ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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RODRIGO DE SOUZA LEÃO


Um dia


Hoje me botaram numa jaula
Eu fiquei andando
De um lado para o outro

Feito um bêbado que via
Muitos dedos num só
Que eram tantos assim

Mas não tinha dedo algum
A me enforcar só eu mesmo
E a ficção de que amei


Bula


Até que enfim veio a paz
Pude dormir sem tremer

Pude temer sem dormir
Pude urinar em mim

Enfim pude fazer o que quis
Pelo menos uma vez

Foram comigo daqui
Leram-me a minha bula


Considerações sobre o pop


Acho que as pessoas tristes vivem mais
Elas tomam mais remédios

Os doidos só não tomam mais remédio
Por que os laboratórios não querem

Governos preferem habitar algum planeta
Do que habitar algum remédio e alguma mente

È tão perigoso falar da loucura
Podem achar que eu sou louco mesmo


Mentes cartesianas


Vou mandar um livro pra você
Um livro que diga como fazer pra não ter vontade
De se matar

Um livro que dê vontade de tomar banho
E que me faça acordar todo o dia as seis horas
Da nova manhã

Um livro que o coloque em linha reta
E acabe com o seu paralelismo que alterna
Alguns graus pra lá

Um livro que te solucione
Pois você é um problema difícil
Para todo mundo


Certeza sem nuvens e estrelas


Nunca saio de mim
Por isso sou só

Tenho uma camada de pó
Tomo remédios coloridos

Escuto com três ouvidos
E vejo com um olho só

Agora me olha e me diz
Se estou certo

Se sou mesmo este céu deserto

 

*

Rodrigo de Souza Leão nasceu em 1965. É carioca, autor de Há Flores na Pele.

*

 

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