Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?
Carlos Drummond de Andrade
Aquele para quem a penúria foi testemunho de seu desabrigo, de seu exílio e que só se sentia em casa em hotéis baratos ou na casa de algum amigo complacente, para quem a Biblioteca Nacional em Paris talvez tenha sido o que mais se aproximou de sua cidade natal e, paradoxalmente, o único texto realmente completo que redigiu, Origem do drama barroco alemão, foi rejeitado, acabou por criar uma obra híbrida e fragmentada, “constituída de ensaios, prefácios, palestras, roteiros para rádio e um corpo considerável de jornalismo. Resenhas de livros, relatos de viagens, folhetins sobre um ampla variedade de temas culturais e sociais – de cinema a casas de bonecas, de excursões bibliográficas à arquitetura – expressam ao mesmo tempo a vida precária de Benjamin e as colagens contingentes tão típicas de suas inclinações.” Aquele que colecionava livros infantis e dos mentalmente perturbados, dedicava-se à grafologia, fazia experiências com haxixe, que leu Novalis, Schlegel, kafka, Proust, Nietzsche, Rosenzweig, Marx, Freud e tantos outros e se viu no nódulo de tendências tão contraditórias que acabaram se apresentando como linhas de interpretação de sua obra, numa tensão que ainda hoje se mantém; aquele, que acuado, acabou por suicidar-se em 27 de setembro de 1940 em Port Bou, cidade fronteiriça entre a Espanha e a França e um dia pretendeu “escovar a história a contrapelo”, cuja obra encontra-se na encruzilhada de várias correntes do pensamento moderno, do materialismo histórico ao neo-hegelianismo e ao misticismo judaico, escreve um livro e, curiosamente, o intitula, Rua de mão única .
Quando Rua de mão única (Einbahnstrasse) surgiu no cenário europeu em 1928, muitos críticos tiveram dificuldade em classificá-lo, outros prefeririam o silêncio e se calaram. Anos depois, o crítico Fritz Raddatz, em 1973, em polêmico artigo, escreveu que “a rua de mão única de Benjamin, afinal, era um beco sem saída.” Ernst Bloch, na época da publicação da obra, “foi um dos poucos a comentar o livro, comparou-o a um espetáculo de cabaré, caracterizou-o como um ‘caleidoscópio’ que unia fragmentos de temas novos, emergentes, com estilhaços de significações antigas, sobreviventes e concluiu que Benjamin corporificava ‘o pensamento surrealista’.”
Publicado quatro anos depois de Breton ter lançado o Manifesto Surrealista, dois após Aragon ter escrito O camponês de Paris – obra que provocou, por sinal, um grande impacto em Benjamin –, no mesmo ano em que Nadja é lançado na França e que antecede o ano em que Freud escreve O mal-estar na civilização, Rua de mão única constitui-se como uma obra exemplar para dizer de um texto construído sob a égide do fragmento; da montagem, tomada de empréstimo da fotografia, do cinema e do teatro; do surrealismo; da colagem, na qual se interpõem textos de anúncios, placas, outdoors, que atravessam a cidade e a escrita: afinal, “são os homens que habitam a cidade ou é a cidade que mora neles?”
Composta por fragmentos intitulados “Porcelanas da China”, “Cabeleireiro para damas difíceis”, “Volte para casa! Tudo perdoado!”, “Posto de gasolina”, “A caminho do planetário”, “Vestiário de máscaras”, “Artigos de escritório”, entre outros, Rua de mão única, “é uma grande miscelânea, reúne considerações políticas e filosóficas, idéias estéticas e literárias, notas de viagem, reflexões sobre o amor, notas sobre o comportamento das crianças quando lêem, brincam e se escondem, especulações sobre pressentimentos e premonições, relatos de sonhos e até comentários sobre selos postais e seus colecionadores.”
O que salta mais aos olhos numa primeira leitura de Rua de mão única, provoca surpresa e, ao mesmo tempo, um certo estranhamento são os curiosos títulos dados aos fragmentos, títulos, que, como na técnica surrealista da pintura, podemos encontrar em muitos quadros de Magritte e não batem à primeira vista com o que é mostrado na tela – só para lembrarmos dos quadros intitulados “Isso não é um cachimbo” e “Isso não é uma maçã” nos quais os espectadores colocam-se diante de pinturas que retratam um cachimbo e uma maçã – mas, num segundo momento, ao associarem livremente texto e imagem, produzem sentidos que podem ou não estar contidos nas legendas dos quadros. Deslocar o olhar e o objeto de seu lugar tradicional, não é esta uma das tarefas a que os surrealistas se propuseram? “Percepção é ler” , disse certa vez Benjamin.
