ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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 LUISA FUTORANSKY

 

 

 

MESTER DE HECHICERÍA

A María del Carmen Suárez

Hay que comer un corazón de tigre joven
para tener afiladas las zarpas;
hay que llegar al centro de la estepa
y cortarle la lengua a un lobo hambriento
para poder hablar con la luna;
hay que peregrinar con los tarahumaras
para ser rico en silencio;
hay que sufrir el celo de todos los animales
para conocer los ritos del amor.

Recién entonces, mujer,
ve al encuentro de tu hombre
y camina a su lado por las estaciones;
no vuelvas la cabeza para llamar a tu inocencia
porque con ella alguien prepara
un nuevo sortilegio.

 

 

TRABALHO DE FEITIÇARIA

A María del Carmen Suárez

É preciso comer um coração de tigre jovem
para ter afiadas as garras;
é preciso chegar ao centro da estepe
e cortar a língua de um lobo faminto
para poder falar com a lua;
é preciso peregrinar com os tarahumaras
para ser rico em silêncio;
é preciso sofrer o cio de todos os animais
para conhecer os ritos do amor.

Apenas então, mulher,
vai ao encontro de teu homem
e caminha a seu lado pelas estações;
não voltes a cabeça para chamar tua inocência
porque com ela alguém prepara
um novo sortilégio.

 

LAS VÍSCERAS DE DIOS
 

Sé que va a venir y me apresto para la batalla
te noto, vecindad del poema, te noto en las cosas que se alejan
en que todo puede postergarse menos esto
es esta habitación, es esta palabra
soy yo desde que he nacido
con cada una de las cicatrices que dejaron los rostros en mi vida
con cada uno de los días que no volverán a repetirse
cada palabra que se pronunció
y cada una que dejó de pronunciarse
todos los sueños olvidados
las remotas señales de la divinidad
las serpientes que a uno le devoran
o, en las grandes épocas de sol,
que uno suele devorar.

El poema, esta Gran Ópera donde no faltan las marchas triunfales
los puñales de hojalata
los anillos con fondo secreto para guardar el veneno
las traiciones
las pelucas
los sonámbulos
los divos
los dragones de cartón
los verdaderos dragones
los polifemos con su único ojo recién vaciado
deus ex machina
ven conmigo Dios a recorrer el mundo
ven a este cuarto
y te mostraré lo que es el poema.

 

 

AS VÍSCERAS DE DEUS

Sei que vai vir e me apronto para a batalha
te noto, vizinhança do poema, te noto nas coisas que se afastam
em que tudo pode postergar-se menos isto
é este aposento, é esta palavra
sou eu desde que nasci
com cada uma das cicatrizes que deixaram os rostos em minha vida
com cada um dos dias que não voltarão a se repetir
cada palavra que se pronunciou
e cada uma que deixou de pronunciar-se
todos os sonhos esquecidos
os remotos sinais da divindade
as serpentes que devoram alguém
ou, nas grandes épocas de sol,
que alguém costuma devorar.

O poema, esta Grande Ópera onde não faltam as marchas triunfais
os punhais de folha-de-flandres
os anéis com fundo falso para guardar o veneno
as traições
as perucas
os sonâmbulos
os divos
os dragões de papelão
os verdadeiros dragões
os polifemos com seu único olho recém-vazado
deus ex machina
vem comigo Deus correr mundo
vem a este quarto
e te mostrarei o que é o poema.

 

RAZÓN DE ANATOMÍA
 

me he besado con poetas, pintores, cineastas
empleadas, jew princesses, rateros, hippies
ingenieros, tenores, guerrilleros

en mi boca todos los caminos de la vida  

es tiempo / de ocuparme de mis pies  

 

RAZÃO DE ANATOMIA

troquei beijos com poetas, pintores, cineastas
empregadas, jew princesses, ladrões, hippies
engenheiros, tenores, guerrilheiros

em minha boca todos os caminhos da vida

é tempo / de ocupar-me de meus pés  

 
*

Traduções: Ronald Polito

*

Luisa Futoransky, poeta argentina (Buenos Aires, 1939). Publicou, entre outros títulos, De donde son las palabras (1998).

*

 

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