ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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RENATO LEDUC

 


YO SOY EL LIBRO...

Yo soy el libro que no dice nada;
yo soy tinta y papel y nada más;
no llevaré a tu mente fatigada
ningún nuevo motivo de pensar.

¿Academias? ¿Gramática? ¿Sintaxis?
Son gendarmes de trafico, lector.

Yo soy como automóvil que pasa por las calles
a gran velocidad
sonando el claxon y aplastando gente
y sin otra mayor finalidad.

Yo soy turiferario en los altares
de la Santísima Trivialidad.

 

EU SOU O LIVRO...

Eu sou o livro que não diz nada;
eu sou tinta e papel e nada mais;
não levarei a tua mente fatigada
nenhum novo motivo para pensar.

Academias? Gramática? Sintaxe?
São guardas de trânsito, leitor.

Eu sou como automóvel que passa pelas ruas
a grande velocidade
soando o clácson e esmagando gente
e sem outra maior finalidade.

Eu sou turibulário nos altares
da Santíssima Trivialidade.


 

EL MAR

                                         A Julio Rojas

Inmensidad azul. Inmensidad
patria del tiburón y el calamar;
por el temblor rumbero de tus ondas
vienes a ser el precursor del jazz...

Síntesis colosal
de mariscos, espumas and steamers.
Profundo aquel filósofo que dijo:

"Cuánta agua tiene el mar..."

¿Fue Vasconcelos?
¿Fue Bergson?
¿Fue Kant?

 


O MAR

                                         A Julio Rojas

Imensidão azul. Imensidão
pátria do tubarão e da lula;
pelo tremor de rumba de tuas ondas
vens a ser o precursor do jazz...

Síntese colossal
de mariscos, espumas and steamers.
Profundo aquele filósofo que disse:

"Quanta água tem o mar..."

Foi Vasconcelos?
Foi Bergson?
Foi Kant?

 


ÉGLOGA IV

                                         Para Octavio N. Bustamante

Muchacha: Ya sonó el despertador.
Parece
que amanece.
Tu marido no tardará en llegar
y si me encuentra...

Ya - terrones de azúcar - las estrellas
disuélvense en la leche matinal;
ya renace la vida pueblerina;
ya los gallos comienzan a cantar...

Oigo mugir un buey en la barranca.

Muchacha, tu marido
no tardará en llegar...

 

ÉCLOGA IV

                                         Para Octavio N. Bustamante

Moça: Já tocou o despertador.
Parece
que amanhece.
Teu marido logo vai chegar
e se me encontra...

Já - torrões de açúcar - as estrelas
dissolvem-se no leite matinal;
já renasce a vida interiorana;
já os galos começam a cantar...

Ouço mugir um boi no barranco.

Moça, teu marido
logo vai chegar...



CÍVICA

                                         A David Noble

Caterva gobiernista, que sigue paso a paso,
el cadáver de un heróe que va para el panteón.
Una muchacha tiende rotundo y blanco blazo,
señalando en las nubes el vuelo de un avión...

Vapor caliginoso levanta de la tierra.
La comitiva marcha, rezumando sudor.
Y un perrito bull-terrier encima de una perra,
afánase y jadea... para mirar mejor.

 


CÍVICA

                                         A David Noble

Caterva governista, que segue passo a passo
o cadáver de um herói que vai para o panteão.
Uma moça estende rotundo e branco braço,
indicando nas nuvens o vôo de um avião...

Vapor caliginoso levanta da terra.
A comitiva marcha, ressumando suor.
E um cãozinho bull-terrier em cima de uma cadela,
afaina-se e arqueja... para mirar melhor.

 


RUIDOS

                                         Para Ignacio Domínguez

En mi cuarto hay ruidos de diversas clases:
Ruidos sistemáticos y ruidos ambiguos;
ruidos transcendentes, ruidos comme il faut;
ruidos de colores, y ruidos que son
simplemente ruidos...

Palpitar cardiaco del reloj que suena
en las horas negras de paciente espera:
si perdí en el juego, si gané en amor;
si por la mañana llamará a mi puerta
una mano blanca, o algún acreedor.

(La luz de la luna penetra en el cuarto
con deslizamientos de gatito manso.)

En qué idioma dice su palabra el viento?
Es lástima grande que no haya una estepa
en todo el contorno,
así, llamaría corcel vagabundo, etcétera, etcétera,
a este pobre viento que llora a mi puerta...

Ruidos de la calle. Tiemblan los cristales,
cristalinamente, como es natural.
Yo, como poeta, me pregunto
"al punto",
¿pasaría la muerte? o quizá el amor...

Pero los cristales, al temblar, decían
la verdad terrible:
                           Señor, fue un camión...

Soy un formidable teórico del ruido.
Casi soy un genio, un genio auditivo...

 


RUÍDOS

                                         Para Ignacio Domínguez

Em meu quarto há ruídos de diversos tipos:
Ruídos sistemáticos e ruídos ambíguos;
ruídos transcendentes, ruídos comme il faut;
ruídos coloridos, e ruídos que são
simplesmente ruídos...

Palpitar cardíaco do relógio que soa
nas horas negras de paciente espera:
se perdi no jogo, se ganhei no amor;
se de manhã baterá na minha porta
uma mão branca, ou algum credor.

(O luar penetra no quarto
com escorregadelas de gatinho manso.)

Em que idioma diz sua palavra o vento?
É uma grande lástima que não haja uma estepe
en todo o entorno,
assim, chamaria corcel vagabundo, et cetera, et cetera,
a este pobre vento que chora em minha porta...

Ruídos da rua. Tremem os cristais,
cristalinamente. como é natural.
Eu, como poeta, me pergunto
"de pronto",
passaria a morte? ou talvez o amor...

Mas os cristais, ao tremer, diziam
a verdade terrível:
                           Senhor, foi um caminhão...

Sou um formidável teórico do ruído.
Quase sou um gênio, um gênio auditivo...

*

Tradução: Ronaldo Polito

*

Renato Leduc é um escritor que podemos realmente chamar de impagável. O humor foi a tônica de sua poesia e de sua prosa, corrosiva, ridicularizadora, cética e mesmo cínica. Leduc nasceu no México, em 1895, e dedicou-se, a partir de 1947, ao jornalismo até sua morte, em 1986. Sua produção literária é diversificada: escreveu poesia, prosa e ensaio.

Publicou os seguintes livros de poesia: El aula, etc... (1929), Unos cuantos sonetos que su autor, Renato Leduc, tiene el gusto de dedicar a las amigas y amigos que adentro se verá (1932), Algunos poemas deliberadamente románticos y un prólogo en cierto modo innecesario (1933), Breve glosa ao libro de buen amor (1939), Desde París (1940-1942?), XV fabulitas de animales, niños y espantos (1957) e Catorce poemas burocráticos y un corrido reaccionario para solaz y esparcimiento de las clases económicamente débiles (1963). Apenas os títulos dos livros já permitem diversas associações cômicas.

Escreveu também uma famosa peça de teatro, Prometeo (1934), mais conhecida como "Prometeu sifilítico", sendo um dos primeiros a usar palavras de baixo calão e obscenas na literatura mexicana. O texto provocou reações e polêmicas, passando a circular em edições clandestinas.

A revista Cacto, em seu número 3 (2003), publicou dois poemas de Renato Leduc traduzidos por mim. Aqui apresento mais 5 traduções de poemas de Leduc inéditos entre nós, com seu humor quase sutil, hilariantes, provocativos.

Ronald Polito

*

 

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