ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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PÉRICLES PRADE

 

 

 

 

SOBRE O MEDO

           

 

Perto do poço

o olho do chacal é lâmpada,

nervo do fogo.

 

 

No alto o corvo de ouro,

o riso, as asas

em desuso.

 

 

Como alcançar a rede

que paira sobre a cabeça do medo?

 

(De Nos limites do fogo, 1979)

 

 

 

PORTAS

                                                                                   

Na quinta porta

os ossos lacrados pela peste

 

Na quarta

o odor do vôo

em desalinho

 

Na terceira

as vestes de escama falsa

 

Na segunda

o santo próspero

e seus crimes

 

Na primeira

os olhos do guerreiro albino

 

(De Faróis Invisíveis, 1980)

 

 

EXCLUSÃO

 

Esplende o ar na batalha

como os olhos da espada. O fogo

e a cabeça da águia no céu

se desalinham entre o escudo

e o coração. No braço

                    do guerreiro

                     a raiz das flechas

É na forca que a língua

se lança do morto sobre a mão do vivo.

É no mar que nasce a nave

se no rosto do abutre

o rei com o Rio se funde.

É na terra que sorvo o sangue do verão

                                             a cerveja de ouro

entre o peito e o vento.

O sol se desguarnece como prata

na véspera da sombra.

 

Excluiu-se uma palavra

do catálogo divino

 

 (De Jaula Amorosa, 1995)

 

VÃ PROCURA

 

Em vão procurei a Tabacaria.

Em vão procurei o Esteves sem metafísica.

Queria, como Álvaro de Campos, dizer-lhe adeus.

Por toda a parte procurei

a Tabacaria & seu dono

olhando tabuletas diurnas e noturnas

em várias direções.

Mas nas tabacarias de hoje

(nas que entrei ou vi de relance)

não há Esteves, ainda que defronte

haja donos, metafísica de todo gênero,

sorrisos, máscaras mouras, jogadores

de xadrez, trovadores convencidos, fumadores,

marqueses, mendigos, lagartos decadentes,

línguas, temores, Amálias,

pombas, mistérios e contradições

 

(De Além dos símbolos, 2003)

 

 

CAVALINHOS TOSCANOS

 

Ao carrossel

retornei,

           encantado

com a disciplina dos cavalinhos toscanos.

 

Tanto faz montar

o primeiro,

                o segundo,

o quinto ou

                o oitavo,

essas criaturas simétricas

como o tigre experiente.

 

O que vale,

Aqui

&

Agora,

além do vento circular,

é o caminho da luz perdida

refeito pelo tempo.

 

Quantas voltas eu dei

só o meu amor saberá.

 

 

(De Tríplice viagem ao interior da bota, 2007)

 

 

*

Péricles Prade nasceu em Rio dos Cedros (SC). É poeta, contista e crítico de arte. Tem mais de 60 obras nos campos da poesia, ficção, história, filosofia, literatura e artes plásticas.  Publicou, entre outros, os livros de poemas: Nos limites do fogo (1976), Os faróis invisíveis (1980), Jaula amorosa (1995), Pequeno tratado poético das asas (1999), Ciranda Andaluz (2003), Além dos Símbolos (2003), Pantera em Movimento- Breves poemas de muito amor. (2007), Tríplice Viagem ao Interior da bota (2007) e Sob a Faca Giratória (2009).

*

 

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