ZUNÁI - Revista de poesia & debates

 

 

REINA MARÍA RODRIGUEZ


ÁMBAR

                                                                        para Osvaldo


Pulso de cuadradas piedras que se caen sostenidas.
Por cada una se desprende
el valor de nuestra amistad.
Cuadrada ciudad como cuentas de muchos colores:
cuadrilátero infernal de cerro en cerro
desordenado para llegar hasta ti.
Cómo cuento estas cuentas tan dispersas?

El vendedor las pesó bien en la pecita si pasión,
pero lo engañaron.
Despilfarro de cuentas ámbar contra el tiempo
que duró nuestro encuentro.
El resultado de conversar sin aire en la colina
genera una inquietud de contemplar tu mano
(ancha y cortante contra el filo del vaso de cerveza).

Qué ha quedado de nosotros?
La vanidad de mover las piedras
en el aire insatisfecho y sin ilusión?
Hojuelas de maíz tierno contaminadas por el vapor
del distrito, ya quemadas?
Carne cruda de Japón, carne hambrienta
que estremece y entumece la doblez de mi lengua?

Pruebo helado de té verde, “como masticar un jade” –dices,
paralizando mi risa nerviosa al remover con la cucharita de plata
el temblor de la tierra,
ese temblor de mi boca que recibe de tu mano, la joya invisible,
la promesa sostenida que me das de comer, de probar,
con la hilaridad de un pasado vencido por el presente otra vez.
“El fue mi juventud”, repito, para reafirmarlo,
aunque ya se sabe. Y la cuchara suena.
Un broche de plata en la muñeca para cerrar un pacto
con el esfuerzo carbonizado de querer.

Pero las piedras dicen que volverás al comienzo
(tú, conmigo).
Ellas regresan ahora como un pulso finito,
luego volverán como una soga alrededor del cuello
o dentro de un reloj acostumbrado a mentir.
Infinita caravana de piedras sin contar
rodeándonos.
De dos en dos, de tres en tres...
Cuadriláteros portátiles
escupiendo cenizas art decó.

–El pulso por la vida– ha dicho el vendedor siempre estafándonos.
Uno más de aquellos viejos anticuarios
a quien entregamos de por vida el valor de nuestra amistad, ahora
(ámbar prieto) para no adquirir más que la prohibición.

Y lo traje de vuelta, lo escondí bajo la almohada.
Lo oculté como pude para no masticar las veinticuatro horas
cenizas de ámbar.
Porque ya te he perdido muchas veces
entre el rojo solitario del volcán
eructando su roca más incandescente, tú.

Ahora, las piedras que me diste coronarán esta erupción.
Quizás la última erupción bajo mi cabeza
fríamente.

 

ÂMBAR

                                                                        para Osvaldo


Pulseira de pedras quadradas que caem unidas, sustidas.
De cada uma se desprende
o valor de nossa amizade.
Quadrada cidade como contas de muitas cores:
quadrilátero infernal de colina em colina
desordenado para chegar a ti.
Como conto estas contas tão dispersas?

O vendedor as pesou bem na balança sem paixão,
mas foi enganado.
Um desperdício de contas âmbar contra o tempo
que durou nosso encontro.
O resultado de conversar sem ar lá na colina
gera uma inquietude de contemplar tua mão
(larga e cortante contra a borda do corpo de cerveja).

O que ficou de nós mesmos?
A vaidade de mover as pedras
no ar insatisfeito e sem ilusão?
Flocos de milho macio, contaminados pelo vapor
do distrito, já queimados?
Carne crua do Japão, carne faminta
que estremece e entorpece a dobra de minha língua?

Provo o sorvete de chá verde, “é como mastigar jade”, tu dizes,
paralisando meu riso nervoso ao remover com a colherinha de prata
o tremor da terra,
esse tremor de minha boca que recebe de tua mão, a jóia invisível,
a promessa mantida que me dás de comer, de provar,
com a hilaridade de um passado vencido pelo presente outra vez.
“Ele foi a minha juventude”, repito, para reafirmá-lo,
ainda que já saiba. E a colher retine.
Um fecho de prata no pulso para firmar um pacto
com o esforço carbonizado de querer.

Porém, as pedras dizem que voltarás ao começo
(tu, comigo).
Elas retornam agora como uma pulseira fina,
logo voltarão como um laço ao redor do pescoço
ou dentro de um relógio acostumado a mentir.
Infinita caravana de pedras sem contar,
nos rodeando.
De duas em duas, de três em três...
Quadriláteros portáteis
cuspindo cinzas art decó.

— O impulso de viver — disse o vendedor, sempre nos enganando.
Mais um daqueles velhos antiquários
a quem entregamos para a vida toda o valor de nossa amizade, agora
(âmbar negro) para não adquirir nada mais que a proibição.

