PAULO VIEIRA
NÃO ME AVISARAM DE TEU POUSO
para Mário Faustino
Quando te vi no início
– nas linhas do livro –
o sol trabalhava a louça azul esmaltada
os pássaros moravam em teus calcanhares
e voavas.
Quando te vi novamente
– no fim do filme –
o musgo trabalhava a lousa fria póstuma
mas teu epitáfio era legível:
A morte tem o peso de um pouso.
PRECE PARA UM CARNEIRO MORTO
Rezemos uma prece em memória do carneiro assassinado
antes que a justiça atinja nossas testas
com um golpe certeiro e seco
do machado dos dias.
MATÉRIA ETERNA
Hoje deixe tudo o que é breve
E te consome os olhos sem sono
Perca o caminho do trabalho
Reconheça luas e sóis
Deixe tudo o que parece eterno mas é breve
e cuida de tua matéria
(o que parece breve não o é)
experimente:
retire os sapatos
e as meias três quartos
com pés de anjo
palmilhe o corpo de tua infância vegetal
depois repouse os pés
na terra cheirosa de tua posteridade
e esqueça tudo o que é breve.
(Do livro Infância Vegetal)
*
Paulo Vieira (Belém) é autor de Infância Vegetal (2004), Livro para Pescaria com Linha de Horizonte (2006), Orquídeas Anarquistas (2007) e Livro para Distração na Tragédia (2008). |