PAUL ÉLUARD
PAUL ÉLUARD
De RÉPÉTITIONS
SUITE [1]
Pour l’éclat du jour des bonheurs en l’air
Pour vivre aisément des goûts des couleurs
Pour se régaler des amours pour rire
Pour ouvrir les yeux au dernier instant
Elle a toutes les complaisances.
SEQUÊNCIA [1]
Para o esplendor do dia felicidades no ar
Para viver tranquilamente gostos cores
Para se regalar amores para rir
Para abrir os olhos no derradeiro instante
Ela tem todas as complacências.
SUITE [2]
Dormir, la lune dans un oeil et le soleil dans l’autre,
Un amour dans la bouche, un bel oiseau dans les
cheveux,
Parée comme les champs, les bois, les routes et la mer,
Belle et parée comme le tour du monde.
Fuis à travers le paysage,
Parmi les branches de fumée et tous les fruits du vent,
Jambes de pierre aux bas de sable,
Prise à la taille, à tous les muscles de rivière,
Et le dernier souci sur un visage transformé.
SEQUÊNCIA [2]
Dormir, a lua num olho e o sol no outro,
Um amor na boca, um belo pássaro nos
cabelos,
Enfeitada como os campos, os bosques, as estradas e o mar,
Bela e enfeitada como a volta ao mundo.
Fuja através da paisagem,
Por entre os galhos de fumaça e todos os frutos do vento,
Pernas de pedra com meias de areia,
Tomada pela cintura, em todos os músculos de rio,
E o último girassol sobre um rosto transformado.
De À TOUTE ÉPREUVE
LA FIN DU MONDE
À André Breton
Les yeux cernés à la façon des châteaux dans leur
Ruine
Une bure de ravins entre elle et son dernier regard
Par un temps délicieux de printemps
Quand les fleurs fardent la terre
Cet abandon de tout
Et tous les désirs des autres à son gré
Sans qu’elle y songe
Sa vie aucune vie sinon la vie
Sa poitrine est sans ombre et son front ne sait pas
Que sa chevelure ondulée le berce obstinément.
Des mots quels mots noir ou Cévennes
Bambou respire ou renoncule
Parler c’est se servir de ses pieds pour marcher
De ses mains pour racler les draps comme un mou-
rant
Les yeux ouverts sont sans serrure
Sans effort on a la bouche et les oreilles
Une tache de sang n’est pas un soleil accablant
Ni la pâleur une nuit sans sommeil qui s’en va.
La liberté et plus incompréhensible encore que la
Visite du médecin
De quel médecin une chandelle dans le désert
Au fond du jour la faible lueur d’une chandelle
L’éternité a commencé et finira avec le lit
Mais pour qui parles-tu puisque tu ne sais pas
Puisque tu ne veux pas savoir
Puisque tu ne sais plus
Par respect
Ce que parler veut dire.
O FIM DO MUNDO
Para André Breton
Os olhos cercados à maneira dos castelos em sua
Ruína
Um burel de barrancos entre ela e seu último olhar
Por um tempo delicioso de primavera
Quando as flores vestem a terra
Esse abandono de tudo
E todos os desejos dos outros a seu prazer
Sem que ela imagine
Sua vida nenhuma vida senão a vida
Seu peito está sem sombra e sua fronte não sabe
Que sua cabeleira ondulada a embala obstinadamente.
Palavras quais palavras negro ou Cévennes
Bambu respira ou ranúnculo
Falar é se servir de seus pés para andar
De suas mãos para raspar os lençóis como um mori-
bundo
Os olhos abertos estão sem fechadura
Sem esforço temos a boca e as orelhas
Uma mancha de sangue não é um sol opressor
Nem a palidez uma noite sem sono que vai embora.
A liberdade é mais incompreensível ainda que a
Visita do médico
De qual médico uma vela no deserto
No fundo do dia a fraca luz de uma vela
A eternidade começou e terminará com a cama
Mas para quem tu falas já que não sabes
Já que não queres saber
Já que não sabes mais
Por respeito
O que falar quer dizer.
De AU DÉFAUT DU SILENCE
Qui de nous inventa l’autre ?
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Visage perceur de murailles.