E eu o trouxe de volta, o escondi debaixo do travesseiro.
Ocultei-o como pude, para não mastigar vinte e quatro horas
cinzas de âmbar.
Porque já te perdi muitas vezes
entre o vermelho solitário do vulcão
eructando sua rocha mais incandescente — tu.

Agora, as pedras que me deste hão de coroar esta erupção.
Talvez a última erupção sob minha cabeça
friamente.


Tradução: Luiz Roberto Guedes

 

 

LAS ISLAS

mira y no las descuides
las islas son mundos aparentes
cortadas en el mar
transcurren en su soledad de tierras sin raíz
en el silencio del agua una mancha
de haber anclado sólo aquella vez
y poner los despojos de la tempestad y las ráfagas
sobre las olas
aquí los cementerios son hermosos y pequeños
y están más allá de las ceremonias
me he bañado para sentarme en la yerba
es la zona de bruma
donde acontecen los espejismos
y vuelvo a sonreír
no se si estás aquí o es el peligro
empiezo a ser libre entre esos límites que se
intercambian:
seguro amanecerá.

Las islas son mundos aparentes
coberturas del cansancio en los iniciadores de la
calma
sé que sólo en mí estuvo aquella vez la realidad
un intervalo entre dos tiempos
cortadas en el mar
soy lanzada hacia un lugar más tenue
las muchachas que serán jóvenes una vez más
contra la sabiduría y la rigidez de los que
envejecieron
sin los movimientos y las contorsiones del mar
las islas son mundos aparentes manchas de sal
otra mujer lanzada encima de mí que no conozco
sólo la vida menor
la gratitud sin prisa de las islas en mí.

 

AS ILHAS

veja e não descuide delas
as ilhas são mundos aparentes
cortadas no mar
transcorrem em sua solidão de terras sem raiz
no silêncio da água uma mancha
de haver ancorado só aquela vez
e colocar os despojos da tempestade e as rajadas
sobre as ondas
aqui os cemitérios são lindos e pequenos
e estão além das cerimônias
me banhei para sentar-me na grama
é a zona de sombra
onde acontecem os espelhismos
e volto a sorrir
não sei se estás aqui ou é o perigo
começo a ser livre entre esses limites que se
intercambiam:
certamente amanhecerá.

As ilhas são mundos aparentes
coberturas do cansaço nos iniciadores da
calma
sei que a realidade só esteve em mim aquela vez
um intervalo entre dois tempos
cortadas no mar
sou lançada até um lugar mais tênue
as meninas que serão jovens uma vez mais
contra a sabedoria e a rigidez dos que
envelheceram
sem os movimentos e as contorsões do mar
as ilhas são mundos aparentes manchas de sal
outra mulher lançada para cima de mim que não conheço
só a vida menor
a gratidão sem pressa das ilhas em mim.


Tradução: Claudio Daniel


 

VICENT VAN GOGH TAMBIÉN PINTÓ VELEROS

no sé cómo se construye un velero
nadie me propuso nunca construir
un pequeño velero
no traían más que tablas de salvación
para flotar a la deriva
yo siempre te dije que era grande el océano
tiene por imagen el viento y la madera
el viento del mar sin que nadie lo demande
lo encamina hacia mejores días
su seguridad es que el límite no existe
y la brújula no es más que un instrumento
para no perder
antes sólo guiaban las estrellas
dónde el hombre y el pez ponían sus ojos
lo importante es la fuga del velero
su pasión por las olas
porque la travesía será larga
y la canción de las cítaras podría hundirnos
sin que lleguemos
a un faro inmóvil.

 

VICENT VAN GOGH TAMBÉM PINTOU VELEIROS

não sei como se constrói um veleiro
ninguém nunca me propôs construir
um pequeno veleiro
não traziam mais que tábuas de salvação
para flutuar à deriva
eu sempre te disse que era grande o oceano
tem por imagem o vento e a madeira
o vento do mar sem que ninguém o peça
o encaminha até dias melhores
sua segurança é que o limite não existe
e a bússola não é mais que um instrumento
para não nos perdermos
antes só nos guiavam as estrelas
onde o homem e o peixe punham seus olhos
o importante é a fuga do veleiro
sua paixão pelas ondas
porque a travessia será longa
e a canção das cítaras poderia afundar-nos
sem que cheguemos
a um farol imóvel.


Tradução: Claudio Daniel

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Reina María Rodríguez nasceu em Havana (Cuba) em 1952. Publicou os seguintes livros: Cuando una mujer no duerme, Para un cordero blanco, Páramo, La foto del invernadero e Te daré de comer como a los pájaros. Licenciada em Literatura Hispano-americana pela Universidad de La Habana, recebeu numerosos prêmios literários em seu país e no exterior, entre eles o Prêmio Plural (México, 1991) e o Prêmio da Crítica (Cuba, 1993). Em 1988, recebeu a Ordem pela Cultura Nacional, concedida pelo Conselho de Estado da República de Cuba.

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