ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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ELIZABETH AZCONA CRANWELL

 

 

ESTO QUE SUBE Y TOCA TU PALABRA


Es un hablar de nieve
esto que sube y toca tu palabra.
Se dobla el otro extremo del espacio
allá donde el verano compromete
la ciudad en que habitas.

Alejada por la tierra implacable
tu cara es el azar de mi memoria.
Centellan los pájaros servidores del frío
y obedezco a los cóncavos designios
que le anuncian con colores helados en las ramas.

Voz de sol en destierro
manos que denominan cosas
entre huellas y pinos solitarios.  

Yo sé mejor de lejos tu nombre de flor cruda
jugada en la inocencia.

Rotan su luz opuesta los solsticios
y hay un cambio secreto que le nace al lenguaje
agazapado en un rincón del mundo.

Qué punto del espacio
enlaza como un encuentro grave
tu decir y mi ausencia?
Algo curre en un sitio del alma
que desconoce sus predilecciones.
Levanto una mirada de fiesta prohibida
limada de una pérdida.
Ya no descubro rosas, las invento
de las sopladas voces de oscuridad y exilio.

Nunca se empieza a amar sin una chispa
de error en la mirada.

La distancia es a veces
mi mudo espacio de reconocimientos.

 

 

ISTO QUE SOBE E TOCA TUA PALAVRA


É um falar de neve
isto que sobe e toca tua palavra.
Dobra-se o outro extremo do espaço
lá onde o verão compromete
a cidade em que habitas.

Distanciada pela terra implacável
teu rosto é o acaso de minha memória.
Cintilam os pássaros servidores do frio
e obedeço aos côncavos desígnios
que o anunciam com cores geladas nos ramos.

Voz de sol no desterro
mãos que nomeiam coisas
entre rastros e pinhos solitários.

Eu sei melhor à distância teu nome de flor crua
jogada na inocência.

Rodam sua luz oposta os solstícios
e há uma secreta mudança que brota à linguagem
escondida em um rincão do mundo.  

Que ponto do espaço
enlaça como um encontro grave
teu dizer e minha ausência?
Algo ocorre em um lugar da alma
que desconhece suas predileções.
Levanto um olhar de festa proibida
polida por uma perda.
Já não descubro rosas, invento-as
das sopradas vozes de obscuridade e exílio.

Nunca se começa a amar sem uma faísca
de engano no olhar.

A distância é às vezes
meu espaço mudo de reconhecimentos.

 

 

DONDE CAMBIA LA LUZ


Vagabundo:
 

Tuviste vino y sombras bajo un puente de frío
repartiste monedas de pan en tus memorias
(para lograr el fuego, hay que saber los ritos del amor).
Ahora piensas tu infancia
y la noche hace frutas de hielo con tus lágrimas solas.

Loco:

Era loco y callaba.
No quería gustar, ni ver, ni oír.
Yo descubrí el idioma de los pájaros que se encrespaba jubiloso
cuando el sol o una mano le besaban la piel, enamorados.

Sino:

Yo caeré
(enciérrame con tu palabra)
no escucharé las voces de la luz
(háblame con tu silencio)
he de cantar en la caída
(sitiame con tu gesto)
sea tu mano como el sol a la tierra.

 

ONDE MUDA A LUZ

Vagabundo:

Tiveste vinho e sombras sob uma ponte de frio
repartiste moedas de pão em tuas memórias
(para conseguir o fogo, é necessário conhecer os ritos do amor).
Agora relembras tua infância
e a noite faz frutas de gelo com tuas lágrimas solitárias.

Louco:

Era louco e calava.
Não queria gostar, nem ver, nem ouvir.
Descobri o idioma dos pássaros que se elevava com júbilo
quando o sol ou uma mão lhe beijavam a pele, enamorados.

Sina:

Cairei
(aprisiona-me com tua palavra)
não escutarei as vozes da luz
(fala-me com teu silêncio)
hei de cantar na queda
(cerca-me com teu gesto)
seja tua mão como o sol à terra.

 

EL ESCRIBA DE MIRADA FIJA
 

La memoria se obstina
           aunque los siglos la hayan despojado
            de su respiración, su poder natural.

La memoria se obstina en los huesos, la piel,
            el poeta perplejo ante un libro cerrado
            pide contar las tierras del retorno.