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Ta chevelure d’oranges dans le vide du monde
Dans le vide des vitres lourdes de silence
Et d’ombre où mes mains nues cherchent tous tes reflets.
La forme de ton coeur est chimérique
Et ton amour resemble à mon désir perdu.
Ô soupirs d’ambre, rêves, regards.
Mais tu n’as pas toujours été ave moi. Ma mémoire
Est encore obscurcie de t’avoir vue venir
Et partir. Le temps se sert de mots comme l’amour.
Je me suis renfermé dans mon amour, je rêve.
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Quem de nós inventou o outro ?
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Rosto furador de muralhas.
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Tua cabeleira de laranjas no vazio do mundo
No vazio dos vitrais pesados de silêncio
E de sombra onde minhas mãos nuas buscam todos os teus reflexos.
A forma do teu coração é quimérica
E teu amor se assemelha a meu desejo perdido.
Ó suspiros de âmbar, sonhos, olhares.
Mas tu não estiveste sempre comigo. Minha memória
Ainda está obscurecida por tê-la visto chegar
E partir. O tempo se serve das palavras como o amor.
Fechei-me em meu amor, sonho
DE LA CAPITALE DE LA DOLEUR
NE PLUS PARTAGER
à G.
Au soir de la folie, nu et clair,
L’espace entre les choses a la forme de me paroles,
La forme des paroles d’un inconnu,
D’un vagabond qui dénoue la ceinture de sa gorge
Et qui prend les échos au lasso.
Entre des arbres et des barrières,
Entre des murs et des mâchoires,
Entre ce grand oiseau tremblant
Et la colline qui l’accable,
L’espace a la forme de mês regards.
Mes yeux sont inutiles,
Le règne de la poussière est fini,
La chevelure de la route a mis son manteau rigide,
Elle ne fuit plus, je ne bouge plus,
Tous les ponts sont coupés, le ciel n’y passera plus,
Je peux bien n’y plus voir.
Le monde se détache de mon univers
Et, tout au sommet des batailles,
Quand la saison du sang se fane dans mon cerveau,
Je distingue le jour de cette clarté d’homme
Qui est la mienne,
Je distingue le vertige de la liberté,
La mort de l’ivresse,
Le sommeil du rêve.
Ô reflets sur moi-même ! ô mês rreflets sanglants !
NÃO MAIS PARTILHAR
à G.
Na noite da loucura, nu e claro,
O espaço entre as coisas possui a forma de minhas palavras,
A forma das palavras de um desconhecido,
De um vagabundo que desata a cintura de sua garganta
E pega os ecos pelo laço.
Entre árvores e barreiras,
Entre muros e mandíbulas,
Entre essa grande ave trêmula
E a colina que a oprime,
O espaço possui a forma de meus olhares.
Meus olhos são inúteis,
O reino do pó acabou,
A cabeleira da estrada pôs seu manto rígido,
Ela não foge mais, não me mexo mais,
Todas as pontes estão cortadas, o céu nelas não passará mais,
Posso então não ver mais nelas.
O mundo se destaca de meu universo
E, bem no cume das batalhas,
Quando a estação do sangue murcha em meu cérebro,
Distingo o dia dessa claridade de homem
Que é a minha,
Distingo a vertigem da liberdade,
A morte da embriaguez,
O sono do sonho.
Ô reflexos sobre mim mesmo ! Ô meus reflexos sangrentos !
Tradução: Eclair Antonio Almeida Filho
Leia também outras traduções (I e II) de Paul Éluard feitas por Virna Teixeira e Rodrigo Garcia Lopes.
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Paul Éluard, pseudônimo de Eugène Grindel (1895-1952), poeta francês. Na juventude, participou em Paris de movimentos de vanguarda como o dadaísmo e o surrealismo. Depois, durante a II Guerra Mundial, apoiou a Resistência contra o nazismo e engajou-se nas fileiras do Partido Comunista Francês (PCF), escrevendo poemas de inspiração política e de exaltação da mulher amada. Entre suas obras principais estão Os animais e seus homens (1920), Capital da dor (1926), O amor, a poesia (1929), Os olhos férteis (1936), Ao encontro alemão (1944) e Uma lição de moral (1949). |