsche dizer que a lua é um monge que contempla invejosamente a terra – ou um gato (Kater) que pisa um chão de estrelas. Os gêneros gramaticais também influem na poesia. Dizer “lua” ou dizer “espelho do tempo” são dois fatos estéticos. Mas a metáfora é uma obra de segundo grau, pois “espelho do tempo” compõe-se de duas unidades, enquanto a palavra “lua” talvez nos revele ainda mais eficazmente o conceito de lua. Cada palavra é uma obra poética. (...) Já o fato de haver uma palavra para designar o silêncio parece-me uma criação estética.[41]

 

Justamente aí, nesta suspensão da descrença é que se faz a fé poética,[42] segundo Coleridge. Temos, assim, uma outra verossimilhança possível, baseada numa figuração movente do real. O tempo, por sua vez, é um conceito no qual esta instabilidade da representação do real pode estar presente:

 

Los hombres son figuras en el tiempo y el espacio y en cualquier momento, como corresponde a su posición en estas cuatro dimensiones, pueden ser localizados y datados. Pero con esto no basta. Como quinta coordenada se añade en el caso de los hombres y de todo aquello que experimentan y hacen, la determinación de su paso a través del universo simbólico, donde los hombres conviven. Representante manifiesto de esta dimensión es el lenguaje, esto es, los símbolos globales, complejos, humanos, diferentes de una sociedade a outra, que sirven, asimismo, para que los hombres se comuniquem y orienten. Pero a esta dimensión pertenecen también los contenidos simbólicos como, por ejemplo, los conceptos o lo que llamamos el ‘sentido’ de las comunicaciones – dicho con brevedad, todo cuanto en el trato de los hombres pasa y es configurado por su ‘conciencia’ – y también el significado actual de los conceptos ‘espacio’ y ‘tiempo’. Éstos como otros símbolos humanos no se dan de una vez por todas. Siempre están en movimiento, siempre haciéndose lo que son y siempre en devenir.[43]

 

 

NOTAS

[1]            CIORAN, Emile M. Silogismos da amargura. Rio de Janeiro: Rocco, 1991. p. 11.

[2]         Ver bibliografia no final da tese.

[3]         Para conferir os dados de publicação desses textos, consulte-se a bibliografia da tese.

[4]        PÉCORA, Alcir. O corpo do texto. Disponível em: http://www.oficinainforma.com.br/semana /leituras-20020413/03.htm. Acesso 28 set. 2004. \\ MORAES, Eliane Robert. Da medida estilhaçada. In: INSTITUTO Moreira Salles. HILDA HILST. Cadernos de Literatura Brasileira. São Paulo, n. 8, out. 1999. pp. 114-126.  \\  MORAES, Eliane Robert. A prosa degenerada. Folha de São Paulo, São Paulo, 10 maio 2003.

[5]            MIRANDA, Sueli de Melo. Frente à ruivez da vida (letra e transmissão na poesia de Hilda Hilst). (Mestrado em Letras, Estudos Literários). Minas Gerais, UFMG, 2003. p. 61. Grifos meus.

[6]          PEDROSO, Braulio. Hilda Hilst e a poética. O Estado de São Paulo, São Paulo, 5 ago. 1961.

[7]             Na verdade, Hilst não deixa de escrever poesia, entre estes anos. Ele escreve poemas, mas não publica um livro de poesia. Alguns dos poemas de Júbilo memória noviciado da paixão (1974) foram escritos em 1969. Ver: HILST, Hilda. Fluxo-floema. São Paulo: Perspectiva, 1970. p. 187.

[8]          Expressão usada por Hilst. Conferir em:  ARÊAS, Vilma; WALDMAN, Berta. Hilda Hilst - o excesso em dois registros. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 7 out. 1989. \\ KASSAB, Álvaro L. A poesia é a hora dos trombones. Diário do Povo, Campinas, 18 fev. 1990.

[9]             HILDA, Hilst. Poesia (1959/1979). São Paulo: Edições Quíron / Instituto Nacional do Livro, 1980.

[10]         RIBEIRO, Leo Gilson. Os versos de Hilda Hilst, integrando a nossa realidade. Jornal da Tarde, São Paulo, 14 fev. 1981.

[11]            COELHO, Nelly Novaes. Da poesia. In: INSTITUTO Moreira Salles. HILDA HILST. Cadernos de Literatura Brasileira, São Paulo, n. 8, out. 1999. pp. 66-79.

[12]            Idem, p. 67.

[13]            Id. ibid., pp. 67-68.

[14]            Hilda Hilst fica 7 anos sem publicar um livro de poesia, de 1967 até 1974.

[15]            COLI, Jorge. Meditação em imagens. Folha de S. Paulo, São Paulo, 14 jun. 1996.

[16]            HILST, Hilda. Do desejo. São Paulo: Globo, 2004. p. 26.

[17]          Consultar: MIRANDA, Sueli de Melo. Frente à ruivez da vida (letra e transmissão na poesia de Hilda Hilst). (Mestrado em Letras, Estudos Literários). Minas Gerais, Universidade Federal de Minas Gerais, 2003.  A autora faz a seguinte anotação, na página 126 de seu trabalho: "Já em Sobre a tua grande face, de 1986, a escrita de Hilst formaliza a presença da opacidade. O 'Sem Nome', enquanto nome próprio, antes mencionado em Qadós como o sem-nome, situa-se no eixo desse livro de poesia." Grifos meus.