Hay palabras mordidas en labios que no dicen
            y él marcha abriendo las tinieblas
            con un báculo en pos de algunas frases viejas
            desnudas de color y ornadas sin embargo por la fe.  

En cuanto pasa, vulve a cerrarse la catedral de voces
            quedan ciertas figuras con sus brillantes tonos
            y harapos de liturgia.

Y hay allí cosas que existen para el testigo forastero
            para que siga modulando frases
            y quiera atar rarezas y excelencias,
            lujosas vestiduras de palabras
            a los ropajes secos del concepto.

Y la memoria, ya sin cadenas, le ilumina el rodar de las
            sombras.

El agua se alimenta del pez, el pez bebe del agua que
            lo ampara
            y las bestias respiran el aire donde crecen
            comen los frutos de la tierra, matan para
            vivir
            y gozan bajo el sol en la luz primera
            del sexto día.

Habla el poeta de la excelencia de las flores y la rareza
            del corazón
            pregunta por un manojo tenso de células y
            venas
            por una zona libre donde se cante a los
            cuatro elementos:
            agua y aire, que nos permiten respirar y nos
            sacian la sed
            cuando el fuego le marca su existencia a la
            tierra.  

Y que él no sea entonces mendigo sólo de la eternidad
            sino el escriba de mirada fija tocado
            por su asombro
            por las sentencias vivas ante las cosas muertas.

Cumpla el escriba su mandato
            con el silencio abierto
            sólo para las penitencias de la luz.  

 

 

O ESCRIBA DE OLHAR FIXO


A memória se obstina
           ainda que os séculos a tenham despojado
            de sua respiração, seu poder natural.

A memória se obstina nos ossos, a pele,
            o poeta perplexo ante um livro fechado
            pede para contar as terras do retorno (1).  

Há palavras mordidas em lábios que não dizem
            e ele marcha abrindo as sombras
            com uma bengala atrás de algumas frases velhas
            despidas de cor, mas ornadas de fé.  

Enquanto passa, volta a se fechar a catedral de vozes
            ficam certas figuras com seus tons brilhantes
            e farrapos de liturgia.

E há coisas ali que existem para o testemunho forasteiro
            para que continue modulando frases
            e queira conjugar raridades e excelências,
            luxuosas vestes de palavras
            às roupagens secas do conceito.

E a memória, já sem correntes, ilumina o vagar das
            sombras.

A água se alimenta do peixe, o peixe bebe a água que
            o ampara
            e os animais respiram o ar onde crescem
            comem os frutos da terra, matam para
            viver
            e gozam sob o sol na primeira luz
            do sexto dia.

Fala o poeta da excelência das flores e da singularidade
            do coração
            pergunta por um feixe tenso de células e
            veias
            por um espaço livre onde se cante aos
            quatro elementos:
            água e ar, que nos permitem respirar e nos
            saciam a sede
            quando o fogo marca sua existência à
            terra.  

E que ele então não seja mendigo apenas da eternidade
            senão o escriba de olhar fixo tocado
            por seu assombro
            pelas sentenças vivas ante as coisas mortas.

Cumpra o escriba o seu mandato
            com o silêncio aberto
            somente para as penitências da luz.   

 

*

Traduções: Ana Maria Ramiro  

 

N.T.: Esta frase comporta várias leituras. "Pide"  também tem a conotação de rogo, exigência, e tierras del retorno pode significar terras de origem ou leito de morte, segundo o contexto.

 

*
Elizabeth Azcona Cranwell nasceu 1934, em Buenos Aires (Argentina). É reconhecida não só pela obra poética, mas também pelas diversas atividades literárias que desenvolveu como contista e ensaísta de destaque ou como crítica literária habitual do jornal argentino La Nación. Graduou-se em Filosofia e Letras, tendo exercido a docência, e dirigiu ainda um sem número de seminários e oficinas literárias. Sua obra foi influenciada sobretudo por Paul Éluard e Antonin Artaud, e entre os autores argentinos, manteve diálogo com Claudia Orozco e Alejandra Pizarnik. Seu primeiro livro de poesias, Capítulo sin presencia, foi publicado quando a poeta tinha apenas 17 anos e a partir de então, seguiram-se Los Riesgos y el Vacío, De los Opuestos, Impossibilidades del lenguaje o los nombres del amor, Anunciación del mar y la inocencia, El mandato, Las moradas del Sol, El escriba de mirada fija e El Reino intermitente. A autora faleceu em 2004, em Buenos Aires.

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