ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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WILSON NANINI

 

 

 

 

PILATOS

 

mácula, senha:

a cifra em ferro em brasa

na genitália

 

“policio limiares mo

vediços

 

já nem há égide

para com meus

brejos (não-lirais) internos

 

meus gestos de porão

meu silêncio de ferrugem

 

mas, volvo ao canto

bélico, à

marcha marcial

 

: pelejo contra

diamânticos (auto)muros

labirínticos

 

por vezes,

insontes

 

mas,

raramente

divinos”

 

 

NERO

 

de vidro, os ossos

do anjo

 

de mármore, seus

olhos inquebráveis

 

tocava cítara bélica

em horas de ócio

em circo insaciável de leões,

gladiadores

 

: catacumbas me alentavam

 

empoleirado em meu

canhoto ombro, à beira

do ouvido facínora,

me ditava:

f-o-i-c-e

 

– enquanto eu semeava

dardos de fogo

em homizio cristão insonte

 

depois, séculos derruídos,

meu nome: napoleão,

                   hitler

 

 

PRAGAS EGÍPCIAS

 

de repente, quis

ferir algo belo,

sepultar pianos,

semear desfiladeiros,

 

os que puderam

se exilaram: deixaram

rastros hieróglifos

 

de repente, verti

fetos na fossa,

estilhacei seus crânios contra

as quinas das pirâmides

 

ensaiei estripar as

vísceras de cristo

 

mas caso o rio

recobrasse sua

pura água primeira

eu enjaularia meus ferozes

anjos-sicários

 

eu seria dócil

sóbrio como

uma orquídea ao relento

 

 

MADALENA

 

jesus é comigo: eu (o açúcar

de sua hóstia) riso, ciranda e precipí-

cio

 

 

CAPITU

 

a moça de olhar oblíquo e seu

enigma indelével

 

: acaricia enquanto apunhala?

 

 “eu toda sou

cisterna ou cântaro?

 

fico algo ciranda

circo em plena missa

 

: empunho meu catavento e saio

à cata de salvar pipas após o cerol

 

(à deriva nos céus invertebrados

já demolidos com remanso)

 

 

OH SÃO JOSÉ!  (POR SUA ESPOSA CASTA) 

 

perdoai-nos

 

o espelho

sem reflexo

 

o homicida (santo) em meu ventre

prestes

 

perdoai-nos

 

o voo

sem perícia

 

a nudez

sem delícia

 

 

 

MADALENA II

 

do natal disseram-me

: “damascos...”

 

...e anestésico

quando dos pregos nas chagas

do crucificado menino

 

mas, vale ouro/incenso/mirra

meu comércio-carnal de

ninar-vos com eternidades perecíveis?

 

talvez só depois que o zumbidor néon

das vitrinas com presépios

tatuar na pele de minhas retinas cruas

o lusco-fusco

de sua comovente hemorragia

 

 

MURALHA

 

deus é quaresma

severa ou só aragem?

 

tive afeto por porões de

mesquita/sinagoga/catedral

 

territórios sem paradeiro

 

vociferam túmulos/ferrolhos

 

à floricultura da morte, pastorear

a sentinela de espontâneos homens-bomba

 

até restar, à boca nua, um gosto acre

de prece encruada

 

que adoce os pássaros da sevícia

 

a imolar cordeiros

– em autodesfiladeiro –

com  requintes de delícia

 

 

RAPINA

 

“ente da ânsia

contemporânea, minha

liberdade é geométrica”

 

do extravio do perfume

em plena treva ou ao

meio-dia latrocida

 

alma – ou penumbra –

de cacos

de vidro e cuspe

 

sai com a morte a tiracolo,

o olhar de puro

arame farpado,

 

empunha seu cerol e,

 

em frações de segundo,

um grito de pólvora faz

um silêncio de sangue

 

 

POLICIAL

 

havia de ser um deus bélico

e nutrir (a)

ferir meus (a)fetos com foices, cânceres

 

: “empoleirados em meus ombros, atrozes

anjos me ditam ‘insônia’, ‘a-

rame’, ‘cataclismo’”

 

mas me manter! de cerne sempre menino

incólume (como uma sede infatigável

por uma água imorredoura)

 

até que o revólver

(papoula pólvora peçonha) obtenha

uma alguma forma de relento

 

 

*

 

Wilson Torres Nanini nasceu em Poços de Caldas/MG, em 1980. Reside em Botelhos/MG, onde atua como policial militar “por ofício e poeta por extravio”. Edita o blog Quebrantos, Relances e Abismos ao Relento (www.wilsonnanini.blogspot.com) que possivelmente dará título a seu primeiro livro, ainda inédito.

*

 

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