[18]          Livro no qual se encontram 20 poemas inéditos, e Amavisse, Alcoólicas e Sobre a tua grande face, livros de poesia de Hilst já publicados anteriormente.

[19]          HILST, Hilda. Do desejo. São Paulo: Globo, 2004. p. 16.

[20]          HOUAISS, Antônio. Dicionário eletrônico Houaiss de língua portuguesa. Instituto Antônio Houaiss. Impressão realizada em 26/12/2005.

[21]          GIL, José. Métamorphoses du corps. Paris: Éditions de la Différence, 1985.

[22]          MAUSS, Marcel. Essai su le don - forme et raison de l'échange dans les sociétés archaïques. Sociologie et antropologie, quatrième édition, Paris: Presses Universitaires de France, 1968. pp. 143-227.

[23]          LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002.

[24]          BATAILLE, Georges. A parte maldita. Rio de Janeiro: Imago, 1975.

[25]          ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano – a essência das rreligiões. Lisboa: Livros do Brasil, s/d. p. 15-16. Grifos meus.  

[26]          HILST, Hilda. Do desejo. Op. cit., p. 20.

[27]          HILST, Hilda. Do desejo. Op. cit., p. 34.

[28]          GRAIEB, Carlos. Hilda Hilst expõe roteiro do amor sonhado. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 14 ago. de 1995. Cito a fala de Hilda: “Tenho vontade do barroco, uma volúpia com a língua.” 

[29]          Sobre as possibilidades de retomar uma dicção elevada para a poesia brasileira, depois do modernismo, Alcir Pécora afirma que a poesia de Hilst investe em duas estratégias: uma é a da poesia órfica, com matriz em Rilke; a outra é “(...) uma espécie de cantar à antiga, um gosto de antigualhas que está perfeitamente nítido, por exemplo, em Roteiro do silêncio, de 1959, e em Trovas de muito amor para um amado senhor, de 1960. Neles, a persona lírica finge ser a amiga medieval ou a pastora quinhentista, edificando cenários longinquamente amenos, visões mentais da tradição, que, entretanto, ecoam dissonantes. (...) Não raro, a ironia se solta, quase desabrida, e contamina a imaginação do amor, que se queria delicada e branda. A persona lírica põe-se, então, do outro lado da fronteira que abriga as moças donzelas e a vida burqguesa do amigo, com seus filhos lindos e sua mulher, legítima e acinturada”. In: PÉCORA, Alcir. Nota do organizador. In: HILST, Hilda. Exercícios. 1a ed. São Paulo: Globo, 2002. pp. 7-8. Grifos meus.

[30]          RIEGER, Angelica. La dialectique du réel et du poétique chez les trobadours. Les quatre “protagonistes” de la fin’amors. In: Revue de langue romanes. Montpellier , Université Paul Valéry, tome LXXXVII, 1983. pp. 241-257. Citação: pp. 241 e 243. Grifos meus.

[31]          Conferir MORAES, Eliane Robert. Da medida estilhaçada. In: INSTITUTO Moreira Salles. HILDA HILST. Cadernos de Literatura Brasileira. São Paulo, n. 8,  out. 1999. pp. 114-126.

[32]          PISA, Clelia e LAPOUGE-PETORELLI, Maryvonne. Brasileiras (voix, écrits du Brésil). Paris: Des Femmes, 1972. pp. 341-358.

[33]          GONÇALVES, Delmiro. O sofrido caminho da criação artística, segundo Hilda Hilst. O Estado de S. Paulo. São Paulo, 3 ago 1973. Grifos meus.

[34]          BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992. p. 46.

[35]          BATAILLE, Georges. L’experience intérieure. Paris : Gallimard, 1992. p. 137.

[36]          BLANCHOT, Maurice. A conversa infinita. São Paulo: Escuta, 2001. p. 59. 

[37]          BOJUNGA, Cláudio. Quatro conversas com o mistério Hilda Hilst. Jornal da Tarde. São Paulo, 24 jun. 1972.

[38]          Figuratio, - onis, subs. f. II – Sentido figurado: imaginação, fantasia. Figuro, -as, -are, -avi, -atum, v. tr. I –II – Sentido figurado: conceder, imaginar, figurar, empregar figuras. In: FARIA, Ernesto. Dicionário escolar latino- português. Rio de Janeiro: FAE, 1988. pp. 223-224.

[39]          HILST, Hilda. Da morte. Odes mínimas. São Paulo: Globo, 2003. p. 79.

[40]          KRISTEVA, Julia. História da linguagem. Lisboa: Edições 70, 1977. p. 82.

[41]          BORGES, Jorge Luis. Sete noites. São Paulo: Max Limonad, 1980. pp. 121-122.

[42]          Idem, p. 27. “A fé poética é uma suspensão voluntária da incredulidade, disse Coleridge.”

[43]          ELIAS, Norbert. Sobre el tiempo. México: Fondo de Cultura Económica, 1997. pp. 146-147.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

 

BIBLIOGRAFIA ESCOLHIDA DE HILDA HILST

 

POESIA

 

Júbilo, memória, noviciado da paixão. São Paulo: Massao Ohno, 1974.

Da morte. Odes mínimas. São Paulo: Massao Ohno/Roswitha Kempf, 1980.

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Sobre o Potlatch: Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Potlatch. Acesso em 20 janeiro 2006.

 

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Edson Costa Duarte é doutor pela Universidade Federal de Santa Catarina. Pós-doutorando pela Unicamp – IFCH – Fapesp.

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