UMA TEMPORADA NAS TÊMPORAS
Rodrigo
de Souza Leão
lâmina
na goela estéril da minha criatividade toda lux luxuosa e
rubra ruboriza aquele horizonte onde dante e algum demônio se
dilacera numa verdade e alguma turbina de um avião cadaveriza
o aerador fênix mordendo jorge de lima revirando na cova por
ter citado o seu nome nesta nova trova embolada onde ponho todo
o meu coração apodrecido por fezes e cactos e sêmen-lhantes
que abominam alguns trocadalhos mesmo assim quem sabe me invento
inventando um vento que turbine a alma daquela vela próspera
em ignecer minha designição
-
Eu surgi do nada e nunca fui ninguém. Queria perdoar meu pai
mas ele não me pediu perdão.
Marx
e Nietzsche conversavam sobre Zaratustra temendo que o fogo daquelas
labaredas próximas destruísse o abismo que limita o fim e o
início dele. Ele era Deus e se recompunha de uma fase onde as
chamas foram fartas mas não fatais. Criar e Destruir. Aqui está
a modernidade enforcada com seu próprio paradigma. Quem sabe
um novo Deus virá?
Daniel
B. E seu boné peludo com um pênis pediu para que Picasso acabasse
logo de fazer o seu retrato.
Eu
querendo ser James Joyce.
(marfim
tristeza onde derrubam a profusão de idéias tolas que circundam
o que todos esperam é que o ser seja o que todos são e
iguais assim seremos animais também) Derrubem uma vaca e a
defequem quando gozam. Os pássaros foram feitos para morrer voando.)
Triste
hospício em que me visto em que me vasto em que insisto em devastar
têmporas de verde e.
Um
tablóide sensacionalista publicou uma foto da lady Diana dando
um beijo na boca de um surrealista. Foi quando eu qualquer fuzilei
um por um dos meus ídolos e ficou claro que teria que deixar
de ser sensasurrealista.
James
viu Joyce que viu Frederico que viu Nietzsche. Trocaram sorrisos
e disseram que mesmo um beijo rápido que trocaram, não significava
amor. Por que amor é Camões. É o fogo que arde sem se ver.
Entre eles não havia nada além de poesia. Gostavam dos mesmos
poetas e tinham certa erudição vulcânica: transbordante. Mesmo
quando esporraram e cuspiram palavras cruzadas e bombas de efeito
moral, se diziam pessoas tristes e inacabadas. Alan Kardec lhes
havia dito que Nietzsche iria voltar. Daniel B. chorou como quem
abandona o silêncio de uma rua da infância. Marx foi sarcástico
e pediu que Sartre fosse crucificado. Picasso sorriu, sorriu tanto
que ruiu feito um edifício explodido.
-
Mas eu nunca li James Joyce.
-
Eu também nunca li nenhum destes caros, mas se você complicar
bem a coisa...
O
olho esquerdo de Marcel Proust caiu de sua boca.
-
Voltar! - gritou Nietzsche. Porra eu quero ir eu não quero
voltar porra nenhuma.
Ouve-se
Mozart num piano de cauda tão longo que o infinito daquele ponto
de interrogação comeu o horizonte no peito do Charada.
-
Quero Ac. Quero Ac.
Keruac
surgiu com Freud. Freud disse:
Esse
povo quando quer zona quer a tempestade de um Amplictil. Ficam
com estes trocadilhos que não levam a literatura para lugar nenhum.
Mas quem quer chegar a algum lugar e que lugar é este?
Assim
todos esperavam sua vez de esperar.
Era
o soma que estava em falta naquele inferno place. Motel vagabundo
onde Elizabeth Bishop e Emily D. onde Breton e Piva onde Marlom
Brando e Elvis se encontravam com Lou Reed, Yma Sumac e David
Bowie.
