As armas estocadas
No quarto ao lado de meu silêncio
dorme a criança sem suspeitar do ar
que alimenta a violenta tosse da cidade,
durante o sono – monstros e rosnados –
um mercador de medos corrompe as
flores e lianas que buscam germinar
entrelaçadas à boca e ao cano dos fuzis,
a criança dorme, enquanto um arsenal
faz tic-tac tic-tac tic-tac tic-tac tic-tac
no fundo falso de um chapéu texano
que não vê diferença entre uma sentença
de morte e outra sentença, a do verbo criador,
senhor de mundos onde as pedras flutuam.
A criança dorme, dorme, enquanto suas chagas
são amargamente remendadas pelos laços
de família e os panos podres que abafam
o som das armas estocadas e o cochichar
subterrâneo do crime com as ideologias,
a criança dorme sem suspeitar que dia e noite
noite e dia as máquinas da morte trabalham
fabricando assassinos paralíticos deformados
cegos surdos mudos órfãos viúvas mutilados
e em promoções especiais – “compre uma
leve duas”, dá de brinde a vassoura da eugenia,
dia e noite, noite e dia, dia e noite, noite e dia
a máquina da morte vende a varejo – um tiro
para cada vivo – um dólar para cada morto, e
em forma de atacado um bem sortido genocídio,
a máquina da morte tem filiais em muitos países –
danger nas mãos de sacerdopatas e políticos ,
gnomos impotentes, que, no meio da noite
recalcados, levantam e apontam seu míssil
contra alguma pequena aldeia que acorda
da cama para em seguida deitar na tumba –
ossos e fragmentos que antes eras risos
espalhados pelo chão do bárbaro ofício
No quarto ao lado do meu silêncio, só,
a criança dorme sem suspeitar de nada,
um gato listrado ao seu lado – sua alma |