ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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EMILIANA CRUZ

 

 

 


 

a água que se revolveu no fogo
num moinho de mãos

- ficou o som no silêncio perdido
da volúpia lexical

na releitura
do café entrelaçado.

engulo tectos esculpidos em manuscritos incipientes
no início do verbo

atrás o vácuo inevitável

* * *

reminis-
c(i)ências
das frontes
à aresta da ponta
mais flexível que a morte
tesoura se íris.

tesoura de íris que se abre pelas pontas redondas das arestas do umbigo
- fio reluzente à aragem da testa
:ferida a margem da unha

 

* * *


talvez remontar os paradigmas
nada mais que fios fictícios atados à memória
de ferro
num alinhavo horizontal

 

* * *


Para Diamantino

és a chama que se abre em
violeta
pelos olhos de maresia
em movimento
- a água
espalmada em catadupas
de dedos
enrolados em contas de carinho.  

são mãos
- contos de fogo

narrativas permeáveis
à volubilidade
dos sentidos

espraiados os poros
pelos sulcos dos troncos de
cheiro intenso a azul-sal

 

* * *


jogos a calcinar
cortinas de noites -
- árvores escorridas nos espaldartes
da cabeça
esquecida
a morte                                                ao lado
nos movimentos correntes

quando a expressão
é lida na língua
olho
o encontro
no vestígio dos corpos-
- calmantes

a poesia
as formas
inatingíveis
na mão
nas vias
geladas
as noites
tenras
cordas

e ainda a cor no nome formado pela morte

pregada
nos sei(x)os
de magma                                                        periféricos
à escolha das superfícies
re-ligadas
de perplexo prazer

ainda a cama amarrada ao tronco
no espaço - pernas - árvores
de bruma
espessa
a história
regressada.
curta                                                    a urgência -
- voz
pelas palavras (in)directas
em cachos
de crostas
- recordo
a água presa
na ânsia
do escape
- o cuspo mudo
mas fértil na linha das partidas metonímicas que
dança
vagarosa
no olhar             

cada noite - a mesa
abraçados os quartos, cheios de (a)manhã [1]
lábios de mármore que se expandem
                                                            pelo segredo
- o olhar do verbo
entrega-se à cama o lume
                                                            sozinho
atravessando a janela fechada
                                                            pelos anos
o verbo guarda o verbo [2] ama. os anos
- corredor entre rostos incendiados  

a janela-verbo como [3] centro. do mundo
                                                 do substantivo            impossível

cada noite - mármore substantivado
                  - substantivo marmorizado
pelo corredor envelhec-
                                                ido
                                                            à distância da perda [4]



[1] beleza
[2] luz
[3] violeta

[4] (ir)reversível

 

*


Emiliana Cruz, poeta portuguesa, nasceu em 1978. É professora de inglês e português. Publicou o livro de poesia Espaços (2002), colaborou na revista brasileira Sibila e nos sites http://www.interacesso.pt/non e http://www.ana-b.tripod.com/grid2.html. Traduziu poemas de Robert Creeley. E-mail: emilianasilva@portugalmail.com.

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