ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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BRUNO MIGUEL RESENDE

 

 

 

 

rasura tectónica

 

mia-me aos genes

durante a hélice do trovejante

sussurrada na alvura do osso

mineralizado

 

sibila-me nas escarpas

do epicarpo nervoso

os ódios que te têm

pelo fluido incerto

do seio primordial

 

mortifica-me com as veias

que não me pulsam

 

afia-me os bigodes do sono

e a cauda da morte

 

mutila-me a vagina

que me respira

debaixo do braço

 

implode-me dentro do teu ventre

 

 

da noite em que o amor se eternizou

 

rasguei os teus nomes na areia

com ejaculação sanguínea

dos grãos

 

as cicatrizes das formas marulhadas

eram rosto do bramido

agrilhoado

 

verti temporizadores de inversão

e

a maresia que encolhia

no fetal

implodia-se com vagas de negrume

 

lacrimejaram lunares no tórrido

congelado desértico

correntes do inaudível

com dispêndio dos ausentes

e

escorreram-se de salinas

da viagem que sana

o purificado

vazio

 

fiz-me inerte com esquecidos

colapsada memória

no espúmeo

que se reflecte

 

perdi-te as formas

no irreversível

mas

do cadáver de eterno retorno

não se decompõe

 

arrastei-te ao cume

da fenda do abismo

e

laminei os estrelados

marquei-te as seivas

nos rochedos

 

porque pingavam ao celeste

inverti o espelho inverso

da ampulheta do amor

 

arranquei olhos

com ferros que enferrujam

 

furei tímpanos

com unhas lascadas de carne

 

empalei narinas

com almofadas de derrames orgásticos

 

crivei lábios

com cordas que suspendem astros

 

decepei membros

com brisas dos amantes de amanhã

 

e no tumular sem flores

me enterrei contigo

 

 

anjeofagia

 

penas que não sabem voar

quedam

em procissão ao almofadado

núveo tingido ao sangue

com aperitivo da degola

 

a cabidela de anjos virgens

ascende felinos aos telhados

ronronam orgasmos gástricos

cânticos báquicos do manjar

 

sexualidades angélicas pavoneiam

na ponta do garfo

porque as coxas se apalpam

no dente

lascados nacos do apetite

salivam aguaceiros

porque as harpas se tocam

de faca afiada

 

fatiam-se nádegas na garra

estalam sem palmada

crepitam na ignição

da miada churrasqueira

eterna giratória de espetos

e

as penas descansam na almofada

 

eu

que já sei miar

ensalivo salivas

por ti

meu querido anjo

 


dança dos ossos

 

descarnam-se os corpos
ao súbito
por iras dos vendavais dançantes
expurgados esqueletos
brunidos à lágrima lunar

 

destarte
níveo folclore viandante
que se cria
e
do fusco iníquo
em servil matéria esfolada
flamejada
por dança dos ossos

 

aprisionados na orla
do burlesco
em frescos excipientes
áditos nas praias consagradas

 

plumas floresciam
ao circundo
como leito vital
do cêntrico

 

papiros ressuscitavam
por colorização amena
da escuridade
em perfumes plumbagináceos
invocada minerva

 

lanças voltaram-se
e revoltaram-se
por íntimos dispersos
e
inscreveram cernes às areias
impelidas trindades oníricas

 

da poética
da erótica
da opiácea
elevadas ao cachimbo da harmonia

 

dualidades do espírito
às vértebras
em transe do género
marouços do fálico fértil
e
vaus do vaginal incutido

 

indómitas impressões vivas
de fluxos ao tutano
porque o vulgo padeceu
e
a crepitação do estorvo
é antes do agora

 

excedia-se a unidade
medida do ente
ao transbordo

 

sinfónico exuberante
por marejada tíbia
pastoril rumo
em articulados toques
ao desvario
por frequências indivisíveis
clamadas proliferações
de pluralidades retidas
derretidas no vivaz

 

porque as criaturas se recriam

 

 

 

do dia em que choveram falos

 

certo dia choveram falos
de agastadas nuvens da lascívia
e como antes nunca
variância à cor nos cardumes corais
por termodinâmicas o sobejo
dos tamanhos a divergência da alcateia
tenazes dentes do lobo

 

do ameno temporal da indolência
aniquiladas divinas protecções
porque em alpendres de cimentos crucificados
chaves trancam-se às fechaduras
dos laníferos nada mais
impenetrável tosquia às chuvas

 

uns gemiam
outros fugiam
se alguns se enclausuravam
quebra do vidro canonizado
sagrados casebres ao dia de não serem

 

uns lançavam-se às tumbas
tigres da devota secura
rumo aos horizontes paradisíacos
por continência eterna
no encerramento do sarcófago
intrusiva gota itifálica
ardente estampa da perdição
do vivo sepultado

 

das delícias a penetração na suplica
como inverso de identidades
colérico veludo ao rugido
em gemido da brutalidade sensual
e porque a indiferença jazia
ontem

 

por fátua ardente incredulidade
arrepio ao silêncio
rogada fogueira do orvalho
dos estranhos o clarão das pupilas
como inédito palpite ao inverosímil
longas sintonias ao ruidoso

 

desnudados adornos corporais
dos ventres
por pilhas em revestimentos
uma labareda do desejo
penetrada chuva ao nu

e porque preces chegavam
à inexistência dos deuses
os uivos
quando falecidos
os uivos
se ausentes de atenção
os uivos
credos na humidade transgressora

 

porque a castidade não se fez cinto
dissolvência temporal no desejo sanguinário
hímenes
rectos
gargantas
ao naufrágio na ébria luxúria

 

já nádegas queriam
chicotear o chicote

 

já pulsos queriam
algemar a algema

 

já dorsos queriam
arranhar a unha

 

já pernas queriam
amarrar a corda

 

e porque os fluídos enchiam horizontes
imaculada neve
ao pico da emergência
manto banhado à secura areal
interjeições para gorgolejo angélico
como precursão bramida do festim

 

 

maresia seminal

 

embarco espirais
por sussurros eriçados à sinapse
implosão nas vagas cheias de lua
e
escorrem-me das pupilas
salinas salpicadas de íris

mamilo pentagramas ao vórtice
com lascadas unhas gritantes
tegumentos arrastados ao sagaz
e
entrelaço-me na profundeza gemida

arritmia que me despiu
após nudez
e
o fálico manto estala-me nas nádegas

sorvo nervuras de paradoxo
em glândula de lençol
visceral locomotiva efusiva

entranho-me de serpenteados
sibilo a língua afogada
e
rasgo o gume seminal
em ávida penumbra arfada
cravados labiais ao esperma

voragem ao deglutido
por foco espasmódico do supresso
tumulto epidérmico

refractária génese tumular ao estridente
mas
balbucio o silêncio
e
a concha pinga-se em maresias

 

 

*

 

Bruno Miguel Resende nasceu em 1981, em Porto, Portugal, universo. publicou “subterfúgios” pela corpos editora,“khaos poeticum” e “descravidades” pela temas originais e “esquilia divinorum” pelas edições extrapolar. concebeu as galerias transmorphosys, psicólises, entre outras. fez dramturgia e interpretação dos “elogios da embriaguez” entre outros espectáculos e performances. é colaborador da revista infernus e fundador em conjunto com fátima vale dos spabilados – teatro hedonista.

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