ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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JOÃO FOTI

 

 

 

 

Um oásis oco dorme o celofane das miragens...”

 

I.

Nuances do adeus,

outro: o sino-cegueira

naufraga e geme,

geme os cães, os gumes.

 

Minúsculo músculo,

és quem senão próximo?

Locus das coisas,

nenhures-morada,

das falhas marinhas

o cipreste-maçã, o mais

– luz caindo dos porquês.

 

Semas cegos, o nosso,

o torno, tua lágrima

sobre mim sob mim,

unicamente: os vãos vãos,

a escura cítrica forma.

 

Aprisionas o mais

na cripta-entre da razão,

fostes eu, aqui de tudo

que agora é mar: és mar.

Retecemos tua porcelana

amanhã, terias signo.

 

 

 

II.

Trazidos com caules de rosa,

nas mãos

– vertias o sangue,

espinho-à-espinho.

 

Exterioras: per-

doado aos limiares,

face-a-face,

enterrado por formigas.

 

*

 

Areia e noite, úmidas,

obra líquida

– inaudível.

 

Um antes, sobre ti

enterrada –

oscilas

teu espectro. 

 

Fora, um íntimo eu-outro

acolhias,

botões vazios,

rosa e sangue não havia.

 

*

 

Com tal, éramos

o primeiro vinho, como amigos,

estavas

no fantasma do vinho.

 

Digladiavas outro orbe,

dentro, tuas mãos,

caules e botões:

uns

manchados, não necessitas,

uma vez mais,

outra mancha:

eras

na escritura.

 

*

 

Mas o outono,

este de galhos iracundos,

este que enuncia,

este, sempre gasto, senhor das cinzas,

súbito adormeceu.

 

Nossos olhos pranteavam

ainda os mesmos

– e para as centenas de sépalas

sem o sol do mundo,

sem a terra e o meio-dia subterrâneo,

ano após ano, o abrir cinza

do outono

guardava-me noutro abril.

 

*

 

Uma opção, e mais que isto

o naufrágio,

enfim, ocre das sentenças:

de que traduz línguas unidas,

fenômeno mudo.

 

Tuas orquídeas, então, sorririam

outra vez,

voltas da vez.

 

Cegos como omoplatas

na seda negra,

nomeávamos:

outonopaco.

 

 

 

III.

Um calor do sombrio,

o ar adeja distâncias,

um aroma é a mulher

nua segurando a água.

 

ela guarda dentro

secreções do ouriço,

a cama de lazúli

sobre a pele celestial.

 

um oásis oco dorme

o celofane das miragens,

nós o mergulhamos

nossos dentes de luz.

 

a carícia da sombra

me reveste de oceano,

um caleidoscópio dervixe

interdiz ainda o é.

 

a cera de ensolar

um sol é um sol

nu no escuro ainda,

não se vê o sol.

 

 

*

 

João Foti é poeta e estudante de Letras na Universidade de Brasília. Publica no blog: Caderno da Mais Alta Torre.

*

 

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