LUÍS MAFFEI
ORDINATEUR
Estar perto da origem do vento é
em todo caso
ou
neste
ventilador sem som nem
cabelo a mover-se acima das
cabeças abaixo dos
telhados em direção a
flancos pontos
exclamativos: nalguns
lugares ou
¿que sei eu?
neste
nem sempre o vento é fio
ordinateur
nem sempre
mata.
Romba emboscada:
¿o que se come
sem
fruta nem boca?
22,03,09
um domingo se cumpre pois se cumprem
domingos
e passamo-los como fossem idosos corpos
a atravessar ao que dura
pouco
a segunda ou
o domingo com caras de sombra nos contornos dos
edifícios e nas esquinas que ainda
comem ainda
se erigem como domingo fosse
e se cumprem domingos a não ser que
se cumpram
– neste caso uma falta mais ou
menos frontal um pouco para o
lado direito de ataque e daí a
dentro
não
daí ao bate-
rebate na área grande
dos outros a sobra nos
pés do último avante, é
já noite e o sentido tem próprio
holofote –
e o domingo é domingo tanto que
atravessá-lo é um bando de dias
e começar agora gosta de dizer ao tempo
que
(por falar em descontos)
se cumpra
GONE WITH THE WIND
Ao amor não basta já
a metáfora do fogo
estando
o amor ardente
ao final de
doze de março de dois mil e nove
esquina de Matoso e
Satamini
pois
ali
faz curva o vento não
contorna nem com-
bure
o vento agita
entre poeira e folhas
retrato de um casal amante
levada imagem
caras tão de longe quanto as
caras que faziam se
se amavam
quando
diz o verso
o avesso
doze de setembro de dois mil e sete
em chama ardia a luz
grafada em fogo e
calendário
pronta a ser
esquina de Matoso e Satamini
sítio e metáfora
épico a coisa desvalida
entregue
ESTRIA
À rua onde me arrisca até meu vício
sento
e toma-me um café de expressa
cauda tal o vaivém das
coisas. Nem
doce, nem tão simples, a máquina que
escorre ao som do dia é circunstância de encontrar café
na rua e estou
sentado. Vem-me
açúcar
nuns papéis à mão do homem
o operário
e o rasgo que produzo pode
algo ao dar-me mais que o
fabricante. Nada de
forma, tipo, origem ou
caloria, apenas
um sentido que advém do nome
próprio, tão banal como o
costume: União.
União é um troço apenas
e de açúcar e café já não me importo. Bebo
claro
mas à rua se me arrisca agora a
frase, alheia ao que pertenço mas
do dia. Assim um
texto? Assim um nome, sem
espelho e só de espelho ao largo do
café tomado à rua, e quem
o disse? Nada o disse, mas
tasco de papel, mote de indústria.
Ao ler que é União somente o
modo, sem forma, tipo, origem ou
outras cores, ergo o que me
resta da cadeira, ossos
dopados, e olho o mundo inteiro em
separata, como se esta cara ousasse adir liga
no mundo ou
no papel que nada em frente ao seu
sentido.
4
De Deus nem este mar nem
sol nem dica.
João Fernandes 4.
À terra tanto ao mar e se lhes
dá que ocupe
eu
ou o corpo de que houvera feito
tanto espaço no invisível movimento de vestir minha
t-shirt a
muitos braços sem areia e passos
de moréia bocca chiusa.
Dizia nem tanto
ao mar nem isto à terra, e aqui sou no
mais raso, tipo de
altura onde
alguém disse
fica um segmento de espaço em que faz sentido
estar.
João Fernandes 4, não
zagueiro de t-shirt ou
camisola mas
nem tanto o mar e alguma terra
vista
aos 4 D-
eus que
se apavora enquanto
cresce e a terra ondeia o que lhe
resta onde o caminho é pedra
a pedra.
*
Luis Maffei é professor de Literatura Portuguesa da Universidade Federal Fluminense. Doutorou-se em 2007 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro com a tese Do mundo de Herberto Helder. É também poeta, autor de A (Rio de Janeiro: Oficina Raquel, 2006) e Telefunken (Rio de Janeiro: Oficina Raquel, 2008, Porto: Deriva, 2009). Coordena, para a editora Oficina Raquel, a série Portugal, 0, dedicada à novíssima literatura portuguesa, que editou, no Brasil, antologias das obras de Manuel de Freitas, Rui Pires Cabral, Luís Quintais e Pedro Eiras. |