ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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NYDIA BONETTI

 

 

 

 

A CASA

 

casas antigas

dormem em paz

eu não

 

não  pude

construir minha casa

nunca dormi em paz

 

mas a casa se fez

por si mesma

a casa habita em mim

 

eu a carrego

sobre meus ombros

a casa sou eu

 

a paz,  couraça

calcária concha

espiralada enfim

 

 

CÉU RADICAL

 

desconexa

descontrolada

descompensada

 

astênica

neurótica

hipersensível

 

indefinida

incoerente

inconsistente

 

minha mente flutua

num céu de radicais

prefixos e sufixos

gregos e latinos

 

a minha poesia

apenas

mais um

dos meus delírios

 

 


 

LIMIAR

 

sobre meus ombros

o manto –  pele

do que não vivi

veste pesada

e espessa

que não aquece

 

–  quem abre o peito à unha

e escancara a alma?

 

ouço rumores

da cidade distante

cinzenta

chapiscada de sonhos

que tais os meus

jamais serão vividos

 

–  quem delimita fronteiras

entre o real e o sonho?

insisto ainda

o pássaro que passa

me indicou o caminho

e eu sigo__tola

em busca do destino

do não chegar

 

–   quem saberá dos segredos

que faz abrir portais?

 

 

 

 

 

 

 

 

FLUÍDOS

 

líquidos

 são os versos

pois que feitos

de lágrimas

suor e sangue

–  do pouco

que inda corre nas veias –

e outros fluídos tantos

pois que não resta em nós

nada de sólido e concreto

 

 

 

VERTIGEM

 

o que dizer

do silêncio

das vestes gastas

do mormaço

 

despenco

sinto gosto do abismo

ultrapasso fronteiras

nuvens de chuva

 

continuo caindo

no limite do corpo

engulo vento

 

mergulho cego

sigo em seta

linha reta

 

queda silenciosa

olhos fechados

o chão tão próximo

atalhos não há

 

tenho asas

não tenho forças

falta pouco

 

um colibri

cheirando a flores

passa por mim

desisto e vôo...

 

 

SOLARES

 

outra vez

me ronda a poesia

 

agora é assim

 

quase uma sombra

colada em mim

 

não

 

ela é o sol

eu,

a sombra
 

 

*


Nydia Bonetti nasceu em Piracaia, interior de São Paulo, onde reside. Engenheira civil e poeta, publica seus trabalhos no OVERMUNDO e outras comunidades e sites culturais e literários. Tem como projeto o lançamento de dois livros de poesia. Num deles, pretende reunir a série “Poemas do Caderno Azul” ou “Poeminhas”, da sua primeira fase. No outro, ainda sem título definitivo, textos mais recentes e inéditos, que inauguram uma nova fase na sua poesia.

*

 

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