ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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MANUEL GUSMÃO




A TRANSLAÇÃO DAS ROSAS
(trechos)


*
uma rosa abrindo-se no cérebro
e escandindo
a fala


*
esta rosa arde, esta rosa que
não cessa, mesmo as cinzas, sente,
a promessa guardam que;
esta ave que escreve o céu o fogo
abre,
o abraço ao fogo dado


*
no centro da rosa
o gelo reflecte exaltado
a galeria em chamas
que o rodeia


*
radiação solar
obrigada
à móvel terra

a rosa

corpo grave em explosão macia


*
veloz
primeiro,
com maciça lentidão
depois,
o ar
incendeia
a flor da pele
da rosa


vertigem minuciosa
mente
giratória


*
a rosa é o tigre

a rosa é um tigre preso
a meio do vôo

e o olhar da surpresa
preso no olhar do tigre

súbito susto


*
a neve é a rosa
se
a cicatriz dói. se tu
vieres ou eu te puder
contar o meu nascimento
na tua pele, a minha morte
na tua história, a minha história
no teu nascimento. se no vento
que sopra sobre os teus ossos
escrever puder
a transição do nome
onde o desejo
coroa a flor
da chama.


*
ramoso arbusto árvore mínima

encendida na circulação do ar
drenando o que sobra e o que excede
o enxofre e a albumina
onde poisas os lábios para
que se mova a metamorfose:
o amoroso salto da matéria
do vermelho


*
exasperação
do branco
revérbero do negro
disciplinado delírio
da
roseira
vertigem ascendente

rigoroso perfeito
paciente
furor


*
da rosa a
pétala negra
re-
unida
levanta vôo des-
enlaça-
-se

*


Manuel Gusmão (1945) é poeta e ensaísta. Publicou três livros: Dois sóis, A rosa / a arquitetura do mundo (1990); Mapas / o assombro a sombra (1996) e Teatros do tempo (2001). Escreveu importantes estudos sobre a poesia de Carlos de Oliveira e Alberto Caeiro.

*

 

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