ZUNÁI - Revista de poesia & debates

[ retornar - outros textos - home ]

 

 

THIAGO PONCE DE MORAES

 

 

 

 

PARALAXE NO JARDIM ABSTRATO DE CRANE

 

Existirá o poema embora não tenhas memória ou medo ou esperança

Para além de sombras e relva a teus pés.

 

Ou o amor e a morte em que copas pousem como pássaros

Em galhos do amanhecer.

 

Ou veias por que chegue a seiva dos dias e dias esquecidos

Nas raízes atrozes da agonia.

 

Ou albatrozes sobre um oceano em que não és,

Mas sonhas – não há razão.

 

Mais perto do azul fugaz respiras ciano –

Desejos, destinos.

 

 

AINDA

 

 

A eternidade.                        As palavras sem sombra,

Os nomes dormem balbuciando a pronúncia em tua boca.

 

Teus cabelos e tu entregues ao devaneio e soltos

Como folhas de uma árvore caindo em esquecimento.

 

Na raiz do dia, sob, no éter da saudade,

Nos muros a calar a cidade em que sonhas

 

– interrompida.

 

 

ERRÁTICA 

 

O grave pouco pese e sóbria 

À sombra de ampla árvore fique.

 

Tua fala arda, sem voz, 

Em veredas e nada, 

Nem os brancos antebraços, tarde 

Em mover só o peso que levas.

 

Rua tua memória e as ruas do esquecimento 

Nesta tarde sem cores durem – 

Que anuncias.

   

Tua pronúncia erga esta Cidade erma 

E a poeira em teu nome extrema 

Assente se te é própria.

 

 

PARAGEM

 

Navega este mar que os sonhos lega. Para

Compreenderes teu mundo,

Não te prendas

Ao dia que o não supõe, nem a nada compreendas –

Supera a navegabilidade de contemplar um poente imposto,

A teu ver, e coisas que entrevês vacilantes pelas sombras,

O dia se pondo em fendas

Sem nomes ou formas ou fundos (supões),

Intactas, por vezes, mas nunca puras,

Pois 

Cada uma de um jeito em cada está (esta

Agora seria a tua memória, esta, uma

            Casa de campo sem campo,

       Só cansaço e muros

Brancos de uma tarde

Sob arcos de

Espinhos);

Explora outras origens com teus olhos a que falta o saber,

                      Que o crepúsculo sopra de tuas tristezas um ar gelado,

         Uma véspera, uma arqueologia do presente inane

      Em que te negues nunca apenas,

Pois.

 

 

 

 

*


Thiago Ponce de Moraes é poeta e tradutor. Faz parte do conselho editorial da Zunái – Revista de poesia & debates. Publicou em 2006 o livro de poesia Imp.. Os poemas presentes nesta edição fazem parte do livro De gestos lassos ou nenhuns, a sair na coleção Caixa Preta (Lumme Editor).

 

Leia outros poemas de Thiago Ponce de Moraes.

*

 

retornar <<<

[ ZUNÁI- 2003 - 2009 ]