ZUNÁI - Revista de poesia & debates

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CÉLIA MUSILLI

 

 

 

 

SOB UM CÉU DE ACASOS  
 

há um tempo em que as ilusões se dissipam

e a corda que nos sustentava se rompe

há um tempo em que as hastes se curvam

derrubando as flores soberbas

os botões que seriam buquês

há um tempo em que as pedras trincam

raridades se partem

achados se perdem

e ninguém sabe aonde foram parar os poemas

os guarda-chuvas

os sortilégios

os pássaros

as bonecas das meninas mortas

os chapéus que sumiram na ventania

há um tempo um tempo um só tempo

depois não há mais tempo

porque soaram as sirenes que proíbem a fantasia

a realidade não acolhe planos

sob um céu de acasos e sonhos minados

 


QUASE A INFÂNCIA


na tarde líquida
caramujos deixam viscosidade e grude
entre as árvores
cascas camuflam-se nos troncos
até que antenas marrons
despontam para lembrar
que é tenso e úmido
lamber escargots
como o primeiro beijo

prossigo entre as folhas
em rotas de seda
tecelã da brisa que acende
a memória de um canto breve
até a última ciranda
perdida nos galhos
trincar a fruta
entre a língua
o gozo
e o sumo



FINISHED

 

porque há canções de chegada

e há canções de partida

o coração tomo pela mão

quebrável

no último beijo

transversal de línguas

poliglota

falo de amor

delicadezas doem

não sei se já disseram

mas você sabe como matar pássaros

 

 

 

*

 

Célia Musilli é jornalista, cronista e poeta. Autora de Sensível Desafio (Atrito Art/2006) e Todas as Mulheres em Mim (AtritoAr/Kan Editora 2010), faz Mestrado em Literatura na Unicamp e tem sonhos premonitórios. Gosta de livros, viagens, estrelas e gatos, nem sempre nesta ordem.

 

Leia também um conto da autora.

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