MICHELINY
VERUNSCHK
HISTÓRIA
Desenterrar
os mortos
e
chupar seus ossos,
sugar
seu mosto
de
terra e sangue seco,
seu
gosto secreto
de
anos infindáveis,
seus
arcos,
costelas,
arquitetura.
(...)
Se
infeccionar com os mortos.
Triturar
seus artelhos
De
esponja ressequida,
Pintar
de negro e noite
Os
dentes e a saliva
E
abandonar o sonho
Viva.
Muito
viva.
O
MURO
No
muro de pedra
A
pedra
O
lodo
A
hera.
O
muro,
Um
ovo que se quebra
Um
touro na arena
Um
livro contra a tarde.
O
muro,
A
face sob a face.
ADÃO
Rompa-se
a casca
Rija
Metálica
Do saxofone:
Dança de quasares
Nudez de estrelas.
Brota,
homem.
RETIRANTE
Poeira,
Vaga
melodia
De
outros pés
E
a impressão,
O
dia inteiro,
De
haver levado
Um
tiro.
Essa
lua crescente
Sangrando
pela testa
E
os olhos,
Arames
ferindo a paisagem.
CONTO
DE FADAS
Um
deus estranho
Criou
moscas de vidro.
Elas pousam apenas
Sobre
pessoas
E
com as patas
Rasgam imperceptivelmente
A
pele
Depositando
centenas de ovos
Que
se espalham pela corrente sanguínea.
A
morte é um espetáculo à parte:
Uma
explosão de estilhaços
Voando
em direção de outros corpos.
*
Micheliny
Verunschk, poeta e historiadora, nasceu em Recife (PE),
em 1971. Publicou os livros de poesia Geografia
Íntima do Deserto e O
Observador e o Nada, ambos de 2003.
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