PAUL GUILLÉN
EL ESPECTADOR INVISIBLE, IMPARCIAL & ESPECTRAL
(RODRIGO LIRA’S FRONTISPIECES)
Si hay un Proyecto de Obras Completas de Rodrigo Lira ¿deberíamos empezar por la primera o la segunda parte? Yo empezaría a hablar del cachorro o del perro muerto, antes que de Rodrigo, cuando uno tiene un angustioso caso de soltería no debería fijarse que en la calle se hizo perro o que las azucenas de la esquina arden en perfume y sexo, el cachorro tiene el pelaje descastado, como es costumbre en él no cuida ni se pierde en la intersección de ninguna avenida, ese perro –ni flaco ni gordo ni negro ni azul– sólo mira a los transeúntes perder sus pisadas y sus ojos, y si esos ojos rodaran por la pista como canicas, los cachorros o los perros muertos sólo verían sangre y una piara torpe rumbo al camal; pero los cachorros tienen rabia y tiemblan y temen que la baja policía los atrape, sus babas son imparciales y frías, sus patas están rotas, no pueden chillar, ya no persiguen gatos, ratas o mariposas, sólo ven a los transeúntes pasar leyendo poemas ecológicos sin lógica, esos cachorros peludos y babosos pintan con sus rabos miles de acuarelas llenas de peces y palomas enlatadas, cuando tienen hambre ya no pueden ir al supermercado por la comida de moda, se arrastran y sólo ven y no quieren ser el perro desollado de Varela, sólo atinan a dar un mordisco al aire –niebla que se confunde con la carne del perro en las mañanas en que voy a recoger el periódico, y justo ahí me encuentro con el celeste color valium de tus ojos bien lustrados–, esa guasa es tu Belleza en toneladas kilométricas o son mis ojos que ya cayeron y son imparciales, espectrales e invisibles.
O ESPECTADOR INVISÍVEL, IMPARCIAL & ESPECTRAL
(RODRIGO LIRA’S FRONTISPIECES)
Se há um Projeto de Obras Completas de Rodrigo Lira, deveríamos começar pela primeira ou segunda parte? Eu começaria a falar do cachorrinho ou do cão morto, antes que de Rodrigo, quando alguém tem um angustiante caso de solteirismo não deveria reparar que na rua se tornou cachorro ou que as açucenas da esquina ardem em perfume e sexo, o cachorrinho tem o pelo acabado, e como nele é costume não cuida nem se perde na intersecção de nenhuma avenida, esse cão – nem magro nem gordo nem negro nem azul – só olha os transeuntes perdendo seus passos e seus olhos, e se esses olhos rolassem pela pista como bolinhas de gude, os cachorrinhos ou os cães mortos só veriam sangue e um rebanho trôpego rumo ao matadouro; mas os cachorrinhos têm raiva e tremem e temem que os guardas os prendam, suas babas são imparciais e frias, suas patas estão quebradas, não podem gritar, já não perseguem gatos, ratos ou borboletas, só veem os transeuntes passando lendo poemas ecológicos sem lógica, esses cachorrinhos peludos e babões pintam com seus rabos milhares de aquarelas cheias de peixes e pombas enlatadas, quando têm fome já não podem ir ao supermercado atrás da comida da moda, se arrastam e só veem e não querem ser o cão esfolado de Varela, só atinam em mordiscar o ar – névoa que se confunde com a carne do cão nas manhãs em que vou pegar o jornal, e justo aí me encontro com a azul-celeste cor valium de teus olhos bem lustrados –, essa piada é tua Beleza em toneladas quilométricas ou são meus olhos que já caíram e são imparciais, espectrais e invisíveis.
Tradução: Diana de Hollanda
*
Paul Guillén (Ica, 1976). Estudou literatura na Universidad Nacional Mayor de San Marcos. Publicou os livros de poemas La transformación de los metales (tRpode, 2005) e Historia secreta (AECID - Lustra editores, 2008). Atualmente é membro do conselho da Revista Metrópolis (México), do movimento Hora Zero, do conselho editorial de Lustra editores e mantém o blog e revista Sol negro. |