Em certos fragmentos que trazem títulos como “Proibido colar cartazes”, “Fechado para reforma”, “Estas áreas são para alugar”, “Atenção: degraus!”, temos, além da apropriação e da colagem do texto publicitário ao literário, a própria cidade, que se apresenta como pergaminho para a escrita e se dá a ler como um grande hipertexto. “Eu sou um sistemático fragmentário” , ironizou Schlegel. Adorno foi o primeiro a destacar a relação de Benjamin com o pensamento de Schlegel, para quem o fragmento é uma forma filosófica: “o fragmento (...) como projeto e semente é marcado, portanto, pela sua abertura, e logo, crítica da noção clássica de sistema que estava vinculada a uma outra concepção da linguagem e da verdade.” O fragmento como uma “reflexão alegórica moderna” manifesta, portanto, uma abertura que a historiografia tradicional recusa, nesse sentido, a etimologia do vocábulo alegoria, allo, outro, agorein, dizer, “dizer o outro” é elucidativa bem como a concepção do “fragmento como semente”, na qual algo extremamente concentrado mantém sua força e germina, semelhante à mônada leibniziana.
Afinal, o que é o fragmento? Cada um dos pedaços de uma coisa partida ou quebrada. Parte do que resta de uma obra literária ou antiga, ou de qualquer preciosidade, esses são alguns dos vários significados que o dicionário traz. E o fragmento para Benjamin? Um poderoso instrumento que coloca em xeque a narrativa contínua, rompe com a estética clássica e, por meio de saltos e recortes inovadores, estilhaça a cronologia e o espaço linear. Para o autor de “Pequena história da fotografia” e de “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”, uma forma rápida e veloz, que, como o clique e o flash instantâneos da câmera, fabrica e produz imagens. Imagens de escrita, ressaltemos.
“Método deste trabalho. Montagem literária. Eu não tenho nada a dizer. Apenas a mostrar. Eu não vou furtar nada de valioso ou apropriar-me de formulações espirituosas. Mas sim os trapos, o lixo: não os inventariar, mas antes, fazer-lhes justiça do único modo possível: utilizando-os” , assinala Benjamin em “Trabalho das passagens”. Assim, é à luz desta citação ou melhor desta “mostração”– já que se pretende mais do que contar, mostrar – que leremos Rua de mão única, que se constrói sob a batuta do fragmento, alicerça-se sob o cavalete da montagem e apresenta não os grandes feitos da história e as cenas memoráveis, mas, ao revés, seus trapos, lixos e dejetos: “a colagem feita de detritos de coisas efêmeras, de utensílios banais com as bordas gastas é um espelho para os tempos.” Sabemos que, já em 1924, Benjamin utilizaria a técnica da montagem e da colagem na redação de seus ensaios: “é estranho que nem Kristeva, Baktine ou Derrida, por exemplo, citem a Benjamin, que os precedeu em tantos pontos, geralmente ignorados entre nós e atribuídos exclusivamente àqueles.” Willi Bolle assinala:
Propositadamente, a Einbahnstrasse é uma leitura da superfície da cidade. Leitura superficial no sentido topológico: dos textos triviais diante dos olhos de todo mundo, os textos que o cidadão lê distraidamente no dia a dia, manchetes de jornal, anúncios, out-doors, cartazes e também a poluição visual, o lixo das letras. Leitura da cidade como um livro ou um jornal ou um panfleto, leitura de uma floresta cujas folhas são ‘literatura’.
A imagem da cidade, tomada ora como livro, ora como floresta ou passeio pelos bosques da ficção, para lembrar um pouco Umberto Eco , remete-nos ao vagar e ao divagar que a leitura ou deambulações pelo espaço urbano muitas vezes requer, uma “atenção distraída”, na qual a dispersão não é ruim, mas, ao revés, merece crédito. Benjamin assinala :
Saber orientar-se numa cidade não significa muito. No entanto, perder-se numa cidade, como alguém se perde numa floresta, requer instrução. Nesse caso, o nome das ruas deve soar para aquele que se perde como o estalar do graveto seco ao ser pisado, e as vielas do centro da cidade devem refletir as horas do dia tão nitidamente quanto um desfiladeiro. Essa arte aprendi tardiamente; ela tornou real o sonho cujos labirintos nos mata-borrões de meus cadernos foram os primeiros vestígios.
