MARCELI ANDRESA BECKER
SEM TÍTULO
(09.07.2010)
1
quando o corpo todo,
túmulo inverso
de ecos e caos,
sai pelo umbigo: camaleoa, a língua é corda
de um sino imenso dentro do peito.
*
como se os ossos voltassem à infância
para crescer até abrir outra vez
*
os tecidos. se já não há linhas nas palmas
das mãos, meu amor,
*
se já não temos costuras,
*
a linguagem vaza por todos os dedos: deixa que escorra
no meio das bocas, dos túneis,
deixa que sonhe um enxerto pra morte.
2
dá-me a noite que falece, a tua escura
escavação, e eu te entrego
*
o meu Narciso ainda
de pálpebras fechadas, ainda virgem,
*
inviolado pelo espelho.
*
mas se cantar
é cantar contra ouvido e pele, tempo de fibras,
*
mas se beleza é tu contra carne,
então cantar, cantar, pra te fazer pedaços.
*
(sêmen de luas que se olham de frente
cruza a garganta: vem
pra eu tocá-la entre cordas, cortá-la,)
3
que te antifalar
é qualquer coisa antes das grutas. há uma presa
*
que em mim grita a tua entrega de Adão nu,
ferido, feito da minha fome de costelas. vê, é só perdão
*
o que hoje em ti me pede o mundo, mudo,
é só um varal a céu aberto,
ouve as roupas
contra o vento, se confessam,
o que tens no coração.
*
Marceli Andresa Becker é poeta e estudante de Filosofia na Universidade de Passo Fundo (UPF).
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