TREINAMENTO CORPORATIVO
Razão de ser, estava escrito,
Razão da existência, me calo.
Repito, interminavelmente,
Em pensamento e pensamento
Até que de tão rápido o fluxo
Estanca e a frase permanece
Infinita, suspensa, imóvel:
Razão de ser é vasto e nulo.
Razão de ser são objetivos
E seus planos para alcançá-los,
Leio em voz alta, lentamente,
E o meu cachorro, sonolento,
Levanta a cabeça e me escuta,
Trazendo a mim a sua espécie
Dos cachorros que, para Borges,
Não tem passado nem futuro.
Mas razão da existência existe?
E o texto cita como análogo:
O que somos principalmente
É mudarmo-nos, movimento,
Melhor que a razão nos conduza,
Como se nós nunca estivéssemos
Entre a beira da própria morte
E a do delírio da cultura.
Razão da existência é mijo.
Não já disse uma vez Heráclito,
Que presentes estão ausentes
Na ilusão do conhecimento?
Meu cachorro, lambendo o cu,
É darma e que se lhe impusessem
Razão de ser, seria só
Por doma, nunca por virtude.
HAPPY HOUR
Hoje bebemos mais cerveja,
E disse, depois de outro gole,
O consumidor brasileiro...
Procurei o consumidor
Em seus olhos embaciados,
Então me ocorreu: pouco importa!
E meu corte me recortou:
A morte é desimportância.
Quem sou eu, senão que não seja
Um que sinceramente bole,
Um que passe por verdadeiro
E que seja bom vendedor,
Quer auto, quer alteramado.
A morte é charada morta
No insight que se recortou
Em asco, nojo, náusea e ânsia.
Mas per capta talvez nem, veja,
Sessenta litros extrapole.
Demócrito, meu timoneiro,
Me diga se aquilo que for
Eternamente recortado,
Como um nada que nem se corta,
Não está morto, pois encontrou,
De si mesmo, a eterna distância?
Se eterno remorrer peleja
Com falações de bundas-moles...
Ah, a mijada no banheiro!
Um mercado bem promissor,
Um gole, se bem explorado...
Se bem for, o estômago aborta...
Eu sempre serei quem eu sou:
Ignorância da ignorância. |