No “ensaio-montagem”, a cidade torna-se o mais onírico de todos os objetos – “o escrito é uma cidade para a qual as palavras representam milhares de portões” assinala Benjamin – passível, portanto, de leitura, de interpretação, tanto daquilo que se vê em largas avenidas e boulevares como do que se esconde em becos e vielas inacessíveis, ou ainda, do que é invisível, para lembrar Calvino. Recorremos a Benjamin: “No centro desse mundo de coisas está o mais onírico dos seus objetos, a própria cidade de Paris. Mas somente a revolta desvenda inteiramente o seu rosto surrealista (ruas desertas, em que a decisão é ditada por apitos e tiros). E nenhum rosto é tão surrealista quanto o rosto verdadeiro de uma cidade.”
O sujeito que vaga, flana e circula pelas ruas da cidade parisiense e se põe a descrever a praça central e o obelisco, relata que nenhum dos habitantes que por lá passa é capaz de ler ou decifrar a inscrição e, no entanto, é o obelisco que rege o trânsito frenético da metrópole. Para além da ilegibilidade cifrada no obelisco que a ninguém é dado ler, a metrópole não se configura apenas como um objeto passivo, do olhar, mas torna-se “um medium de reflexão” e, especialmente, o lugar onde a história acontece e as transformações ocorrem.
Acerca do flâneur, Benjamin aponta: “Muros são a escrivaninha na qual ele apoia o seu caderno de notas.” O flâneur aproxima-se, portanto, da figura do alegorista, que além de perder-se nas ruas, faz sua leitura e a relata “ao encostar o seu bloco de notas nas margens da cidade.” No borrão da memória, uma lembrança imprecisa, uma neblina de imagens, na qual a cidade, como o livro, é passível de leitura – “ler o livro do mundo” – e de legibilidade: “mas não é apenas na forma de relacionamento com a cidade que esta se torna um livro. A cidade também é lida na medida em que ela mesma está repleta de letras, de letreiros, placas e anúncios que a transformam num universo literário.”
Além de configurar-se como um hipertexto repleto de informações e imagens, a cidade é entrecortada de imagens líricas que atravessam as ruas, os sinais e as praças. Talvez só mesmo um olhar ou, quem sabe, um ouvido distraído é capaz de capturá-las. No fragmento “Si parla italiano” , encontramos:
Eu estava sentado, à noite, com dores violentas, em um banco. De fronte a mim, em um segundo banco, tomaram lugar duas moças. Pareciam querer falar-se confidencialmente e começaram a sussurrar. Ninguém além de mim estava nas proximidades, e eu não teria entendido o italiano delas, por mais alto que fosse. Então, diante daquele imotivado sussurro em uma língua inacessível para mim, não pude defender-me da sensação de que se colocava em volta do local dolorido uma fresca atadura.
Entretanto, talvez nenhum outro fragmento como o intitulado “Quinquilharias” ilustre de forma exemplar a proposta de Rua de mão única, o livro que, num primeiro momento, silenciou os críticos. O que são, afinal, quinquilharias? São brinquedos de criança, jóias de fantasia, miudezas, ou ainda, objetos de pouco, nenhum valor ou utilidade, bugigangas ou ninharias. Já encontramos aí a síntese do “método” benjaminiano, método como desvio (Umweg), no qual o gosto pela miudeza, pelo menor, pela miniatura servirá de instrumental para levar adiante seus projetos – para quem um dia teve um sonho nunca realizado de colocar cem linhas numa folha de papel de carta e extasiado levou Scholem “para uma exposição de objetos rituais judaicos no Museu de Cluny para mostrar-lhe ‘dois grãos de trigo em que um espírito semelhante inscrevera todo o Shema Israel’” . Ana Maria Portugal aponta:
Haroldo de Campos acentua que o miniatural, o monadológico são “operadores” extremamente fecundos para o pensamento de Benjamin, assim como o estilo aforísitco, a expressão gnômica e a técnica do mosaico “a idéia é a mônada – isto significa: cada idéia contém a imagem do mundo.” Seu escopo representativo é desenhar, de maneira abreviada, essa imagem do mundo. (...) Como o Aleph borgiano que permite descortinar o universo pelo olho de uma agulha.
