ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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 ROBERT LOWELL

 

 

FOR SALE

 

Poor sheepish plaything,

organized with prodigal animosity,

lived in just a year—

my Father’s cottage at Beverly Farms

was on the market the month he died.

Empty, open, intimate,

its town-house furniture

had an on tiptoe air

of waiting for the mover

on the heels of the undertaker.

Ready, afraid

of living alone till eighty,

Mother mooned in a window,

as if she had stayed on a train

one stop past her destination.

 

 

À VENDA

 

Brinquedo mais acanhado,

preparado com pródiga animosidade,

durou só um ano—

o chalé de meu pai em Beverly Farms

foi a mercado no mês de sua morte.

Vazio, aberto, íntimo,

a mobília de prefeitura

na ponta dos pés

esperava pelo proponente

no calcanhar do agente funerário.

Atenta, temerosa

de viver só até os oitenta,

mamãe sonhava à janela

como se estivesse num trem

uma parada após a dela.

 

 

SAILING HOME FROM RAPALLO

[February 1954]

 

Your nurse could only speak Italian,

but after twenty minutes I could imagine your final week,

and tears ran down my cheeks...

 

When I embarked from Italy with my Mother’s body,

the whole shoreline of the Golfo di Genova

was breaking into fiery flower.

The crazy yellow and azure sea-sleds

blasting like jack-hammers across

the spumante-bubbling wake of our liner,

recalled the clashing colors of my Ford.

Mother traveled first-class in the hold;

her Risorgimento black and gold casket

was like Napoleon’s at the Invalides....

 

While the passengers were tanning

on the Mediterranean in deck-chairs,

our family cemetery in Dunbarton

lay under the White Mountains

in the sub-zero weather.

The graveyard’s soil was changing to stone—

so many of its deaths had been midwinter.

Dour and dark against the blinding snowdrifts,

its black brook and fir trunks were as smooth as masts.

A fence of iron spear-hafts

black-bordered its mostly Colonial grave-slates.

The only “unhistoric” soul to come here

was Father, now buried beneath his recent

unweathered pink-veined slice of marble.

Even the Latin of his Lowell motto:

Occasionem cognosce,

seemed too businesslike and pushing here,

where the burning cold illuminated

the hewn inscriptions of Mother’s relatives:

twenty or thirty Winslows and Starks.

Frost had given their names a diamond edge...

 

In the grandiloquent lettering on Mother’s coffin,

Lowell had been misspelled LOVEL.

The corpse

was wrapped like panettone in Italian tinfoil.

 

 

 

VOLTANDO DE RAPALLO POR MAR

[Fevereiro, 1954]

 

A enfermeira só falava italiano,

Mas em vinte minutos pude imaginar as últimas semanas,

E lágrimas escorreram à face...

 

Quando embarquei na Itália com o corpo de minha mãe,

Todo o litoral do Golfo de Genova

Rompia-se em fogosas flores.

Os doidos amarelos e celestes malhos-de-mar

Tinindo como britadeiras ao longo

Do borbulha-espumante rastro do navio

Lembravam as cores berrantes do meu Ford.

Mamãe viajava de primeira classe no porão;

Seu casquete do Risorgimento preto e áureo

Era como Napoleão nos Inválidos...

 

Enquanto passageiros bronzeavam

No Mediterrâneo em espreguiçadeiras,

O cemitério de nossa família em Dunbarton

Jazia sob as Montanhas White

Em temperatura abaixo de zero.

O solo do cemitério empedrava-se—

Tantas foram as mortes inverno a meio.

Severo e sombrio contra a ofuscante corrente de neve,

Seu arroio negro e troncos de abeto eram macios como mastros.

Uma cerca de ferro em ponta-de-lança

Ladeava em negro as lápides mais coloniais,

A única alma “a-histórica” a parar ali foi

o Pai, agora enterrado sob o recente

mármore rosa-venado, sem marcas de tempo.

Mesmo o latim do lema dos Lowell:

“Ocasionem Cognosce”,

Soava ali um tanto mercantil e deslocado,

Onde o frio abrasivo iluminava

As sepulturas rachadas dos parentes de Mamãe:

Vinte ou trinta Winslows e Starks.

A nevasca deu a seus nomes uma borda diamante...

 

Nas letras grandiloqüentes sobre o caixão de Mamãe,

Lowell grafara-se em gralha por LOVEL.

O corpo fora embrulhado como panettone em papel de estanho italiano.

 

 

Traduções: Ruy Vasconcelos



 

*

Robert Lowell (1917-1977), poeta norte-americano. Estudou em Harvard e no Kenyon College. Sua poesia, de caráter confessional, envolve ainda temas relacionados à história e à religiosidade. Foi hospitalizado diversas vezes, por alcoolismo e depressão. Viveu seus últimos anos na Inglaterra, onde morreu em 1977, após sofrer um ataque cardíaco. Publicou, entre outros títulos, Lord's Castle Weary, com o qual ganhou o prêmio Pulitzer.

*

 

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