CONCEIÇÃO
CRISTÓVÃO
IDADE DA
PEDRA
(há um discurso de facas nas fronteiras lívidas do rosto.
a madrugada morre de leucemia. e ainda as florestas
não revelam as crateras abertas.
línguas de fogo economizam tristezas. deslizam águas
na luz da pedra.
oh, vidas de pedra, náuseas de pedra. na dura frágil
idade da pedra.)
ANTES DA ORGIA
... cavo a terra forjo o ferro faço o pão.
quando quero, sempre quero!
mesmo quando os makixi sangram pelo sexo.
e nos seios mirrados eivados
trazem o quente sabor da bílis.
dos dias sem chuva...
DEPOIS DA MEIA-NOITE
...quando oiço olhos da noite tiritar
do frio das vozes surdas - nossas - a olhar
desperto assanhado. em chamas rituais de mahamba
... o sexo sangra e a aurora nasce sempre!...
ESPIRAL DA VIDA
as horas caminham em espiral
lúgubres com(o)vidas
em calafrios urdidos
vultos à espreita sonegam.
iminentes.
o mundo grita seu cancro
em mil silêncios. cortantes.
de vidro e agonia.
RESPIRAÇÃO DAS FOLHAS
sussurro a respiração das folhas
com ansiedade asmática.
colhendo litorais de mabangas
e espreitando o interior das jinguengas
numa manhã de orvalho.
há sempre olhos à espreita.
há sempre olhos à beira do tempo
plantados. quais outeiros de sons
e palavras medulares
cantando a respiração das folhas.
*
Conceição Luís Cristóvão nasceu em Malanje, Angola,
em 1962, onde iniciou seus estudos, que concluiu em Huambo.
Nos anos 80 fixou-se em Luanda, freqüentando a Brigada Jovem
de Literatura, da qual tornou-se secretário-geral. Formado
em Engenharia, é consultor e docente na Universidade
Agostinho Neto, atuando também na área política, como
deputado na Assembléia Nacional e assessor do
primeiro-ministro. É membro da União dos Escritores
Angolanos. Publicou, entre outros títulos de poesia, A
voz dos Passos Silenciosos, Amores elípticos e
Idade digital do verso.