“Benjamin poderia ter invertido o ditado popular ‘Quem viaja tem muito que contar’ para ‘Quem conta tem que ter viajado’, pois o interesse pela narrativa parece residir no fato de o narrador ser alguém trazendo coisas de tempos e países distantes” , assim, aquele que viaja, “experenciou” outras línguas, países e culturas e tem, a princípio, algo a dizer, aproximando-se da figura do marinheiro comerciante, que de porto em porto coleta suas histórias, embora saibamos, como advertiu Benjamin, que mesmo aquele que nunca saiu de sua terra natal, como o camponês sedentário, também tem algo a contar, tal como desenvolve em seu ensaio “O narrador” . Lembramos que o vocábulo Erfahrung significa o conhecimento que advém de uma experiência que se acumula e se desdobra, e fahren, em alemão, significa viajar .
Conhecer e viajar andam de mãos dadas e suscitam recordações, sonhos e relatos. No fragmento “Lembranças de viagens”, encontramos impressões e comentários do narrador acerca da Catedral São Basílio de Moscou, Museu Nacional de Nápoles, Batistério de Florença, Alcazar de Sevilha, entre outros, nos quais são destiladas críticas ao gosto burguês, aos regimes políticos adotados pelos países ao longo de sua história, à arquitetura de igrejas, castelos e museus e ao “caráter de monumento” de determinadas construções, que, ao mesmo tempo, em que são erigidas, no sentido mesmo de se edificar algo monumental, cristalizam e fossilizam a história. Sobre “Catedral de Marselha”, lemos: “aqui tudo é morto, embora ao sul, a seus pés, La Joliette, o porto, e ao norte um quarteirão proletário estejam contíguos.”
Vejamos o “Castelo de Heidelberg” :
Ruínas, cujos destroços ressaltam contra o céu, aparecem às vezes duplamente belas em dias claros, quando o olhar encontra em suas janelas ou à cabaceira: as nuvens que passam. A destruição fortalece, pelo espetáculo perecível que abre no céu, a eternidade desses destroços.
Assim, por meio das ruínas do Castelo de Heidelberg podemos talhar o rosto ambivalente da memória e da história, que não fenece sob o que restou, mas se presentifica na perenidade dos destroços. E o índice para o qual as ruínas apontam remete-nos para a escrita da história, para uma historio-grafia, que se pretende sacudida sob a poeira dos escombros.
“Citações em meu trabalho são como salteadores no caminho, que irrompem e roubam ao passeante a convicção” , encontramos no fragmento intitulado “Quinquilharias”. Roubar a convicção daquele que passa e, como um ladrão, provocar o susto, a surpresa, quem sabe, a revolta, a contestação, a crítica, a ironia e tudo o mais que possa, enfim, ler a história em seu avesso, ou ainda, escrevê-la ao reverso: “em Rua de mão única Benjamin propõe um novo uso para as citações em vez de se servir delas, academicamente, para demonstrar erudição, ele aproveita o prestígio que elas adquiriram para surpreender seu eventual leitor, sacudindo-o do torpor em que o colocaram os hábitos mentais cultivados pela ideologia conservadora dominante nas nossas sociedades.” Escrever história é citá-la” , provoca Benjamin.
Tomar a citação, portanto, não como um mero instrumento de reprodução ou de resgate de autores e, muito menos, tentativa de instaurar uma hierarquia, ponto de apoio ou influência, implica encará-la, sobretudo, como “princípio” que provoca o inesperado, a surpresa, o espanto, enfim. Georg Otte assinala :
Há uma certa ambigüidade no uso do próprio verbo ‘citar’, uma vez que ‘citar’ um texto não significa citá-lo em sua integridade, mas apenas um fragmento dele. Por outro lado, a citação não se limita à repetição literal de algum fragmento, mas ‘chama’ via metonímia todo o texto de origem do qual foi extraído. Citar determinado texto é, na verdade, evocá-lo através de um determinado fragmento, a citação é um ‘vestígio’ que leva o leitor ao texto integral.(...) O processo de citação acaba complementando o texto através de um fragmento alheio a ele, mostrando que, de certa maneira, alguma coisa do texto já foi dita em outro lugar e em outra época. Numa espécie de déjà vu, o novo texto se ‘apropria’ da citação assim como o presente do historiador se apropria de um fragmento do passado, sendo que esta apropriação não parte de um ato voluntário do autor do texto. A síntese inesperada entre o fragmento citado e o texto presente é um indício para o fato de este último não ser inteiramente novo, assim como o texto citado não ser ‘coisa do passado’. Através da citação, o texto do passado dá provas da sua presença permanente, que não é o resultado de algum esforço de memória; o fragmento citado é a materialização de um parentesco subliminar, um vestígio, que sempre existiu e preexistiu ao autor do texto. Este autor, numa postura semelhante à do historiador, espera o acaso da citação., o déjà vu, para relacionar o texto presente com um texto anterior.
