ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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FABÍOLA RAMON

 

 

 

 

CORPULAÇÃO (ESCRITURA DA CARNE)

 

 

Dentro de mim,

um, meio, desassossego sugado na areia que move e leva e traz.

 

Uivos-rouge abafados na carne

 

Penso alto, falo baixo.

Captadas as palavras perdidas na lixeira dos PCs; formam jogos, viram ouro.

 

Suspende corpo crepito; passos certos de uma dança sem intenção.

Esfrega dorso em seu oposto

Pêlo eriçado pelo desconhecido.

 

 Se hospeda na invasão.

Deixa-se ir inteira, para além do pêlo, para além da carne.  

Finca no azeite do bicho. 

 

Jogo de palavras; lanço uma, duas, três..... Formam frases inteiras, mas nada muda quando faladas. Escritas, portam-se com outra intenção (Atention!).

 

Metamorfoseiam-se de escamas reflexas. 

Cooptados, viram presas da imensidade

(mais que frêmito)

 

única união ultrapassa cadacorpo (à corps perdu), cada qual, soprando o instinto natural de cada coisa: razão da ex-sistência?

 

Levanto-me para ver o que não escrevo.

- O que não vejo?

Atrás do vão, trincas de destino numa vastidão,

Rabiscos tatuados para fazer tua noite.

 

(já não mais bichos; balbuciam palavras)

 

Agora, mais que o nada: um sopro.

 

 

* * *

 

 

NULOGRAFIA RESVA(E)LADA

 

Dedo avo lança o dado, medida,

som de palavra banida

dada à dor (da dor dada sê dom).

 

Cheia:

Lameada de virtualidade

Lotada de novas grafias

Loteada de velhos sentidos.

 

Murcha:

Se corromptela.

 

Vazia:

Sintaxe bandida,  

vadia da carne.

 

Se ludibriada pela embriaguez, liquida, na languidez fareja corpos já dissolvidos. Habita covas quentes e secreta murmúrios de fogo fátuo. Descreve vermes que não podem escutar lamentos, apenas deglutem; lançam fagulhas que incendeiam a folha branca.

 

Preenche de fogo as letras à espera do já sabido sentido. 

Cava espaços, buracos que tingem de nada o intervalo entre a conhecida letra e a que nunca se viu.

 

Então, “forma versos disformes”, “prepara rimas para”

Óbvia, se desfaz em prosa.....

 

Corre para um córrego. Escorre na página. Perfura idéias.

Já desconjugada, encontra um poeta.

Oferece-se quase inteira, quase equívoco, quase literal.

 

Recebe uma migalha para se deitar.

Solta, se estica no corpo do texto, transmuta-se em corpo de letra; se funde (s)em sentidos

C

A

I na página e encontra alguns destinos (fastígio do tempo)

 

Quando em fastio, se escora no canto.

Ensaia uma sí-la-ba, não sai.

Enseja outro som

E desmorona em um sonho:

         a

     g

a

                   l´

     alma.

 

 

 

OBJETOS DESARQUIVADOS

 

 

Caixa I - bibelôs

Besouros besuntados.

Na lâmina,

projetam cores.  

 

 

Caixa II – memórias

Palavras recortadas

em nome de um passado:

pequenos gorilas metafóricos

 

 

Caixa III- utensílios

Psica psica escuridão

Desliza negra

Prende punho

Furta fita

Enlaça dedo

 

 

Caixa IV – balalaica

Escapam sentidos

pelas paredes; grãos

Ritmo preciso

quebrado de razão

 

 

Caixa V segredos

Língua roça

Dente escárnio

Carmim explode

Vulva VÊ

 

 

Caixa VI – estojo de maquiagem

Captura virtual:

Cílios velozes

vagueiam entre

instantes

 

 

Caixa VII – cama 

Esmalto os dentes.

Lençóis ladram por entre pernas

que desabam

 

 

Caixa VIII – quintal

Fétidos pêlos

Seduzem inimigo

Estouram seiossutiã,

Soutiens de seda. 

 

 

Caixa IX – latrina

Explode letra

Jorra vermellho:

BA tom carmim

Car nê carmesim

 

 

Caixa X – cofre mortuário

Guarda corpo morto

Já foi meu: invenção.

 

 

 

*


Fabiola Ramon é psicanalista lacaniana, mestre em saúde mental, professora universitária, poeta e contista. Mora em São Paulo. Tem poemas publicados em sites e expostos em saraus literários. Participa do Laboratório de Criação Poética coordenado por Claudio Daniel (http://labcripoe.blogspot.com/). No momento, trabalha com "a erótica (escritura) do corpo" e pretende lançar um livro de poemas em torno desse tema.  E-mail: fabiramon@uol.com.br.

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