O GRITO
sob impacto da pintura
de Edvard Munch
céu sangue, azuis
de gases, instável
gravura - terror
que se grafa na íris: uma alma
em pânico:
motivo algum - nenhum
desastre
asteróide em rota
de colisão, explosão de bombas,
escombro, crime ou espasmo:
maconha demais - diriam
os bolhas, nódoas
de nóia, bolores de centeio:
mal sabem (o fiorde arde
em lilás) - a bomba explode
nas entranhas:
e é isso que faz
a paisagem trêmula
01.99
A VIDA EM TECNICOLOR I
quando ontem é
onde, quase nada,
e o futuro está
passando agora,
via satélite, bundas
e bombas na tela plana
do menos, bem menos, a
vida exposta
no salto do grilo na grama,
as brumas,
grandes nuvens bordadas
na retina calma,
calma, calma como a lua
deitada
no pano branco estendido
no falso
mármore frio, a
lua, uma cadela
de raça peluda,
como ursa, órions e névoas
entre touros de gases,
minúcias, a pele
arrepiada pelas carícias,
os toques, de dentro
o tempo nos dizendo a
hora, vãobora
butantã, 1.11.2000
A VIDA EM TECNICOLOR II
espanto graça abismo
ternura, todo o tempo
tudo
muda, a flor floresce
e murcha, o broto vira
fruta, pássaro
abatido
num salto, sangue na boca
do gato, e essa linda
lua
malandra, lambendo a água
no asfalto
maio 99
A VIDA EM TECNICOLOR III
agora digo nada, a vida
que se vive agora, o relógio
marca as horas, clepsidra
que evapora, silêncio
nas bordas do tempo, escrita
perdida no espaço,
os peixes
saltam nas vagas, poema
que ao vento se apaga,
ao lume
de lua nenhuma, um nome
escrito na água
butantã, 08.01.2001
LA NOTTE
a noite nos
revela, a noite
nos resvala, a noite nos
enleva, a noite
nos prepara para
a Grande Noite
que nos pára
lisa: olhos
vítreos, lágrimas
no vídeo, os sapatos
sobre a mala
01.99