Assim, resta-nos encontrar com “o acaso da citação”, o vestígio de um traço ou letra ou aguardar a chegada de “Spes”, a alada Esperança, que “sentada e desvalida ergue os braços em direção a um fruto que lhe permance inalcançável” , ou topar de chofre com a “linguagem da caveira” na qual a “total ausência de expressão – o negro de suas órbitas oculares – unida a expressão mais selvagem” exibe “as arcadas dentárias arreganhadas.” Irônica, lúcida e paradoxal imagem que “sorri na morte que ela é” , nos olhos vazados, nos buracos negros de seu rosto decomposto. De que morte se trata, afinal? Da obra literária? Do autor? De todos nós diante da inevitável condição humana? Ou ainda, como a “bela figura à qual, em transporte, foram quebrados todos os membros, e que agora nada mais oferece a não ser o bloco precioso” a partir do qual temos que “esculpir a imagem do futuro.” Ou ainda, resta-nos caminhar com Drummond, de branco pela rua cinzenta e dizer: “Em vão me tento explicar, os muros são surdos, / sob a pele das palavras há cifras e códigos. / O sol consola os doentes e não os renova./ As coisas. Que tristes são as coisas consideradas sem ênfase.” Ou, quem sabe, possamos ainda inverter o verso: as coisas. Que alegres são as coisas consideradas com ênfase, que, na “epopéia do detalhe” , do cotidiano, do banal, do resto, do que não serve para nada, detrito ou lixo, talham a história constitutiva do sujeito que passeia pela rua de uma mão só.
Referências bibliográficas
ADORNO, Theodor W. Posição do narrador no romance contemporâneo. Trad. Modesto Carone. In: Textos escolhidos/ Walter Benjamin, Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Jürgen Habermas. Trad. José Lino Grünnewald et alii. 2.ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p. 269-273. (Coleção Os pensadores)
ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992.
ARAGON, Louis. O camponês de Paris. Trad. Flávia Nascimento. Rio de Janeiro: Imago Ed., 1996.
ARENDT, Hannah. Walter Benjamin: 1892-1940. In: ___. Homens em tempos sombrios. Trad. Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
BENJAMIN, Walter. Haxixe. Trad. Flávio de Menezes e Carlos Nelson Coutinho. 2.ed. São Paulo: Brasiliense, 1984.
_________. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura.. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. (Obras escolhidas, v. 1.)
_________. Rua de mão única. Trad. Rubens Rodrigues Torres Filho e José Carlos Martins Barbosa. São Paulo: Brasiliense, 1987. (Obras escolhidas, v. 2.)
_________. Correspondência – Walter Benjamin e Gershom Scholem. Trad. Neusa Soliz. São Paulo: Perspectiva,1993. (Coleção Debates)
BOLLE, Willi. A metrópole como medium-de- reflexão. In: Leituras de Walter Benjamin. SELLIGMANN-SILVA, Márcio (org). São Paulo: FAPESP; Annablume, 1999. p. 89-109.
BRETON, André. Nadja. Trad. Ivo Barroso. Rio de Janeiro: Imago Ed., 1999. (Coleção Lazuli)
BUCK-MORSS, Susan. Dialética do olhar: Walter Benjamin e o projeto das passagens. Trad. Ana Luiza Andrade; revisão técnica de David Lopes da Silva. Belo Horizonte: Editora UFMG; Chapecó/SC, Editora da Universidade de Argos, 2002.
ECO, Umberto. Seis passeios pelos bosques da ficção. Trad. Hildegard Feist. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 15. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, [s.d.].
FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos.1900. Trad. Walderedo Ismael de Oliveira. O futuro de uma ilusão. (1927-1931). O mal-estar na civilização. (1930[1929]). Trad. José Octávio de Aguiar Abreu. Luto e melancolia. (1917 [1915]). Trad. Themira de Oliveira Brito et alii. In: __. Edição eletrônica brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud – versão 2.0. Rio de Janeiro: Imago, [s.d.] v. IV e V, v. XXI e v. XIV.
GABLIK, Suzi. Magritte. New York: Thames and Hudson, 1985.
GAGNEBIN, Jeanne-Marie. Walter Benjamin – os cacos da história. São Paulo: Brasiliense, 1982.
__________. História e narração em Walter Benjamin. São Paulo: Perspectiva, FAPESP: Campinas, SP, Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1994. (Coleção Estudos)
__________. Sete aulas sobre linguagem, memória e história. Rio de Janeiro: Imago Ed., 1997.
HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
KLOSSOWSKI, Pierre. Sade meu próximo – precedido de o filósofo celerado. Trad. Armando Ribeiro. São Paulo: Brasiliense, 1985.
KONDER, Leandro. Walter Benjamin – o marxismo da melancolia. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999.
KOTHE, Flávio. Para ler Benjamin. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976.
MERQUIOR, José Guilherme Merquior. Walter Benjamin. In: ___. Arte e sociedade em Marcuse, Adorno e Benjamin – ensaio crítico sobre a escola neohegeliana de Frankfurt. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969. p. 99-146.
OTTE, Georg. Linha, choque e mônada – tempo e espaço na obra tardia de Walter Benjamin. In: Teses 1994. BARROS, José Américo de Miranda (org.) Belo Horizonte: Programa de pós-graduação em Letras da Faculdade de Letras da UFMG, 1995. p. 65-77.
_____. O narrador sem aura ou pensando a reprodutibilidade oral em Benjamin. In: Revista de estudos de literatura. Belo Horizonte: Centro de Estudos Literários da Faculdade de Letras da UFMG, Curso de Pós-Graduação em Letras, v. 2, out.1994. p. 123-135.
_____. Rememoração e citação em Walter Benjamin. In: Revista de estudos de literatura. Belo Horizonte: Centro de Estudos literários da Faculdade de Letras da UFMG, Curso de Pós-Graduação em Letras da UFMG, v.4, out. 1996. p. 211-223.
PAQUET, Marcel. René Magritte. 1898-1967 – Thought rendered visible. Köln: Benedikt Taschen, 1994.
REVISTA USP: DOSSIÊ WALTER BENJAMIN. São Paulo: USP, n. 15, set. out. nov. 1992.
ROUANET, Sérgio Paulo. As passagens de Paris, II. In: Passagens da modernidade. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, p. 13-39.
_________. Édipo e o anjo: itinerários freudianos em Walter Benjamin. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro: 1981.
SALIBA, Ana Maria Portugal Maia. O vidro da palavra: o estranho como objeto-limite entre a literatura e a psicanálise. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2003.
SCHOLEM, Gershom. Walter Benjamin. In: __. O golem, Benjamin, Buber e outros justos: Judaica I. Trad. Ruth Joanna Solon. São Paulo: Perspectiva, 1994. p. 181-211.(Coleção Debates)
SELIGMANN-SILVA, Márcio. Ler o livro do mundo: Walter Benjamin – romantismo e crítica poética. São Paulo: FAPESP/ Iluminuras,1999.
___________________ (org.). Leituras de Walter Benjamin, São Paulo: FAPESP; Annablume, 1999.
SONTAG, Susan. Sob o signo de saturno. In: ___. Sob o signo de saturno. Trad. Ana Maria Capovilla e Albino Poli Jr. Porto Alegre: L&PM, 1986. p. 85-103.
________. Ensaios sobre a fotografia. 2. ed. Trad. Joaquim Paiva. Rio de Janeiro: Arbor, 1981.
SOUSA, Edson Luiz André. Os olhos da memória. In: Revista psicologia clínica. Rio de Janeiro: PUC, v. 14, n.1, 2001.
STEINER, Georges. A viagem crepuscular de Walter Benjamin. Trad. Luiz Roberto Mendes Gonçalves. Folha de São Paulo, São Paulo, 4 de fevereiro de 2001, Mais! p. 5-9.
TELES, Gilberto Mendonça. O surrealismo. Manifesto do surrealismo. In: __. Vanguarda européia e modernismo brasileiro. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 1986. p.170-208.
NOTAS
|