PAULISTA, 7 P. M, CHUVA
sai agora,
mesmo na chuva, menina,
menina-marinha, sua
mochila no chão
que esperar mais, eu acho,
não adianta.
faz como
todo mundo
(correndo, feito
cardume)
e põe nas costas a mochila:
tua barbatana!
O TIGRE
o tigre é
velocidade contida.
para cada
listra negra, um ponto
que se esticou
no momento
do freio.
(o tigre é seu
próprio móvel
e estrada)
penso que
o tigre é um
leopardo mais lento.
o tigre estando
no poema, natural
que esteja domado, numa jaula.
e se na jaula (qualquer animal)
perde a sua velocidade.
o tigre do poema
é um leopardo na jaula
da linguagem
PERTO DO TÚNEL DA PAULISTA
o semáforo te
oferece balas,
vermelhas, amarelas,
e claro, como criança,
você espera
ansiosamente pela
verde. pedrinhas
de sinalização marcam
o acostamento mais
à frente e é proibido
passar, elas poderiam
ser amarelas ou
de outra cor, mas
o trânsito não caminha
nunca, nunca!! e você
pensa, ah como eu
gostaria de andar por
essa yellow brick road!
ÀS VEZES
às vezes somos todos peixes,
(ela disse lendo
um poema de Quintana)
abrindo e fechando a boca sem
dizer nada.
isso ela disse na saída do metrô,
alagados calçamento
e asfalto,
guarda-chuvas
com os cabos curvos, quase
anzóis,
segurando pessoas
afobadas,
se debatendo,
verdadeiros peixes
fisgados.
A ESTRELA
a estrela com sua lâmina
faz um rasgo no céu:
que a engole.
a luz viaja e envia
(a estrela) uma cruz
no céu avisando
sua morte.
cada estrela
uma cruz
que viaja:
a estrela
que chega é
só brilho-metal:
(de lâmina, de cruz)
está desestrelada.
TANGO
I have spread my dreams under your feet;
Tread softly because you tread on my dreams.
(W. B. Yeats)
a dançarina
gira e roda,
como se não
estivesse no
toca-discos
mas sob seus
pés o disco
que agora
toca.
seu salto é
muito fino:
salto-agulha.
está agora
sobre o disco
sua agulha
e é dali,(do
seu giro) que
sai a música!
RUA DA CONSOLAÇÃO À ZONA NORTE
quando entrei no ônibus
a mãe secava as lágrimas
do filho e
usava as mãos, a manta,
os cabelos,
como se fosse uma nuvem
que absorvesse chuva
ao invés de chover.
mas os passageiros
coitados a criança
gritava
e era como se
cada passageiro estivesse
com um fone
de ouvido e ele só
transmitisse os seus gritos! |