(MANIFESTO
QUALQUERISTA: artigo1) Quero qualquer coisa qualquer nota qualquer
dia e odeio aveia Quaker. Desejo o que respiro. Respiro o que
desejo. Cada um é livre e pode se dizer poeta da forma como quiser
e se expressar como quiser e a palavra poetastro será banida
do dicionário. Todo o poeta é um bom poeta e Jesus Cristo que
ia julgar os vivos e os mortos ainda não apareceu para me coroar
com uma flor carnívora. Além do fim do poço há muita possibilidade
de haver uma areia movediça no quintal de sua depressão. Por
isso tudo pode piorar. Para que o Qualquerismo seja implantado
é forçosamente necessário que os dez primeiros inscritos no
movimento façam uma antologia poética com Os Cem Piores Versos
dos Cem melhores Poetas de Todos os Tempos. Assim veremos que
ainda somos piores do que o que os piores dos melhores.)
to
cansado de escrever e como ninguém vai ler:
lamina
na goela estéril da minha criatividade toda lux luxuosa e
rubra ruboriza aquele horizonte onde dante e algum demônio se
dilacera numa verdade e alguma turbina de um avião cadaveriza
o aerador fênix mordendo jorge de lima revirando na cova por
ter citado o seu nome nesta nova trova embolala onde ponho todo
o meu coração apodrecido por fezes e cactos e sêmen-lhantes
que abominam alguns trocadalhos mesmo assim quem sabe me invento
inventando um vento que turbine a alma daquela vela próspera
em ignecer minha designição
ao
invés de enrolar prefiro copiar e colar:
(marfim
tristeza onde derrubam a profusão de idéias tolas que circundam
o que todos esperam é que o ser seja o que todos são e
iguais assim seremos animais também) Derrubem uma vaca e a
defequem quando gozarem. Os pássaros foram feitos para morrer
voando.)
OS
PÁSSAROS FORAM FEITOS PARA MORRER VOANDO.
MANIFESTO
QUALQUERISTA: artigo 2) Partindo do pressuposto de que tudo é
tudo e nada é nada como nos dizia um dos dez maiores filósofos
contemporâneos - o Tim Maia -, é que o pilar das patas bovinas
do Qualquerismo deve ser fincado. Depois de uma antologia com
"Os Piores", é a hora de aliciarmos o maior número de adeptos
a nossa causa. Para isso o departamento esportivo estará fornecendo
a carteirinha de sócio-atleta aos dez primeiros que chegarem
depois daqueles dez primeiros. Assim poderão todos os vinte freqüentar
a piscina cheia de ratos da modernidade, e ouvir esta "chupação"
extraída daquela música de Cazuza. Lembre-se que uma vez Qualquerista
sempre Qualquerista. Todo o Qualquerista carregará um Q de
(abrir o MINIDICIONÁRIO SACCONI DA LÍNGUA PORTUGUESA E LER
DA PÁGINA 555 ATÉ A PÁGINA 662) dentro do coração e
estudará apenas nos manuais da Disney. Aos jornalistas nada melhor
do que o Manual do Peninha. Aos
magos, como o nosso querido Paulo Coelho: o Manual da Maga
Patalógica. Aos escoteiros: o Manual dos escoteiros. Ao Manuel:
o Manual do Manual que é a bíblia de todo o Qualquerista.
Marx
e Nietzsche conversavam sobre Zaratustra temendo que o fogo daquelas
labaredas próximas destruísse o abismo que limita o fim e o
início dele. Ele era Deus e se recompunha de uma fase onde as
chamas foram fartas mas não fatais. Criar e Destruir. Aqui está
a modernidade enforcada com seu próprio paradigma. Quem sabe
um novo Deus virá?
Impávido
Caetano Veloso é que não agüento mais. Ë muito espaço para
uma pessoa só.
Pedem
os piolhos que peidam. Pedem as algemas que prendem. Tudo quer
e o querer e a vontade de ser é o que habita o instante que não
se repete mais. Heráclito está no amarelado lago de Van Gogh.
Heráclito pede uma orelha enquanto Dennis Hoper beija na nuca
de Agripino de Paula.
Paulada.
Pau.
Pau
grande de poder para embocetar-te de porrada.
OS
PÁSSAROS FORAM FEITOS PARA MORRER VOANDO.
Pardal
voando louco no infinito de uma boca sangrando sempre a procura
de outra boca em que pardais que voam no escarro de Augusto dos
Anjos que deve morrer como eu morri. Perdão meu pai é o que
queria dizer mas meu pai não me pediu perdão e não me lê e
não me quer mais agora aqui. É um pássaro dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um
pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um
pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um
pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um
pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um
pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um
pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro e dentro de um pássaro
e dentro de um pássaro e dentro de um dentro de um pássaro e
dentro de um pássaro e dentro de um pássaro: tal vôo só é
possível se todos os pássaros se unirem.
Daniel
B. Pergunta a Nietzsche:
Por
que você quer voltar?
Eu
não quero.
