JOYCE MANSOUR
JOYCE MANSOUR
Reçois mes prières.
Avale mes pensées polluées.
Purifie-moi: que mes yeux s'ouvrent
Qu'ils voient le sourire intérieur des assassins.
Et une fois pure
Judas crucifie-moi.
Receba minhas preces.
Engula meus pensamentos poluídos.
Purifique-me: que meus olhos se abram
Vejam o sorriso interior dos assassinos.
E uma vez pura
Judas crucifique-me.
De Cris (1953)
C'était hier.
Le premier poète urinait son amour
Son sexe en deuil chantait bruyamment
Les chansons gutturales
Des montagnes
Le premier dieu debout sur son halo
Annonçait sa venue sur la terre évanouie
C'était demain.
Mais les hommes à tête de chat
Mangeaient leurs yeux brouillés
Sans remarquer leurs églises qui brûlaient
Sans sauver leur âme qui fuyait
Sans saluer leurs dieux qui mouraient
C'était la guerre.
Era ontem.
O primeiro poeta urinava seu amor
Seu sexo em luto cantava ruidosamente
As canções guturais
Das montanhas
O primeiro deus ereto sobre seu halo
Anunciava sua vinda sobre a terra esvaída
Era amanhã.
Mas os homens com cabeça de gato
Comiam seus olhos embaraçados
Sem notar suas igrejas que queimavam
Sem salvar suas almas que fugiam
Sem saudar seus deuses que morriam
Era a guerra.
De Dechirures (1955)
CHANT ARABE
L'œil bascule dans la nuit au moment du trépas
O la blanche fulgurante folie des ailes qu'on ne
connaît pas
Ouatées de silence elles frôlent le bras sur l'oreiller
Et ouvrent l'cil rond à la nuit de l'impalpable
Le froid tisseur de tubéreuses trépigne sur ma pupille
Je vois glisser la tenture mobile de l'horizon qui
rutile et qui s'agite
Telle une peau frémissante sur un corps qui se dérobe
La houle feutrée de mon abdomen se fige de peur
démente
J'éternue mais je ne bouge pas
Et l'oeil qui cloître mes rêves qui nage et qui clignote
L'œil envahit mes nuits
La nuit la nuit l'orage
L'œil éblouissant aux floraisons étranges
L'œil malade d'images
CANTO ÁRABE
O olho balança na noite na hora do passamento
Ó a branca fulgurante loucura das asas que ninguém
conhece
Guarnecidas de silêncio elas roçam o braço sobre o travesseiro
E abrem o olho redondo à noite do impalpável
O frio tecelão de tuberosas tripudia sobre a minha pupila
Vejo deslizar o forro móvel do horizonte que
rutila e se agita
Como uma pele arrepiante sobre um corpo que se esquiva
O marulho feltrado do meu abdômen se congela de medo
demente
Espirro mas não me mexo
E o olho que encerra meus sonhos que nada e pisca
O olho invade as minhas noites
A noite a noite a tempestade
O olho ofuscante de florações estranhas
O olho doente de imagens
De Rapaces (1960)
L’APPEL AMER D’UN SANGLOT
Venez femmes aux seins fébriles
Ecouter en silence le cri de la vipère
Et sonder avec moi le bas brouillard roux
Qui enfle soudain la voix de l'ami
La rivière est fraîche atltour de son corps
Sa chemise flotte blanche comme la fin d'un discours
Dans l'air substantiel avare de coquillages
Inclinez-vous filles intempestives
Abandonnez vos pensées à capuchon
Vos sottes mouillures vos bottines rapides
Un remous s'est produit dans la végétation
Et l'homme s'est noyé dans la liqueur
O APELO AMARGO DE UM SOLUÇO
Venham mulheres de seios febris
Escutar em silêncio o grito da víbora
E sondar comigo o baixo nevoeiro ruivo
Que infla de súbito a voz do amigo
O rio é fresco em torno do corpo dele
Sua camisa flutua branca como o fim de um discurso
No ar substancial avaro de conchas
Inclinem-se moças intempestivas
Abandonem seus pensamentos de chapeuzinho
Suas imbecis molhadelas suas botas rápidas
Um redemoinho se produziu na vegetação
E o homem se afogou no licor
De Carrè Blanc (1965)
Brûler de l'encens dans la quiétude d’une chambre