Daniel
B. tira o seu boné e o seu rifle e atira no criador do seriado
em que foi Daniel B. Daniel B. chora.
-
Diga a ele que eu fico - disse Nietzsche.
-
Posso ir então.
-
Kardec quer que eu vá.
-
Kardec não é Deus. Deus é o circular.
-
Havia um círculo redondo na palma da mão
de Daniel B.
Ele
continuou falando:
-
Sabe
quando a gente é pequenina como a ponta de um dedal e a gente
acha que sabe tudo. A gente chega a juventude e acha que sabe
tudo. A gente chega a idade madura e acha que sabe tudo. Por que
a gente sempre acha que sabe tudo?
Nietzsche
olhou bem naqueles olhos que eram ciclones e que diziam o que
Daniel B. queria. Queria profundidade de um personagem de Marcel
Proust. Ele queria ser Marcel. Daniel Boone não gostava de ser
Daniel Boone e queria ser um abismo como foram aquelas outras
almas tão torturadas mas que no fundo podiam ser miragens, palavras,
canções, desertos, história em quadrinhos e mais uma pá de
coisas e de cal sobre o assunto. Assim tudo ficou durante o
tempo em que penso em algo e foi o suficiente para me perguntar;
"por quê me metalinguo?" Assim surgiu:
(MANIFESTO
QUALQUERISTA: artigo 3) O Qualquerismo não é um movimento pois
se pretende estático. O único movimento que pode se equiparar
ao Qualquerismo em proposta é o MRU: Movimento Retilíneo Uniforme.
Parar é andar para frente por mais contrário que possa isso
parecer. Ócio total. Ócio parcial.Ócio ossal. Parar e olhar
a natureza dentro de cada prédio negro além da vidraça. Parar
para sentir a brisa do óleo que sobe. Parar e cintilar no corredor
de ar entre o vazio que a cidade tem. Parar com o movimento por
aqui pois devo mover-me, devo demover-me, isto eu acho.
populacho
prepopula
própopula
copio
e colo:
-
Eu surgi do nada e nunca fui ninguém. Queria perdoar meu pai,
mas ele não me pediu perdão.
"Tornar-se
pessoa. Thor nasce tornado. Tornar-se Tornado. Thor nasce Thor".
Toni Tornado.
Nietzsche
não queria o que Daniel Boone queria mas ambos eram populares
em demasiado. Um tão gênio e o outro tão burro. Ambos bem pop.
Um astro esquecido e idolatrado por milhões. Outro o filosofo
da moda. O cara que fazia a cabeça de quem inventa de Quem I.
De QI.
-
Eu falo com Kardec que você quer ir em meu lugar e é você quem
merece ser, o criador do Qualquerismo - disse N.
-
Também acho. Mas será que este cara vai ser feliz?
-
Um gênio!
-
Então irei sofrer para caralho sabendo de que a inteligência
não me ajudará de nada. Mas irei por que como Daniel Boone eu
fui muito amado e quero sentir o que é o ódio.
-
Saberá bem. Aprenderá tudo que eu disse e o pior é que você
não porá em prática meus ensinamentos pois quem nasce para
Daniel Boone nunca chega a Frederico. Nunca. Você viu o filme
Traído pelo Desejo. Um escorpião é um escorpião.
Roberta
Miranda cantava "Vá com Deus". Kardec cochichou no ouvido
de Nietzsche e Daniel Boone baixou em mim num centro espírita.
Disse que iria ser, o criador do Qualquerismo. O movimento do
eu sozinho. Disse para que eu fosse o meu movimento. Para que
eu fosse fiel a ele e que o importante era se movimentar mesmo
pedra.
Nasci.
Os pássaros foram feitos para morrer voando. Mas nunca morrem
assim.
lamina
na goela estéril da minha criatividade toda lux luxuosa e
rubra ruboriza aquele horizonte onde dante e algum demônio se
dilacera numa verdade e alguma turbina de um avião cadaveriza
o aerador fênix mordendo jorge de lima revirando na cova por
ter citado o seu nome nesta nova trova embolada onde ponho todo
o meu coração apodrecido por fezes e cactos e sêmen-lhantes
que abominam alguns trocadalhos mesmo assim quem sabe me invento
inventando um vento que turbine a alma daquela vela próspera
em ignecer minha designição
*
Rodrigo
de Souza Leão nasceu em 1965. É carioca, autor
de Há flores na pele.
*
Leia também poemas
do autor e trechos da novela Todos
os cachorros são azuis.
|