Loin derrière les récifs d'une journée climatique
Suivre de longues queues de noir vêtues
Dans les cimetières où dorment les années révolues
Pleurer des morts qui fleurissent comme jambons
de Parme
Creuser des rides dans les champs
Crever l'oeil stagnant de la nuit
Embrasser le pied d'un pape alpiniste
Ou laper l'huile qui suinte des idoles endolories
Par trop de caresses
Tout cela me fatigue
M'exaspère
Rien ne vaut une bonne dose de rage
Pour partir
Car le pied crée le chemin use le roc
Et renverse le totem qui titube
Dans la peur tropicale des églises
Il faut noyer le coq à sa naissance
Empêcher les aveugles de mener le train
Les prairies de la mort papillonnasses de papiers gras
Bordent nos songes de leurs hauts cris
Raison de plus pour en rire
Queimar incenso na quietude de um quarto
Longe atrás dos recifes de uma jornada climática
Seguir longas caudas de negro vestidas
Nos cemitérios onde dormem os anos passados
Chorar mortos que florescem como presuntos
de Parma
Cavar sulcos rugosos nos campos
Furar o olho estagnante da noite
Beijar o pé de um papa alpinista
Ou lamber o óleo que escorre dos ídolos doloridos
Com excesso de carícias
Tudo isso me fatiga
Me exaspera
Nada vale uma boa dose de raiva
Para partir
Pois o pé cria o caminho desgasta a rocha
E derruba o totem que titubeia
No medo tropical das igrejas
É preciso afogar o galo em seu nascimento
Impedir os cegos de conduzir o trem
As pradarias da morte borboleteantes de papéis grassos
Margeiam nossos sonhos com seus altos gritos
Razão a mais para rir
De Flammes immobiles (1985)
BLEU COMME LE DÉSERT
Heureux les solitaires
Ceux qui sèment le ciel dans le sable avide
ceux qui cherchent le vivant sous les jupes du vent
Ceux qui courent haletants après un rêve évaporé
Car ils sont le sel de la terre
Heureuses les vigies sur l'océan du désert
Celles qui poursuivent le fennec au-delà du mirage
Le soleil ailé perd ses plumes à l'horizon
L'éternel été rit de la tombe humide
Et si un grand cri résonne dans les rocs alités
Personne ne l'entend personne
Le désert hurle toujours sous un ciel impavide
L'œil fixe plane seul
Comme l'aigle au point du jour
La mort avale la rosée
Le serpent étouffe le rat
Le nomade sous sa tente écoute crisser le temps
Sur le gravier de l'insomnie
Tout est là en attente d'un mot déjà énoncé
Ailleurs
AZUL COMO O DESERTO
Felizes os solitários
Os que semeiam o céu na areia ávida
Os que buscam tudo elemento vivo sob as saias as saias do vento
Os que correm ofegantes depois de um sonho evaporado
Pois são o sal da terra
Felizes as vigias sobre o oceano do deserto
As que perseguem o feneco muito além da miragem
O sol alado perde suas plumas no horizonte
O eterno estio ri da tumba úmida
E se um grande grito ressoa nas rochas acamadas
Ninguém o ouve ninguém
O deserto uiva sempre sob um céu impávido
O olho fixo plaina só
Como a águia no despontar do dia
A morte engole o orvalho
A serpente sufoca o rato
O nômade sob sua tenda escuta o tempo ranger
Sobre o cascalho da insônia
Tudo está lá na espera de uma palavra já enunciada
Alhures
De Posthumes et divers (1991)
Tradução: Éclair Antonio Almeida Filho
*
Joyce Mansour (1928 -1986), pseudônimo de Joyce Patricia Adès, nasceu em Bowden (Inglaterra), filha de pais de origem judaica. Viveu parte de sua vida no Egito, onde se casou. Mudou-se para a França em 1953, onde publicou seu primeiro livro, Cris (Gritos). Ficou conhecida como poeta surrealista, tendo colaborado inclusive com a revista brasileira Phala (1967), dirigida por Sérgio Lima. A autora publicou 16 livros de poesia, além de títulos em prosa e peças teatrais. |